Ferreira completou contra o Aimoré o 100º jogo pelo Grêmio. Uma história marcada pela superação do jogador, que passou de reserva das categorias de base ao camisa 10 e principal esperança para a campanha do retorno à Série A. Pela marca, o atacante receberá uma camisa comemorativa com o número de partidas disputadas até o momento e uma homenagem da direção.
Após dois anos de polêmicas em negociações pela renovação, que chegou ao ponto de ter uma disputa jurídica, teve a situação resolvida no início desta temporada. De contrato renovado, com um salário e multa rescisória de acordo com um jogador do seu nível, também teve um outro gesto de valorização. Recebeu a camisa 10, que era de Douglas Costa até o início do ano, e herdou o posto de principal referência técnica do time.
— Muito feliz com a responsabilidade de usar a camisa 10. A camisa do Grêmio que é pesada, o número é um detalhe. Era um sonho meu de criança. Falei com o Douglas, pedi para ele. Me falou que a camisa era minha. É um grande amigo. Desejo muito sucesso para ele — disse Ferreira.
Natural de Dourados, no Mato Grosso do Sul, o atacante de 24 anos trilhou um caminho mais longo do que o habitual para jogadores da base que assumem protagonismo no nível profissional. Teve que rodar pelo São Luiz, Toledo e Cianorte antes de ter chances no clube. Acabou "trancado" por uma sequência de talentos revelados pelo clube na sua função. Antes de ter suas oportunidades, viu Pedro Rocha, Everton, Lima, e Pepê serem utilizados por Renato Portaluppi no time profissional.
— Trabalhamos com ele da importância de fazer o gol. Precisava de um trabalho fora do clube. Cuidamos da alimentação, ganhou massa muscular e passou a ter esse foco perto da área. E tem um talento para driblar que nasceu com ele — revela Pablo Bueno, empresário do jogador.
Em 2016, durante sua passagem pelo São Luiz em Ijuí que o jovem Aldemir virou Ferreira. Muito elogiado por Paulo Baier, principal jogador do clube contratado para a disputa da Divisão de Acesso do Gauchão, o atacante gremista de 18 anos teve sua primeira experiência em um campeonato profissional. No Interior, o atacante trocou de nome e conquistou a confiança dos companheiros da equipe. A campanha para o acesso não deu certo, o time foi eliminado na segunda fase, mas o desempenho do jovem chamou a atenção. Com 18 anos, jogando contra marcadores mais experientes e em campos ruins, marcou cinco gols e deu oito assistências em cinco meses no Interior.
— Era um jogador com potencial, mas tinha uma geração na frente, com Pedro Rocha, Everton e Pepê na frente. Por isso saiu para ganhar experiência, para não ficar parado. Era um jogador interessante, mas que na categoria dele não rendia tanto — relembra Junior Chávare, executivo da base nos primeiros anos do atacante.
Na volta a Porto Alegre, Ferreira foi novamente incorporado nas categorias de base. Comandado na época por Felipe Endres, o grupo de transição passou a convocar o atacante para os jogos.
— Sempre foi um menino de muito potencial. Jogava comigo como ponta, usei até de falso nove. Mas rendia melhor pelo lado. Era um atacante rápido com a bola nos pés — relembra o técnico.
Ferreira foi convocado para a disputa da Copa São Paulo do ano seguinte, mas jogou pouco. Foi reserva, entrando em quatro jogos. Terminou o ano utilizado em apenas 11 partidas no time sub-20, com quatro gols marcados no Gauchão da categoria. É aí que a relação com Paulo Baier entrou novamente em cena. Em entrevista concedida em 2020 para GZH, o ex-jogador relembrou a parceria que construiu com Ferreira. Após assumir como técnico do Toledo em 2018, Baier indicou Ferreira. O clube conquistou o objetivo, seguir na primeira divisão, e o Grêmio cedeu o atacante para o Cianorte na disputa da Série D do mesmo ano. No novo clube, não teve o mesmo rendimento. Participou de quatro partidas, três como titular, mas não convenceu e retornou ao Grêmio. Voltou a ser integrado ao Grupo de Transição e jogou alguns minutos no Brasileirão de Aspirantes.
— Nos momentos em que fui emprestado não tinha oportunidade, mas serviu de aprendizado para voltar mais maduro e preparado para buscar meu espaço no clube. Para mim sempre foi difícil, trabalhai e acreditei em mim — comentou Ferreira.
Novamente sem maior destaque, acabou emprestado ao Aimoré no ano seguinte. Sem jogar, e com uma lesão na face de pé, acabou acolhido pelo empresário Pablo Bueno. Fez o tratamento e ganhou a oportunidade de jogar o Brasileirão de Aspirantes. Felipe Endres tentou a contratação do atacante para o Pelotas, mas o jogador permaneceu e começou a se destacar. Terminou como artilheiro da equipe na competição e no ano seguinte entrou, finalmente, no radar de Renato Portaluppi. E superadas as polêmicas da sua situação contratual dos últimos anos, é esperança de gols para o Grêmio na disputa do Gauchão e também para a campanha de retorno para a Série A no segundo semestre. E leva como combustível a decepção da noite do rebaixamento, quem teve acesso aos bastidores do clube viu Ferreira como um dos mais abatidos com a situação.
— O guri ficou arrasado. Não teve férias, quis começar a treinar. Não queria nem olhar para o celular, sair para a rua — contou Pablo Bueno.
Ferreira também lembra do clima no vestiário. Lembra que o time acreditou que conseguiria escapar da queda após passar quase todo o campeonato na luta contra o rebaixamento, mas que a noite terminou em frustração no vestiário.
— Ficamos todos sem chão — resume.
Agora, com a tão sonhada camisa 10 nas costas, assumiu a condição de ser uma das referencias do grupo e também do vestiário. Puxa fila nos treinos e também é um dos jogadores que é ouvido quando pede a palavra nos momentos de concentração. Uma nova versão do atacante, com a experiência acumulada pelas dificuldades na trajetória.