Tokyo é apelido antigo, juvenil, de rua. Mosima Gabriel "Tokyo" Sexwale (a pronuncia é sê-wei-lê) é um dos sete candidatos que buscarão nas urnas o direito de ocupar a cadeira do notório Joseph Blatter na Fifa, nas eleições do dia 26 de fevereiro do ano que vem, em Zurique, na Suíça. Disputará espaço com três europeus, dois árabes e um conterrâneo. Faltam-lhe votos, mesmo na mama África. Seria o primeiro presidente negro da ONU do futebol, união de exatos 209 países, 54 do seu continente. Quatro meses antes, é impossível apontar o favorito das urnas.
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Tokyo não é japonês, nem possui relações com a capital nipônica de 13,5 milhões de almas e nem receberá voto da federação local. Quando jovem, na periferia de Johanesburgo, onde nasceu, cresceu e correu da polícia branca, Mosima era chamado de Tokyo pelos amigos. Ninguém lutava caratê como ele, o terceiro de uma larga família de seis crianças. Nos confrontos de esquinas, todos eram mais ele, o Karatê Kid.
O apelido nasceu bem antes que ele assumisse um papel de liderança no movimento estudantil sul-africano, antes mesmo de integrar o braço armado do Congresso Nacional Africano (CNA), que desafiava com palavras, punhos e armas o regime do apartheid - o que segregava pessoas pelo tom da pele. Ao radicalizar, Tokyo ingressou na ala militar (Umkhonto we Sizwe, Lança da Nação, em Zulu) do CNA, fugiu do país, treinou e formou-se na antiga União Soviética.
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Quando voltou, foi preso e algemado. Na viagem ao presídio, um colega jogou uma granada no Land Rover verde escuro da polícia. A explosão, a fumaça, a confusão, oportunizaram uma fuga de cinema de alguns rebeldes.
Sexwale buscou refúgio na vizinha Suazilândia, onde voltou a estudar e aperfeiçoar-se na arte militar. É grande fã de Che Guevara (1928-1967), leitor faminto das obras do guerrilheiro.
Em 1977, ao voltar à África do Sul pela segunda vez, começou a agir na clandestinidade. Foi preso, julgado e condenado no ano seguinte. Pegou 18 anos de cadeia. Enviado à tristemente célebre prisão de Robben Island, nas proximidades da Cidade do Cabo, encontrou Nelson Mandela (1918-2013) - a quem qualifica como a melhor pessoa que conheceu. Não um santo, um homem, um ser como ele, mas iluminado.
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Tokyo gastou 13 dos seus 62 anos atrás das grades. Ocupou seu tempo com livros, educou-se. Casou com a advogada Judy van Vuuren, que acompanhou seu caso antes, durante e depois da prisão. Hoje estão separados, e o divórcio alcançou cifras milionárias. Saiu da prisão com Mandela no começo dos anos 1990.
Com a troca de regime, quando os negros conquistaram uma chance mínima de ocupar postos no governo e em empresas, Sexwale encontrou caminho entre executivos em companhias que exploravam diamantes e petróleo. Quase três décadas depois, terceiro homem mais rico do país, sua fortuna se aproxima de R$ 1 bilhão. Sua companhia, a Mvelaphanda Holdings, é uma das tops na produção de diamantes. Neste meio tempo, foi ministro dos Acordos Humanos da África do Sul, entre outros cargos. Popular, estrelou uma versão local do Aprendiz (The Apprentice).
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Mas ele não radicalizou na TV, como o caricato Donald Trump.
Não dizia:
- Você está demitido.
Preferia:
- Você está dispensado.
Aos olhos do futebol e da Fifa, Sexwale apareceu quando ocupou um posto central no comitê organizador da Copa do Mundo da África do Sul. Precisou negar que o comitê local havia pagado propinas para garantir a sede do Mundial de 2014. As acusações não o atingiram nem evoluíram.
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Depois, começou a integrar a força-tarefa que Blatter montou para combater o racismo. Liderou o grupo que buscou aproximar palestinos e israelenses com bola e chuteira. Sua história com o futebol é mínima, mas não se preocupa. Não tocará em táticas. Não mudará a regra do jogo.
O que ele fala nos discursos entusiasmados é que a Fifa precisa de boa gestão (e de uma vassourada). Quem buscou seu nome, o mais surpreendente de todos os sete, foi o presidente da Confederação Africana de Futebol, o camaronês Issa Hayatou, número 1 interino da Fifa enquanto Blatter cumpre suspensão de 90 dias. Numa entrevista, Tokyo falou.
- Eu estou indo para essa campanha com a certeza de que podemos ganhar. Mas, ganhando ou perdendo, as pessoas vão saber que houve um africano que veio aqui e balançou as coisas.
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Tokyo tentará atrair votos na África e na Ásia. A Europa votará em europeu. A Conmebol estará ao lado da velha Fifa de sempre. O conservador Brasil da CBF embarcará na mesma viagem dos vizinhos da atrasada região.
*ZHESPORTES