Se a demissão de Diego Aguirre a 72 horas do Gre-Nal foi justa só o tempo dirá. Mas a escolha do seu surpreendente substituto na Arena é quase um pedido de desculpas do destino, que foi cruel demais há 15 anos. De volante da seleção brasileira sub-20 condenado ao êxito no final da década de 90, acostumado a cantar o hino perfilado nos melhores estádios do mundo, na virada do milênio Odair Hellmann caiu no buraco anônimo do desemprego sem escalas ou rede de proteção. Se reergueria, como veremos, mas não sem antes quase se perder.
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Era uma vida de aeroportos chiques, pelos cinco continentes, para o menino nascido em Salete, interior de Santa Catarina. Em 1998, ombreou contra o timaço da Argentina de Riquelme, Saviola, Cambiasso e Aimar no Sul-Americano sub-20 do Chile e no Mundial da Malásia. Antes, erguera o tetra da Copa São Paulo pelo Inter, no mesmo ano. Ficou de fora da final contra a Ponte Preta, no Morumbi, por suspensão. Arriscou alguns comentários na cabine da Rádio Gaúcha, para se ter ideia de sua relevância para o time. Antes, integrou o grupo campeão gaúcho de 1997, desbancando o Grêmio campeão da Copa do Brasil.
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Odair não sabe o certo até hoje a razão do abandono ao voltar para o Beira-Rio após aquele empréstimo ao Fluminense de Parreira, ainda mais com o título da Série C na bagagem. Uma lesão no joelho esquerdo, talvez. Engessaram-lhe a perna para tratar uma distensão de ligamentos nas Laranjeiras, mas treinava normalmente quando ouviu de um funcionário a frase curta e seca, na alvorada do segundo semestre de 2000, após 14 anos dedicados ao Inter:
- Tu não serve mais.
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Três meses sem ser aproveitado, com o passe preso ao clube e a frase reverberando pelos tímpanos, mais o nó na cabeça por viver aquela situação enquanto os nomes de sua geração enriqueciam, mergulharam a carreira numa espiral descendente sem volta. Teve o salário rebaixado. Desvalorizou-se ao ponto de o empresário Luciano Cavalheiro comprá-lo por R$ 54 mil. Zanzou pelo Veranópolis de Tite e o América-RN. Tentava, tão somente, sustentar, à época, mulher, filho e enteado.
Arriscou-se no Enkopings, da quarta divisão sueca. E no Eastern, de Hong Kong. Tomou calote. Vendeu o carro para sobreviver. A fonte única de renda, que era o parcelamento dos atrasados do Fluminense, secou. Chegou a ter R$ 5 na conta. Pedia emprestado para amigos e familiares. Corria sozinho duas vezes por semana no Marinha do Brasil, para manter a forma. O time do Sindicato dos Atletas lhe garantia atividade.
Um drama, como se vê. A sorte só começou a mudar quando tomou coragem de pedir uma chance a Fernando Carvalho.
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Foi em 2008, após pendurar chuteiras no Remo. Carvalho lembrou de quem primeiro o alertou, ele na condição de dirigente da base, para um certo camisa 9 chamado Fernando Lúcio da Costa, do Goiás, companheiro de Odair no Mundial da Malásia. Carvalho arrumou-lhe uma chance, mas tendo de começar de baixo, com salário esquálido. Odair nunca mais esqueceu aquela mão estendida. Foi galgando categorias, uma a uma, até chegar aos profissionais com Dunga, que o levou para a comissão permanente sub-17 da CBF. Conversei com Odair lá atrás, quando sua vida parecia um pântano sombrio e desgraçado, muito antes de Carvalho cruzar-lhe o caminho. Ele disse, lá pelas tantas, os olhos marejados, sentindo-se humilhado diante dos amigos que perguntavam por onde estava, e a resposta era sempre "em lugar algum".
- Não vou me entregar.
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Odair, como se vê, é um homem de palavra, forjado na dor. Não pode ser tão ruim assim tê-lo no comando, mesmo que só por alguns dias e logo de cara em um Gre-Nal. Ainda mais quando se trata, claramente, de o destino pedindo perdão.
Imagens: Fernando Gomes
Novidade vermelha
Do fundo do poço ao topo: o retorno de Odair Hellmann ao Beira-Rio
A escolha do surpreendente substituto de Aguirre na Arena é quase um pedido de desculpas do destino, que foi cruel demais há 15 anos
Diogo Olivier
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