Mais um caso de injúria racial foi registrado em uma partida de futebol no Interior. No sábado (15), o Rio Grande recebia o 12 Horas, de Porto Alegre, em jogo válido pela Terceirona do Gauchão quando Paulo Renato Laranjeira, identificado como porteiro do time mandante, referiu-se ao volante Choco, do 12 Horas, como "negro de m...".
O lance se deu nos minutos finais da partida, que terminou empatada em 1 a 1, quando Choco afastou uma bola para a lateral e vibrou. Como resposta, ouviu a injúria racial.
— Foi uma situação revoltante. Eu estava naquela empolgação porque a gente estava buscando um ponto importante, vibrei muito em um desarme que fiz, e ele ficou brabo. Na hora, escutei e já perdi a atenção do lance, fiquei totalmente focado no que ele falou. Fui para cima dele na grade, com muita raiva. Só não fiz algo pior porque meu time mesmo me pediu calma — relata o atleta, que tem 19 anos.
O árbitro Giovane Santos de Souza relatou o episódio na súmula. Ele solicitou que os jogadores retornassem ao gramado e acionou a equipe policial presente no estádio para verificar o ocorrido. Após o jogo, Choco registrou um boletim de ocorrência na 7ª Delegacia de Polícia da cidade e afirmou que pretende dar seguimento ao processo de forma judicial.
— A gente tem de falar, tem de colocar para fora essas coisas. As pessoas têm de ver que ainda existe tipo de pessoa e que esse tipo de coisa ainda acontece — declarou.
Nota fala em "mal-entendido"
A direção do Rio Grande enviou uma nota a reportagem de GZH. O texto, assinado pelo presidente Cláudio Diaz, não nega que Laranjeira tenha proferido a injúria racial, mas justifica dizendo que as frases eram destinadas a outra pessoa. A vítima seria, neste caso, o jogador Jô, do próprio time da casa. A justificativa é de que Laranjeira mantém boa relação com o atleta. Confira a nota abaixo:
"A Diretoria do Sport Club Rio Grande vem através desta esclarecer o mal-entendido ocorrido no sábado (15), em jogo válido pela Terceirona do Gauchão, onde o Rio Grande recebia o 12 Horas, de Porto Alegre, no Estádio Arthur Lawson.
Conforme o termo de declaração, em anexo, sobre a acusação de injuria racial o Sport Club Rio Grande esclarece que: Paulo Renato Laranjeira, porteiro do time mandante, se referia ao jogador do Rio Grande, de número 11, conhecido por Jô.
Paulo Roberto confirma ter realmente proferido as palavras: vais para a seleção, nego de merda, com esse teu futebolzinho, mas se dirigindo ao jogador Jô, o qual o conhece há muito tempo.
Esclarecemos também que Paulo Roberto é frequentador do clube, trabalhou no clube, mantém muito boa relação com os jogadores e atuava como porteiro durante a partida do último sábado e o que houve, foi um mal-entendido, onde o jogador do adversário entendeu que a ofensa era para ele, o que não foi à intenção.
O Sport Club Rio Grande é contra qualquer tipo de atitude racista e garante que esta Presidência, bem como o Conselho Deliberativo, é contra todo e qualquer ato de preconceito."
FGF divulga nota
Na manhã desta segunda-feira (17), a Federação Gaúcha de Futebol publicou em seu site oficial uma nota sobre o assunto. No texto, se coloca à disposição para providenciar o apoio ao atleta e encaminhar a súmula da partida ao TJD-RS para que as medidas cabíveis sejam aplicadas. Leia abaixo:
"A Federação Gaúcha de Futebol - FGF vem a público manifestar repúdio ao comentário com teor racista proferido por uma pessoa presente no Estádio Arthur Lawson, em Rio Grande, ao atleta Deivisson Santos da Silva, do Esporte Clube 12 Horas, durante partida da 5ª rodada da Segunda Divisão - Gauchão 2021, disputada neste sábado (15).
O árbitro, Sr. Giovani Santos de Souza, tomou conhecimento do episódio, e, seguindo as diretrizes da Fifa para acontecimentos desta natureza, determinou a paralisação imediata do jogo entre Sport Club Rio Grande e Esporte Clube 12 Horas e acionou a Brigada Militar para controlar a confusão. A Federação se compromete a providenciar o apoio necessário ao atleta e dar o encaminhamento da súmula e do relatório da partida para que o Tribunal de Justiça Desportiva do Rio Grande do Sul - TJD/RS faça a apuração e julgamento dos fatos.
A FGF, em 2020, lançou, em parceria com Ministério Público, Polícia Civil e OAB/RS, a campanha "Juntos – Contra a Violência e o Preconceito", com o objetivo de combater hostilidades dessa ordem nos campos de futebol do Rio Grande do Sul. Repudiamos qualquer ato de discriminação e reiteramos que recusamos o racismo em todas as suas formas de manifestação."
Caso semelhante em 2019
Dois anos atrás, a comissão do 12 Horas passou por situação parecida no mesmo Estádio Arthur Lawson. Na oportunidade, um torcedor do Rio Grande foi preso em flagrante por chamar o presidente Marcus Oliveira de "negro safado".
O dirigente conta que, além das injúrias raciais, o clube porto-alegrense foi mal recebido desde que chegou ao estádio para o duelo.
— Em 2019 a gente foi tri mal recepcionado lá, os banheiros pareciam ter sido riscados com cocô. Estava sem luz e sem água no vestiário. No fim do jogo, um torcedor deles chegou no nosso alambrado e começou a nos fazer um monte de xingamentos, me chamou de negro safado — recorda ele.