— Não acabou. Não vamos parar. Porque nós sabemos que não terminou. Simplesmente, não acabou.
Isso é parte do que disse Abel Braga ao final do confronto contra o Flamengo, e quando você ligar o rádio na Gaúcha, torcedor colorado, essas frases estarão no ar. Na verdade, ao longo do dia, sem qualquer razão aparente, o torcedor se pegará pensando nisso. Até 21h30min desta quinta-feira (23), é impossível que não se desvie o foco para Inter x Corinthians e Flamengo x São Paulo, que jogarão ao mesmo tempo, na rodada final do Brasileirão. Ao time gaúcho serve a vitória combinada a uma derrota ou até empate dos cariocas.
Escovando os dentes pela manhã, naqueles momentos antes da aula remota ou do começo do expediente, você fará força para não se iludir. A expectativa é a mãe da desilusão. "Não ganhamos do Sport em casa, imagina", vai ser uma das desculpas. "Como vou esperar alguma coisa do São Paulo, que perdeu para o Botafogo?", tentará racionalizar.
Como é quinta-feira, 11h, na hora de preparar o almoço, ligará na Atlântida para desopilar. Mas é uma risada nervosa de alguma resposta do Potter e do Lelê ao Adams no Bola nas Costas. Já que ouviu até aí, não custa trocar para a Gaúcha, né? Saber as informações mais atualizadas, as projeções do time — "Será que o Edenilson se recuperou 100%?", "Como está Daniel Alves?". Na hora de comer, ouvirá a trilha do Globo Esporte.
E aí, a gente sabe, seu coração vai disparar. Todas aquelas imagens que passaram rapidamente em sua retina, e que você fez força para afastar, afinal não quer se iludir, bem, essas imagens voltarão. Você enxergará Yuri Alberto estufando o véu de noiva do Beira-Rio e Tiago Volpi fechando a meta no Morumbi. "O Barcelona tinha feito 4 a 0 no América do México e o Inter quase perdeu para o Al Ahly, né", recordará. A razão já está indo embora.
O tempo não passa. Teve aula, trabalho, café, filme, YouTube, e os ponteiros quase não giram. Você queria acelerar, ir ao Beira-Rio, mas não pode. Tente imaginar que é como em Yokohama, no Mundial, só que é na Padre Cacique, onde os demais títulos foram conquistados. Entende-se a frustração de não poder ir até ali, mas é o pior momento da pandemia, os hospitais estão superlotados. Ao mesmo tempo, é bem mais perto para enviar energias positivas do que foi naquela manhã de 17 de dezembro de 2006. Aliás, por que esse dia não sai de sua mente? Gabiru, o herói improvável daquele dia, responde:
— As pessoas acreditam porque aquela vez era bem mais difícil. Quem imaginou que a gente ia ganhar o Mundial? Pois é. A torcida pode confiar no Inter, sim.
Quanto mais perto da hora do jogo, mais você acreditará que perdeu definitivamente o juízo. Como dizem nas redes, "o Inter desgraçou sua cabeça". E toda aquela conversa de não se iludir mais? E a decepção pela expulsão de Rodinei, pela derrota no Maracanã? Mas então voltará a abrir o link ou a página do jornal. E perceberá que não está sozinho. O que o acometeu foi uma sensação conjunta, dividida entre os demais milhões de colorados. Da tristeza à esperança em 96 horas.
E a razão dessa mudança de humor, dessa ilusão, é a própria história do Inter, lembrada pelas mensagens de colorados. O torcedor do clube que ergueu um estádio onde antes havia água, até hoje é o único campeão invicto do Brasileirão e que ganhou o mundo superando o Barcelona tem razões para se iludir. Ainda mais ouvindo a outra parte do que discurso de Abelão:
— O Inter é um clube gigante e esses jogadores dignificam a camiseta.