A associação que reúne 38 torcidas organizadas da Argentina obteve na Justiça uma medida cautelar proibindo o governo do país vizinho de fornecer às autoridades brasileiras a lista de brigões impedidos de entrar em estádios.
Durante a Copa do Mundo, mais de 700 barrabravas argentinos, boa parte com histórico de violência, desembarcarão em Porto Alegre. A Polícia Federal aguardava a relação dos envolvidos em brigas para monitorar possíveis confrontos.
Conforme a advogada da Hinchadas Unidas Argentinas, Debora Hambo, que ingressou com a ação na Justiça, o receio dos torcedores é sofrer perseguição por parte da polícia brasileira.
- Na Copa da África do Sul, em 2010, o governo argentino entregou dados pessoais de torcedores ao governo sul-africano. Esses torcedores foram agredidos, presos e deportados sem qualquer envolvimento em confrontos. Não queremos que isto se repita - disse a advogada a Zero Hora (leia entrevista abaixo).
Um torcedor argentino morreu na África do Sul, mas Debora ressalta que ele foi vítima de infarto, sem envolvimento em pancadarias.
Em Porto Alegre, Jorge Martins, conhecido como Hierro - antigo líder da Guarda Popular, torcida organizada do Inter -, é quem organiza a vinda dos torcedores argentinos.
Hierro prepara um esquema de transporte e alojamentos no bairro Partenon, nas proximidades do Campo da Tuca, para hospedar centenas de membros da Hinchadas Unidas. O ex-líder de torcida responde a um processo por tentativa de homicídio e está afastado dos estádios desde 2011, quando se envolveu em um tumulto no Beira-Rio.
A chegada dos barrabravas preocupa tanto que representantes da Polícia Federal, na semana passada, se reuniram com o embaixador da Argentina no Brasil, Luis María Kreckler, em Brasília, para cobrar o envio da lista de brigões - o governo argentino já havia se comprometido a repassá-la, em um acordo firmado entre os dois países. Kreckler garantiu que agilizaria o processo, mas não contava com a decisão da Justiça do próprio país.
Procurada por Zero Hora, a Polícia Federal afirmou por meio de sua assessoria que só comentaria o assunto após conhecer a medida cautelar.
"A polícia é braba e atua com muita força"
Entrevista | Debora Hambo, advogada da Hinchadas Unidas Argentinas
Satisfeita com a cautelar expedida pela Justiça argentina, a advogada Debora Hambo atendeu ZH por telefone, de Buenos Aires.
Zero Hora - Brigas de torcida na Argentina são notícia frequente. Proibir autoridades brasileiras de saber quem são os torcedores que virão à Copa não é um atentado à segurança do evento?
Debora Hambo - Os dados pessoais das pessoas são privados. Por que a polícia brasileira precisa conhecer as pessoas que tiveram problemas em estádios da Argentina? Isso é aceitável apenas se essas pessoas autorizarem o governo argentino a repassar seus dados para um governo estrangeiro.
ZH - Mas a senhora reconhece que muitos torcedores que virão à Copa têm histórico de violência?
Debora - Alguns têm problemas. Mas, quando um torcedor é proibido de ingressar em um estádio (por envolvimento em brigas), ele pode frequentar outros estádios. Suas restrições se limitam àquele estádio onde o problema ocorreu. Em Porto Alegre também é assim: um torcedor impedido de entrar no Beira-Rio pode assistir a um jogo no Rio de Janeiro.
ZH - A senhora acredita que haverá brigas envolvendo argentinos em Porto Alegre?
Debora - Não. Eles vão para desfrutar a festa. O Mundial é uma festa do futebol. Mas a polícia brasileira é braba e atua com muita força. Na Copa da África do Sul, em 2010, o governo argentino entregou dados pessoais de torcedores ao governo africano. Esses torcedores foram agredidos, presos e deportados sem qualquer envolvimento em confrontos. Não queremos que essa perseguição se repita.
ZH - Por que devemos acreditar que os barrabravas serão pacíficos aqui?
Debora - A violência na Argentina ocorre dentro das torcidas organizadas. São problemas internos, não entre times adversários. Para a viagem ao Brasil, cada torcida da Hinchadas Unidas vai escolher 30 ou 40 torcedores, ou seja, não haverá grupos rivais. Estamos armando esse projeto e arrecadando dinheiro para a viagem há quatro anos.