A final da Copa do Mundo de 2022 entrou para a história como a mais emocionante de todos os tempos. O fim do jejum dos argentinos após 36 anos veio em uma partida que será eternamente lembrada pela emoção, mas que teve também um domínio tático do time de Lionel Scaloni por 80 minutos e que o talento de Kylian Mbappé conseguiu igualar.
O retorno de Di María ao time titular da Argentina foi a grande surpresa da final. Isso porque o camisa 11 não iniciava uma partida desde a vitória sobre a Polônia, na última rodada da fase de grupos, quando sofreu um problema muscular. No mata-mata, ele havia entrado apenas nos minutos finais da prorrogação com a Holanda, nas quartas de final.
Mais do que a presença, o posicionamento de Di María foi uma novidade. Scaloni apostou em escalá-lo aberto pelo lado direito diante da marcação de Koundé, zagueiro que tem jogado como lateral fugindo da expectativa de que Di María fosse atuar em sua posição natural — pela direita, e em cima do lateral-esquerdo Theo Hernández, que apresentou dificuldades defensivas ao longo da Copa do Mundo.
A Argentina se postou no 4-4-2 tendo De Paul pela direita para auxiliar Molina na marcação de Mbappé. Enzo Fernández cuidou de Griezmann enquanto Mac Allister teve um papel importante na hora que a Argentina retomava a bola. Ele adiantava pela meia esquerda causando dúvida para o volante Tchouaméni e Koundé sobre quem deveria adiantar nele. Isso foi fundamental para Di María ter liberdade nas ações ao longo do primeiro tempo.
A estratégia de Scaloni funcionou perfeitamente e a Argentina dominou completamente o primeiro tempo. A equipe sul-americana abriu 2 a 0 e não permitiu nenhuma finalização aos europeus. A marcação conseguiu controlar Griezmann e isolou Mbappé. O camisa 10 terminou a primeira etapa com apenas onze toques na bola, o segundo jogador francês que menos toques, atrás apenas de Giroud.
Giroud sequer terminou a etapa inicial. Diante da superioridade argentina, Didier Deschamps fez duas trocas aos 40 minutos. Além de Giroud, Dembelé foi sacado. Entraram Kolo Muani e Thuram, que passou a ser o ponta esquerda com Mbappé sendo centralizado.
As mudanças de Deschamps não resultaram em melhora da França. A Argentina seguiu superior na etapa final perdendo chances para o 3 a 0. Mbappé conseguiu finalizar pela primeira vez apenas aos 70 minutos de jogo em chute por cima do gol de Martínez.
Deschamps foi para o tudo ou nada sacando Griezmann e Theo Hernández para as entradas de Coman e Camavinga – volante do Real Madrid entrou improvisado como lateral-esquerdo. A França passou a ter quatro jogadores ofensivos – três deles mais descansados – em cima da defesa argentina. Na Argentina, Di María, cansado, deu lugar a Acuña perdendo força ofensiva no setor esquerdo do ataque.
Aí entrou a dose de aleatoriedade que sempre pode aparecer no futebol. Após um lançamento sem muito perigo, Otamendi se atrapalhou, acabou perdendo para Muani e cometeu o pênalti que Mbappé converteu. Não deu nem tempo de a Argentina reagir e Mbappé apareceu com toda sua qualidade para em um voleio vencer Emiliano Martínez e empatar a partida.
O que se viu nos minutos finais do tempo normal e a na prorrogação foi um jogo que saiu completamente do controle dos dois técnicos com as equipes alternando chances. A última jogada da partida evidenciou bem isso com Dibu salvando a Argentina com uma defesa com o pé esquerdo e no contra-ataque Lautaro Martínez cabeceando para fora a oportunidade de dar o tri para a Albiceleste antes dos pênaltis.
O domínio tático de Scaloni sobre Deschamps em 70 minutos do confronto não foi suficiente para evitar o sofrimento argentino. Muito disso porque a qualidade de Mbappé foi capaz de superar toda a mecânica tática que a Argentina apresentou com sucesso na maior parte do tempo regulamentar.
A Argentina sai da Copa do Mundo com o tri vindo de um sofrimento que não condiz com sua superioridade no duelo tático da partida. Mas para quem estava há 36 anos esperando por isso, talvez tenha sido até mais saboroso ganhar com sofrimento.