O terno bem cortado e o português arrevesado escondem a origem. Mineiro de Mutum criado em Olaria, no Rio, Fabiano Soares é a novidade na ciranda de treinadores do Brasileirão. Uma novidade importada, embora nascida no Brasil. A influência europeia vai além do estilo à beira do campo e do sotaque. Os conceitos no trabalho que começa a ganhar corpo no Atlético-PR e os diplomas de técnico obtidos nos cursos da Uefa atestam sua formação.
Fabiano completa neste domingo, contra o Grêmio, 40 dias no cargo. Chegou como ilustre desconhecido. Também pudera. Cumpriu quase toda a sua trajetória como jogador e técnico na Espanha. Criado no Botafogo, saiu de Marechal Hermes antes mesmo de virar profissional. O que era comum em sua geração, que até tinha nomes talentosos, como Luizinho Quintanilha, campeão brasileiro e da Libertadores pelo Vasco. O problema era que o bicheiro Emil Pinheiro bancava o clube e as contratações, o que restringia o espaço da gurizada.
Mas a passagem pelo Botafogo, se não resolveu imediatamente a vida de Fabiano, serviu para ajudá-lo a voltar ao Brasil agora. Na metade da década de 1980, o clube acolheu nos juniores um preparador físico recém-chegado do futebol árabe e desconhecido no Rio. Era Paulo Autuori, que pouco depois virou técnico da gurizada.
Leia mais:
Lincoln revela motivação no Grêmio: "Quero que meu filho tenha orgulho do pai"
Incomodado com novela Luan, Renato reclama de vazamentos de "X-9 que não segura a língua"
Grêmio x Atlético-PR: tudo o que você precisa saber para acompanhar a partida
– O Fabiano ficou muito próximo do Paulo Autuori. Tenho certeza de que a vinda para o Atlético-PR tem seu dedo. Ele o influenciou muito como técnico. Se olhar, verá que o Fabiano tem no campo trejeitos do Autuori - conta Luizinho, hoje auxiliar-técnico de Jorginho, com quem esteve no Bahia.
Luizinho era o 10 dos juniores do Botafogo. Fabiano, um volante clássico. Os dois viraram grandes amigos. A distância não separou o vínculo criado na adolescência. O pai de Luizinho era o chefe da torcida Pais Fogão, que reunia familiares dos jogadores. Não foram poucos os lanches que o então camisa 10 filou na casa dos Soares em Olaria.
Em 1993, quando trocou o Botafogo pelo Celta, de Vigo, Luizinho foi acolhido pelo amigo. Fabiano já era consagrado no Compostela. Sua contratação agitou a Galícia. Reserva no Celta, onde havia chegado em 1990, passou a temporada encostado. O presidente do Compostela, Jose Maria Caneda, soube do contrato por se encerrar e acertou sua transferência. O assunto era segredo de estado, dada a rivalidade. Só que o Celta precisou do volante e o usou nas rodadas finais. Fabiano foi tão bem que recebeu proposta de renovação.
– Tirei-o do Celta, um lance de mestre. Jogava muito, era tão bom como o Guardiola. Mas de temperamento, em campo, se transformava. Quando pegava o adversário, ninguém via. E olha que pegava firme. Mas era excelente profissional, exemplar – conta Caneda.
Fabiano fixou residência na cidade. Voltou ao Brasil em 2001, aos 35 anos. Jogou o Brasileirão pelo Botafogo, em um time que tinha Léo Moura na lateral-direita e Dodô no ataque.
Foram poucos meses antes de voltar para mais um ano no Compostela. Passou pelo Racing Ferrol, da Segunda Divisão, e iniciou a trajetória como técnico. Trabalhou na base do Celta e, outra vez, partiu dali para o Compostela. Em 2011, o Estoril, clube da Traffic em Portugal, pediu ao técnico Vinícius Eutrópio sugestões para ser seu auxiliar.
- Tem um primo meu, que está na Europa muito disposto a trabalhar - disse Eutrópio ao presidente Tiago Ribeiro, brasileiro como a Traffic.
Foi neste momento que Fabiano começava de vez sua carreira de técnico. No Estoril, foi auxiliar até março de 2015, quando assumiu no lugar de José Couceiro. Fechou a temporada em 12º. Na seguinte, foi oitavo, a três pontos da Liga Europa. Caiu em dezembro.
– Ele é um sujeito correto. Tímido, é muito contido. Nas entrevistas, parece se enrolar um pouco. Mas, no vestiário, sabe como passar ao grupo – diz Tiago.
O atacante Bruno Gomes, do Inter, reforça o que diz o ex-dirigente. Trabalhou por cinco meses com Fabiano no Estoril. Define-o como "na dele" e um sujeito correto. Recorda que o começo entre eles foi tenso. Ansioso por jogar, Bruno reclamou em um treino de forma áspera. O arrependimento veio em segundos. No vestiário, o procurou. Nem teve tempo de terminar.
– Tranquilo, entendo. O que acontece no campo, fica lá – disse Fabiano.
Segundo Bruno, Fabiano busca estar próximo dos jogadores. Mais ouvindo do que falando. Afinal, a timidez é uma das marcas deste europeu criado em Olaria.
Leia outras notícias sobre o Grêmio
*ZHESPORTES