Impetuosa em quadra, a gaúcha Fernanda Garay também é irrequieta fora do competitivo ambiente do vôlei. Na semana passada, em Porto Alegre, a ponteira de 29 anos da seleção brasileira lançou um site para se aproximar dos torcedores, em evento na Sogipa, clube onde deu os primeiros saques e cortadas.
A campeã olímpica já pensa em projetos para o futuro. Quer dar palestras pelo Brasil, tarefa para a qual demonstrou desenvoltura no auditório do clube da Capital. Também pensa em desenvolver trabalhos na área social, para "devolver à sociedade as coisas boas" que conseguiu no vôlei.
Mas, por enquanto, ainda tem planos de conquistar muito mais no esporte. Depois de passagens por Japão e Turquia, a jogadora do Dínamo Krasnodar - clube russo pelo qual foi vice-campeã mundial em maio - se apresentou nesta segunda-feira à seleção brasileira, que iniciará a preparação para o Pan de Toronto e o Grand Prix:
- O meu foco é jogar, estar na melhor forma possível para ajudar o Brasil.
No horizonte de Fe Garay, a conquista do ouro no Jogos do Rio 2016 - o terceiro em sequência para o Brasil, façanha só obtida pela antiga União Soviética e Cuba. Mas ela sabe que as meninas terão um adversário tão difícil de superar quanto as americanas e russas: a pressão de vencer em casa.
A seguir, os principais trechos da entrevista a ZH:
Como foi a tua experiência na Rússia?
Foi muito positiva, superou minhas expectativas. Nunca pensei que um dia jogaria na Rússia. Tive até um pouco de receio, porque quando a gente pensa em Rússia, pensa sempre em frio. Mas o campeonato é de nível muito alto, com equipes fortíssimas.
Como tu avalias o atual estágio do vôlei feminino no Brasil? A seleção tem condições de se manter no topo?
Eu acredito muito nisso. As outras seleções vêm trabalhando muito, e cada vez tem sido mais competitivo. Temos feitos jogos mais difíceis, todos estão se preparando para enfrentar o Brasil, porque nós somos um referência. Então as outras seleções se preparam muito bem, estudam como jogos contra a gente. Por isso tem complicado nossa vida. Mas o Brasil tem se preparado bem para fazer bonito nessa temporada e também na próxima, que tem Olimpíada.
Nos Jogos do Rio, a seleção feminina vai tentar o tricampeonato olímpico de forma consecutiva, para igualar um feito só obtido pela antiga URSS e Cuba. Vocês já falam sobre essa possibilidade na seleção?
Sabemos que é algo muito difícil, mas não é impossível. Mas o meu primeiro objetivo é estar no grupo que vai disputar a Olimpíada.
Tu não consideras que a tua vaga está garantida na seleção?
Não. Eu foco sempre em estar em condições para teu o meu lugar lá. É claro que eu tenho a expectativa de estar lá, mas quero estar lá muito bem para ajudar o máximo.
O vôlei foi um dos esportes mais procurados pelo público brasileiro nos pedidos de ingressos para os Jogos. Tu acreditas que haverá muita pressão da torcida, e vocês estão preparadas para essa realidade?
Vai ter muito pressão, sim. A gente tem de estar muito bem preparada, não só tecnicamente e fisicamente, mas também no aspecto psicológico, que precisaremos dar a mesma atenção do que os outros quesitos. Por isso, teremos de estar serenas e preparadas para enfrentar muitas dificuldades não só nas quadras, mas também com relação à pressão.
A experiência com a seleção de futebol na Copa do ano passado serviu de alerta para vocês?
Sim. Algumas pessoas que não jogam, não são atletas ou não estão no meio do esporte não têm o entendimento de quem está, de quem vive isso. E a gente vive isso. É impossível não imaginar o que aqueles jogadores passaram, sentir aquele dor. Perder faz parte. vitória e a derrota no esporte andam em paralelo, mas aquela derrota foi muito traumatizante. E a pressão que aqueles jogadores tiveram nos faz imaginar que será da mesma forma para nós.
O Brasil ganhou tudo no vôlei feminino, menos o Mundial. Vocês estão engasgadas com essa sina?
Claro que o desejo de ganhar é muito grande. Mas foi o meu primeiro mundial. Eu saí muito feliz com a medalha de terceiro lugar. Lógico que o meu objetivo era ser campeã, e existe uma expectativa muito grande para a conquista desta medalha (ouro). Foi um bom campeonato, fizemos uma boa campanha. Teve um jogo que não poderíamos vacilar e vacilamos (o Brasil foi derrotado pelos EUA na semifinal). Então aquela medalha de bronze teve uma valor muito grande para mim.
Até que idade tu te enxergas jogando em alto nível?
É muito difícil fazer essa previsão. Estou preparada para uma carreira curta. Já estou com 29 anos e não acho que vou conseguir estender a carreira por muito tempo. Não penso que vá parar de jogar logo, talvez não consiga manter o mesmo nível para estar na seleção brasileira. Imagino que (possa jogar) pelo menos até uns 35 anos, aí terei um bebê, volto... Acredito que tenha uma longevidade boa no voleibol. Pelo menos na próxima Olimpíada, em 2020, eu ainda vou estar em atividade.
Tu começaste a jogar na Sogipa. Tu pensas em encerrar a carreira no clube?
Certamente, acho que é um sonho, né? Porque saí daqui com 16 anos, rodei o mundo, e nunca vi uma equipe de voleibol aqui, até agora em 18 anos de carreira. Acredito que agora as pessoas que estão à frente desse projeto (equipe de vôlei feminino da Sogipa, atual vice-campeã da Superliga B) estão plantando, correndo atrás, porque não fácil. O nosso Estado tem tradição de equipes no vôlei masculino, mas no feminino não. É um sonho voltar a Porto Alegre, encerrar a carreira jogando na Sogipa.
Tu pensas em se tornar treinadora de vôlei no futuro?
Não me vejo. Ter sucesso com jogadora de vôlei não significa que terá sucesso como técnica. Sonho sempre, sou inquieta, busco novos desafios, mas eu nunca me imaginei sendo técnica.