São apenas 11 jogos com Miguel Ángel Ramírez, mas o trabalho do técnico espanhol à frente do Inter já apresenta resultados visíveis dentro de campo. A vitória por 6 a 1 sobre o Olimpia na quarta-feira (5) ajudou a reforçar a percepção de algumas características importantes da equipe. Uma delas é a veia goleadora.
Dos 26 gols assinalados na temporada, 21 saíram nas últimas quatro vitórias, duas pela Libertadores e duas pelo Gauchão. O número de triunfos por três ou mais gols de diferença, inclusive, já se aproxima dos cinco registrados nas 68 partidas em que o time foi comandado por Eduardo Coudet e Abel Braga entre 2020 e fevereiro de 2021.
Em mapeamento feito por GZH, percebe-se que a maior parte dos gols foi construída em jogadas tramadas. Ou seja, o Inter tinha a posse de bola contra um adversário postado e trabalhou até ter condições de finalizar — em três vezes, a chance apareceu por meio de lançamentos em profundidade, do meio-campo.
Rodinei marcou desta forma contra o Esportivo, assim como Patrick e Galhardo diante do Deportivo Táchira. A estratégia é movimentar a bola na zona de defesa, chamando o adversário e fazendo com que as linhas defensivas do oponente se adiantem. Isso facilita a chegada em velocidade dos atacantes para os lançamentos.
— O torcedor pode observar que, em muitos momentos, o Inter atrai o adversário para seu próprio campo, dá um lançamento longo e cria espaço nas costas da defesa. É quase como um contra-ataque, mas já tendo a posse, porque tem mais espaços — explica Gabriel Corrêa, analista tático do Footure FC.
A segunda maior fatia dos gols veio em lances de bola parada. Foram sete ao total: três de pênalti, dois de escanteio e dois iniciados em cobranças de falta. Só no 5 a 0 sobre o Esportivo foram três, com Zé Gabriel e Rodrigo Dourado, que aproveitaram faltas batidas por Rodinei, e Yuri Alberto, que converteu pênalti sofrido justamente pelo lateral.
Com sete assistências no ano, o ex-jogador do Flamengo tem se mostrado peça importante nesse artifício. Também foram dele os cruzamentos para os dois gols de Víctor Cuesta na Libertadores, contra Táchira e Olimpia, em jogadas muito semelhantes — escanteio pelo lado direito e o zagueiro aparecendo na linha da pequena área para cabecear. Contra os venezuelanos, aliás, Cuesta só não repetiu a dose porque parou no goleiro adversário, mas a execução do lance deu-se da mesma forma.
Colunista especializado em tática no site ge.globo e apresentador no SporTV, o jornalista Leonardo Miranda não acredita que jogadas iniciadas dessa forma indiquem necessariamente uma falta de repertório ofensivo. Ele aponta que é próprio do futebol atual ter muitos gols surgidos na bola parada.
— Ramírez é um técnico que pensa todas fases do jogo. Treinar a bola parada é muito importante para ele, porque aproxima a equipe da vitória. Hoje, o Inter é um time com variações, que busca diferentes formas de chegar ao gol — analisa.
O Inter ainda marcou quatro vezes em contra-ataques, sempre mostrando muita velocidade após retomar o domínio das ações. Essas talvez tenham sido as oportunidades mais claras, sempre com o atacante de frente para a meta adversária e sem nenhum zagueiro no encalço. Chama atenção o fato de os gols terem saído sempre depois de o time já estar vencendo. Diante do Olimpia, um passe de Edenilson colocou Marcos Guilherme e Yuri Alberto para apostar corrida com Diego Polenta, que foi facilmente batido — e ainda terminou o lance lesionado. O centroavante colorado só precisou empurrar para o gol paraguaio.
— Ramírez gosta de ser um cara muito vertical e tem cobrado isso dos seus jogadores. Quando se rouba a bola, a ideia dele é fazer uma transição rápida, seja com Mauricio, Marcos Guilherme, Caio Vidal ou Palacios. E o centroavante aproveitando — aponta Corrêa.
Derrotas não preocupam
Entre as quatro goleadas, o Inter teve, no entanto, dois tropeços em que não marcou gols. Na estreia pela Libertadores, foi à Bolívia e viu o Always Ready criar as melhores oportunidades e vencer por 2 a 0. Apesar da altitude de La Paz, Miguel Ángel Ramírez não quis atribuir o mau resultado às condições específicas da cidade a 3,6 mil metros acima do nível do mar. Ele admitiu que a equipe havia se preparado para outro tipo de enfrentamento contra os bolivianos, que mudaram de técnico poucos dias antes da partida.
— Treinamos uma coisa que foi modificada. Eles trocaram de treinador. Nossas informações eram baseadas em trabalhos anteriores. Não sabíamos bem como eles iriam se portar — afirmou o espanhol após o jogo.
No último final de semana, a derrota foi para o Juventude, pela primeira partida da semifinal do Gauchão. O gramado da Montanha dos Vinhedos, onde o Ju tem mandado suas partidas no Campeonato Gaúcho, foi apontado como principal fator para o Inter não ter mostrado bom desempenho.
