O Inter completou uma marca preocupante nesta semana. Já se vai um ano e meio sem que o time tenha feito um gol de falta direta. A última vez que uma infração se transformou em mudança de placar, sem que alguém mais tocasse a bola, foi em 15 de março de 2020, no jogo derradeiro antes do começo da pandemia. Foi de Edenilson, na goleada por 4 a 1 sobre o São José, no Passo D'Areia.
Desde então, o Inter não tem nem mesmo um cobrador definido. A falta de gols deixou a disputa aberta e uns quantos já tentaram a sorte: Heitor, Cuesta, Moisés, Edenilson e Guerrero arriscaram, mas nenhum deles marcou.
Trata-se de um problema que já se arrasta há algum tempo. Pegando um recorte de tempo das duas passagens de Diego Aguirre como técnico do Inter, foram apenas 12 gols em seis anos. D'Alessandro, atualmente no Nacional-URU, foi responsável por 25% deles.
Cobrar falta, segundo dois especialistas da função, é uma questão de treino, até mais do que de talento. Um dos grandes batedores colorados foi Ruben Paz, ídolo dos anos 1980. O uruguaio explica:
— Bater faltas é uma mistura de treino e talento. Claro que quanto mais treina, mais o talento aparece (risos).
Daniel Carvalho, cria da base colorada e cobrador com sucesso também em Palmeiras, Atlético-MG e outros, acrescenta:
— Em 2002, 2003, treinávamos com o Chico Fraga de manhã, só faltas. De tarde tinha o resto do trabalho. Então aprimorávamos. Depois tive a oportunidade de conviver com o Marcos Assunção no Palmeiras. Era brincadeira o que ele treinava. Bom, basta dizer que se tinha uma falta na entrada da área, a torcida já comemorava.
Nesse aspecto, até poderia ser compreensível que tenha diminuído a quantidade de gols. O calendário atropelado do futebol brasileiro impede que jogadores consigam treinar tanto. O risco de lesões aumenta se houver excesso. Por isso, a Série A teve apenas 10 gols em todo o primeiro turno mais a rodada inicial do returno.
Mas isso não se aplica ao Inter. O time atuou sete vezes nas últimas oito semanas. Tempo mais do que suficiente para garantir um espaço nas atividades para treinar faltas. Dos 23 gols que a equipe fez no Brasileirão, apenas um saiu de jogada de falta, o de Praxedes contra o Fortaleza, há exatamente um turno. Houve outros a partir de bolas paradas, como pênaltis e escanteios, é verdade, mas de infrações, nada.
— Hoje, com todas as comodidades que os jogadores têm, é possível aprimorar. Basta querer, ter iniciativa. Sugiro treinar um pouco todos os dias e aumentar a carga quando não houver partidas — amplia Ruben Paz.
Esse aspecto da tecnologia pode ajudar, segundo Daniel Carvalho. Os testes e equipamentos que medem o nível de fadiga muscular auxiliam os profissionais a medir a carga que cada profissional pode tentar, algo que não existia antigamente.
Aguirre sabe que tem um desafio pela frente. Em campeonatos equilibrados como o Brasileirão, o detalhe de uma cobrança de falta pode fazer a diferença. O Inter mesmo sentiu na pele. A última derrota, em 25 de julho, teve um desses 10 gols de falta da competição. Terans, do Athletico-PR, abriu o placar daquela partida cobrando na gaveta de Daniel. O último gol de falta do Inter no Brasileirão foi de Camilo, em 2018, em uma vitória sobre o Paraná que deu ao time de Odair Hellmann a liderança provisória da competição.
Gols de falta do Inter
• Edenilson - São José (2020)
• Guerrero - Univ. Católica (2020)
• D'Alessandro - Pelotas (2020)
• Rafael Sobis - Palestino (2019)
• Camilo - Paraná (2018)
• D'Alessandro - Vitória (2018)
• D'Alessandro - Grêmio (2018)
• Valdívia - Cruzeiro-RS (2017)
• D'Alessandro - Sampaio Corrêa (2017)
• Valdívia - Santos (2015)
• Cláudio Winck - Caxias (2015)
• Cláudio Winck - Juventude (2015)
*Levantamento de Marcos Bertoncello