A Argentina superou a Holanda, nos pênaltis, na sexta-feira (9), e avançou para disputar a sua segunda semifinal de Copa do Mundo nos últimos 30 anos. O caminho até a decisão, que teve derrota inesperada para a Arábia Saudita logo na largada, foi marcado por mudanças jogo a jogo do técnico Lionel Scaloni. O Desenho Tático de GZH mostra como o treinador argentino mexeu no seu time ao longo da competição.
Técnico mais novo desta Copa do Mundo, com 44 anos, Scaloni não teve receio de mexer na equipe e sacar jogadores antes titulares indiscutíveis da seleção sul-americana. Mudar peças tem sido uma marca do treinador. Ele não repete a escalação de uma partida para outra desde a Copa América de 2019, no Brasil. No entanto, nos últimos tempos, as variações vinham ocorrendo sem alterações significativas de sistemas táticos.
Desde que estabilizou a Argentina com a campanha de título da Copa América de 2021, também no Brasil, Scaloni vinha adotando variações simples entre o 4-4-2 e o 4-3-3, muitas vezes sem mudança de peças com o recuo de Di María para formar uma linha de quatro com Paredes, De Paul e Lo Celso. Foi assim que a Albiceleste derrotou o Brasil no Maracanã e interrompeu a seca de 28 anos sem títulos de sua seleção principal.
A lesão de Lo Celso antes da Copa do Mundo, no entanto, foi fator decisivo para a busca por alternativas. Scaloni reconheceu antes do Mundial não ter outro meio-campista com as mesmas características do jogador do Villarreal e admitiu a necessidade de adaptações.
Assim, a Argentina estreou na Copa do Mundo com Papu Gómez, um homem mais ofensivo, na vaga de Lo Celso. O sistema tático foi o 4-2-3-1 com Messi centralizado, Papu pela esquerda e Di María pela direita.
Esse trio, porém, se juntou ao centroavante Lautaro Martínez em uma ideia de ter quatro jogadores em cima da última linha para tentar explorar a marcação alta da Arábia Saudita.
A Argentina fez um bom primeiro tempo, quando abriu o placar e teve três gols anulados justamente por cair nas armadilhas da linha de impedimento saudita. A virada inesperada no segundo tempo e a derrota que impactou o mundo mostraram para Scaloni a necessidade de buscar maior equilíbrio no meio-campo. Além disso, a preocupação com jogadores que não estavam 100% fisicamente contribuiu para cinco trocas na partida já decidida com o México na segunda rodada.
Impedida de perder para evitar a eliminação precoce, Argentina foi a campo com cinco novidades. Mac Allister foi a opção no lugar de Papu Gómez para a equipe voltar a ter um tripé no meio-campo. Antes titular indiscutível, Paredes saiu pela questão física, cedendo lugar a Guido Rodríguez, um volante de maior característica defensiva. Na zaga, Otamendi foi o único do quarteto defensivo da estreia que permaneceu.
A Argentina iniciou no 4-3-3 tendo Di María, Messi e Lautaro como trio de frente, mas com uma variação na forma de atacar. Diante de um adversário que se postou com três zagueiros e dois alas, a Argentina teve Guido Rodríguez entre Otamendi e Lisandro Martínez para a saída de três, liberando Acuña para funcionar como um ala.
Na direita, Di María teve o papel de jogar aberto enquanto o lateral Montiel teve uma função de construtor. A ideia consistia em acumular jogadores no setor, atrair adversários e tentar abrir espaços na esquerda para Acuña explorar.
O jogo argentino não fluiu diante do México e o primeiro tempo terminou com apenas uma finalização sul-americana. O 1 a 0 veio na etapa final em um chute de Messi da entrada da área, onde pesou a qualidade individual do craque por cima da frouxa atuação coletiva. Em vantagem, Scaloni sacou Di María para entrada de zagueiro Cuti Romero. Foi o primeiro momento de uso da linha de cinco defensores, algo que havia sido testado no amistoso com os Emirados Árabes, realizado uma semana antes do Mundial.