Para Gabriel Corrêa, tanto a altitude como as más condições do campo em Bento Gonçalves tiveram influência no desempenho da equipe, mas não podem ser apontados como únicos fatores. A oscilação colorada, em uma fase ainda inicial de trabalho, é vista com naturalidade.
— O desenvolvimento desse modelo de jogo não vai ser linear, vai ter altos e baixos, mas que contou também com esses fatores (altitude e gramado). O Inter ainda está entendendo muita coisa, a circulação de bola ainda não é a ideal, mesmo nos jogos em que teve vitórias, mas tem melhorado muito. É claro que o torcedor não gosta, mas é uma oscilação natural — opina o analista.
Corroborando com Corrêa, Leonardo Miranda também vê as derrotas como parte do processo de amadurecimento da ideia de jogo proposta por Ramírez. Ele acredita que o gramado na Serra tenha prejudicado mais do que a altitude, no que acredita ter sido a pior atuação do Inter no ano.
— Vai ser uma evolução com percalços, com obstáculos, grandes vitórias e talvez algumas derrotas. Mas o time está evoluindo muito, e a entrada de Taison pode ajudar essa evolução a ser mais rápida para os objetivos da temporada, que talvez sejam títulos de Libertadores e Brasileirão — explica.
Os 21 gols em quatro jogos
- Jogadas tramadas: 8
- Conta-ataques: 4
- Bola parada: 7
- Bola recuperada: 1
- Contra: 1
O Raio X dos gols
Inter 6x1 Aimoré
- 1: gol de Heitor. Após jogada pela esquerda, Palacios tentou passe para Moisés, que dividiu com o defensor adversário. Na sobra, lateral-direito acertou chute de fora da área no ângulo.
- 2: gol de Thiago Galhardo. Centroavante aproveitou pênalti sofrido por Praxedes.
- 3: gol de Thiago Galhardo. Em contra-ataque, Inter apareceu na área com três jogadores contra apenas dois da defesa do Aimoré.
- 4: gol de Thiago Galhardo. Centroavante roubou a bola na entrada da área e ficou cara a cara com o goleiro.
- 5: gol contra de Tcharles.
- 6: gol de Paolo Guerrero. Centroavante recebeu passe de Moisés dentro da área, livrou-se da marcação e bateu no canto direito.
Jogada tramada: 2 / Contra-ataque: 1 / Bola parada: 1 / Bola roubada: 1 / Contra: 1
Inter 5x0 Esportivo
- 1: gol de Zé Gabriel. Zagueiro aproveitou falta cobrada por Rodinei e cabeceou para o fundo das redes.
- 2: gol de Nonato. Yuri Alberto puxou contra-ataque em velocidade e tocou para Nonato, cara a cara com o goleiro, chutar forte para ampliar.
- 3: gol de Yuri Alberto. Centroavante aproveitou pênalti sofrido por Rodinei.
- 4: gol de Rodrigo Dourado. Volante subiu mais alto do que a defesa e fez de cabeça após falta cobrada por Rodinei.
- 5 gol de Rodinei. Lateral recebeu passe em profundidade de Rodrigo Lindoso e, sozinho, bateu de pé esquerdo para o fundo do gol.
Bola parada: 3 / Jogada tramada: 1 / Contra-ataque: 1
Inter 4x0 Deportivo Táchira
- 1: gol de Víctor Cuesta. Zagueiro ganhou da defesa adversária pelo alto após escanteio cobrado por Rodinei pela direita.
- 2: gol de Patrick. Galhardo recebeu longo lançamento e, dentro da área, rolou para Mauricio. Na sobra, Patrick completou para o gol.
- 3: gol de Thiago Galhardo. Cuesta acertou belo lançamento do meio-campo, e Galhardo ampliou após ganhar do marcador.
- 4: gol de Yuri Alberto. Centroavante recebeu passe por elevação de Mauricio e correu cerca de 40 metros até concluir para as redes.
Jogada tramada: 2 / Contra-ataque: 1 / Bola parada: 1
Inter 6x1 Olimpia
- 1: gol de Víctor Cuesta. assim como contra o Táchira, zagueiro aproveitou escanteio cobrado por Rodinei pela direita e cabeceou para o gol.
- 2: gol de Edenilson. Converteu pênalti assinalado após toque na mão do defensor paraguaio.
- 3: gol de Thiago Galhardo. Após jogada pela esquerda, Marcos Guilherme chutou e Galhardo aproveitou o rebote do goleiro para ampliar.
- 4: gol de Thiago Galhardo. Tabelou com Praxedes e surgiu na cara do goleiro, completando com bonito toque por cobertura.
- 5: gol de Yuri Alberto. Após passe de Edenilson, recebeu de Marcos Guilherme para empurrar para as redes.
- 6 gol de Caio Vidal. Zaga não conseguiu afastar cruzamento, e atacante acertou finalização de bicicleta.
Jogada tramada: 3 / Bola parada: 2 / Contra-ataque: 1