O Inter e Palestino desta terça-feira (9), no Beira-Rio, o jogo que garantiu a vaga antecipada da equipe de Odair Hellmann às oitavas de final da Libertadores, foi emblemática e didática para a sequência da temporada colorada.
Emblemática porque, em 98 minutos (o tempo normal mais os acréscimos), Nico López e Paolo Guerrero demonstraram uma sintonia digna das grandes duplas de ataque. O resultado: Nico deu três assistências na vitória de 3 a 2 sobre os chilenos, enquanto Guerrero marcou dois gols (o volante Patrick fez o outro). E didática porque, pela segunda vez seguida na Libertadores, o Inter abriu 2 a 0 ainda no primeiro tempo e permitiu o empate em casa — por sorte, ao final, conseguiu o gol da vitória, ao contrário do 2 a 2 com o River Plate. Uma lição que deverá, enfim, ser compreendida pelos comandados de Hellmann.
Primeiramente, ao ataque. Mesmo com poucos treinos juntos — uma vez que Guerrero só pôde passar a trabalhar com o elenco a partir de 5 de fevereiro —, o ataque hispanohablante do Inter demonstrou um entrosamento poucas vezes visto. Nico e Guerrero transformaram o ataque colorado em um "toca y me voy", com tabelas insinuantes e cruzamentos certeiros.
— Guerrero e Nico são jogadores complementares. Nico faz gols e tem muita facilidade para dar assistências, é um jogador veloz, que tem muita qualidade. Além de grande inteligência para jogar. E, logo à frente, ele tem em Guerrero talvez uma das grandes referências da posição. Foi um início promissor, como fomos eu e Fabiano, lá atrás — comenta o ex-centroavante Christian, que no final dos anos 1990 formou com Fabiano uma dupla de ataque mortal para os adversários. — Dar "liga" em uma dupla é questão da característica de ambos e, no caso de Nico e Guerrero, até mesmo a língua espanhola ajuda os dois a se identificarem mais rápido. O fato de jogar ao lado de atleta deste quilate, um goleador, um jogador de Copa do Mundo, campeão, esta imagem tem uma força muito grande dentro do grupo — conclui Christian.
Alguns anos antes de Christian & Fabiano, o Beira-Rio era de Nilson e Maurício, a dupla de ataque do histórico Gre-Nal do Século. Para Nilson, o entrosamento de Nico e Guerrero é fruto da convivência dos atacantes no dia a dia, apesar do pouco tempo juntos.
— Esta sintonia já vem dos treinamentos. Mesmo com o afastamento do Guerrero, ele passou a treinar com afinco, a gente vê a vontade dele em campo, quer provar que ainda tem muito futebol. E Nico é um jogador inteligente, rapidíssimo, que casou muito bem com o estilo do Guerrero. E a presença de área dos dois é muito forte. Ambos começaram muito bem e com movimentações muito boas — diz Nilson Ezídio. — E há uma química também nestas duplas. Eu estreei num segundo tempo, quando perdíamos por 1 a 0 para o Coritiba (pelo Brasileirão de 1988). O que aconteceu? Eu e Maurício nos demos bem nos treinos. No jogo, dei uma assistência para o gol de empate (do meia Luiz Fernando Rosa Flores) e, em seguida, Maurício cruzou na área e eu marquei o gol da virada. Isto é entrosamento, química, características que se complementam e talento — acrescenta Nilson.
Agora, a parte dos erros. Uma vez mais, e no Beira-Rio, o Inter cedeu o empate. Ao contrário do que ocorreu diante do River Plate, o Inter ainda conseguiu o terceiro gol, o que tornou que falta de posse de bola e a cessão de espaços ao adversário algo menos grave.
— O Inter está de volta ao circuito dos grandes jogos e das grandes exigências. Com isto, vem a necessidade de dar um passo adiante na evolução tática e de desenvolver a habilidade de assumir o controle da partida. Controle do jogo também está condicionado ao nível do contexto que se está inserido, é uma evolução que vem também da maturação e das lições que se aprende em alto nível — pondera Eduardo Dias, analista do Projeto Footure. — Olhando para o campo, essa possibilidade na fase defensiva está mais perto de acontecer, sincronizando melhor a pressão na saída de bola do adversário, com os jogadores mais próximos, cortando linhas de passe e criando possibilidades de roubadas de bola perto do gol. Jogadores separados por pequenas distâncias e sincronização na pressão ao adversário, esta pode ser a chave para o controle, um aspecto fundamental para os grandes jogos quem virão — agrega Dias.
Em 2006, no ano da primeira Libertadores colorada, a arrancada também contou com sustos. Logo na estreia, o Inter batia o Maracaibo por 1 a 0, quando cedeu, nos minutos finais, o 1 a 1 aos venezuelanos. Depois, em dois jogos seguidos contra os mexicanos do Pumas, ainda pela fase de grupos, novos dramas. Na Cidade do México, o time de Abel Braga precisou virar para vencer por 2 a 1. No Beira-Rio, o Pumas fez 2 a 0 ainda no primeiro tempo, e o Inter precisou virar com Michel, Fernandão e Gabiru.
— Isso me parece mais desconcentração. Mas é aí que se vê a força do time, de buscar a virada, de vencer — avalia Rubens Cardoso, lateral-esquerdo campeão da América e do Mundial em 2006. — Mas é claro que é algo preocupante abrir 2 a 0 e levar o empate. É preciso aprender a sofrer na Libertadores. Talvez ainda falte um pouco de malandragem a este Inter, precisa aprender a esfriar o jogo. E a sofrer concentrado. Se fez o 2 a 0, fecha a defesa e tenta matar em um contra-ataque. Não dá para jogar de igual para igual contra um time que já está desesperado, precisando tirar uma desvantagem de dois gols. É preciso saber mudar a estratégia em meio ao jogo. Não é deixar de jogar, mas é seguir concentrado, mesmo com um 2 a 0. O Inter teve dois exemplos fortes em River e em Palestino. Acho que isto não se repetirá. A lição parece ter sido aprendida — encerra Cardoso.
Em 14 dias, na cidade de Lima, diante do Alianza, o Inter terá a chance de provar que aprendeu com os seus erros defensivos na Libertadores. Antes, porém, já neste domingo, o teste será bem mais forte: o começo das finais do Gauchão, contra o Grêmio, que, se puder, não perdoará possíveis novas falhas.