Além da mudança de sistema, outra troca de nomes de jogadores foi decisiva para a vitória. Enzo Fernández, que ingressou por Guido Rodríguez para o time ter volante mais ofensivo, marcou o segundo gol da partida e garantiu sua titularidade para a sequência do Mundial.
Veio o confronto com a Polônia, quando mais quatro trocas de jogadores foram feitas. Além de Enzo por Guido, Molina voltou para a lateral e Romero foi escalado na zaga para aumentar a estatura do setor diante do duelo com Lewandowski.
No ataque, Álvarez ganhou a vaga de Lautaro Martínez. O jogador do Manchester City funcionou como o homem mais adiantado na fase ofensiva, mas teve o papel de recompor pela esquerda sem a bola. A Argentina passou a jogar em um 4-3-3 tendo Messi como falso 9, como nos tempos do Barcelona de Guardiola.
Como contra o México, a Argentina sofreu no primeiro tempo diante da Polônia. O placar foi aberto apenas no começo do segundo tempo com Mac Allister. Em vantagem, Di María sentiu lesão e teve de ser substituído. Scaloni partiu, então, para mais um novo sistema.
Paredes entrou e o time passou a ter um 4-4-2 com quatro meio-campistas de origem. A entrada de Paredes deu liberdade para Fernández avançar. Foi dele a assistência para Álvarez completar o 2 a 0 e garantir a classificação com o primeiro lugar do grupo.
A lesão tirou Di María do duelo de oitavas de final com a Austrália. A opção foi pela titularidade de Papu Gómez com a manutenção do 4-3-3, apenas com a inversão do lado de Lautaro, pois Papu ocupou o setor esquerdo.
Messi tirou da cartola um outro golaço em um jogo no qual a Argentina enfrentou dificuldades no primeiro tempo. Na etapa final, Scaloni sacou Papu Gómez para a entrada de Lisandro Martínez. Novamente linha de cinco defensores e melhora da Argentina. Ainda que tenha sofrido e precisado de uma mão salvadora do goleiro Emiliano Martínez no último lance, a Argentina enfileirou chances desperdiçadas nos últimos 45 minutos.
Como Di María não estava 100% e diante de uma Holanda que vinha atuando com três zagueiros e tendo no apoio dos alas seu ponto forte, Lionel Scaloni apostou em iniciar pela primeira vez com três zagueiros, o que seu time já estava acostumado pelas utilizações diante de mexicanos e australianos.
Com três zagueiros, laterais argentinos ganharam liberdade para atacar simultaneamente, uma fórmula de sucesso. Pela direita, Molina marcou o primeiro gol após passe magistral de Messi. Pela esquerda, Acuña sofreu o pênalti que o camisa 10 converteu no segundo gol.
A Argentina sofreu com a bola aérea holandesa na reta final do jogo e acabou cedendo o empate por 2 a 2. Longe das melhores condições físicas, Di María entrou apenas no segundo tempo da prorrogação, quando Scaloni desmanchou a linha de cinco defensores e os argentinos criaram seis chances claras de gol.
A classificação veio nos pênaltis e agora a Argentina irá buscar diante da Croácia a vaga na final para manter vivo o sonho do tricampeonato. Com Scaloni é possível esperar que venha uma nova mudança tática na equipe para enfrentar os algozes do Brasil no Mundial do Catar.
Independentemente do sistema, no entanto, o que não tem mudado na Argentina é a liberdade de movimentos para Messi. O camisa 10 é um jogador livre quando os argentinos atacam, ainda que tenha a preferência por receber a bola entre o setor direito e o centro ofensivo, e tem feito sua melhor Copa do Mundo. Scaloni sabe que os ajustes de peças devem ajudar a compensar as questões coletivas do time sem mexer em sua principal individualidade. Essa tem sido a fórmula do sucesso argentino no Catar até então.