Quando recebeu o convite para comandar a Fórmula-1 e suceder ao patriarca Bernie Ecclestone, 86 anos e quase quatro décadas à frente da categoria, o nova-iorquino Chase Carey pediu um tempo para pensar. Dez segundos depois – uma eternidade nas corridas e um piscar de olhos dos negócios – respondeu sem titubear: sim.
– Há a oportunidade de fazer algo especial. Podemos levar a F-1 a outro nível – disse Chasey em setembro passado, quando a complexa negociação para o grupo Liberty Media comprar a categoria por US$ 8 bilhões (R$ 26 bilhões) foi selada.
Quatro meses depois, a consolidação financeira do acordo o alçou ao posto de mandachuva da categoria. A tarefa não é simples. Desde que transformou garagistas em magnatas da velocidade, Bernie conquistou confiança e se adonou da F-1.
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Tornou-se bilionário vendendo e revendendo os direitos de transmissão das corridas. Centralizador, expandiu o negócio com o mantra "quem paga mais, leva". Odiava contrato. Para ele, valia a palavra. Tudo no fio do bigode, como diz o ditado.
– O Bernie é um time de uma pessoa. Isso não é o certo no mundo de hoje. O processo de decisão não é tão eficiente. Ele mesmo falou que ele era um ditador. Dirigiu o esporte como um ditador durante muito tempo. Penso que agora é preciso uma nova perspectiva – resumiu Carey, 62 anos, que nomeou Bernie para o decorativo cargo de presidente emérito.
Enfrentar o poder de Ecclestone não amedronta Carey, que prefere ser chamado de Chase, embora seja Charles de batismo. Medo e velocidade ele conhece desde jovem, quando ainda era universitário.
Na época, viajava para um jogo de rúgbi, uma de suas paixões, e o carro bateu, o fazendo atravessar o para-brisa. Saiu vivo, mas herdou uma cicatriz no rosto que, até hoje, faz questão de esconder com um proeminente e estilizado bigode.
Carey estudou matemática e economia em Nova York e fez MBA em Harvard. Começou a carreira trabalhando na produtora de cinema Paramount, mas projetou-se, mesmo, depois que entrou na Fox, do grupo News Corporation, em 1988. Lá, teve um papel-chave no lançamento dos canais Fox Sports e Fox News.
Em 1993, deu uma cartada certeira ao arrebanhar os direitos de transmissão da NFL por US$ 1,6 bilhão. A jogada lhe fez virar braço-direito do poderoso barão da mídia Rupert Murdoch, que o chamou de "parceiro e conselheiro de confiança". Dali em diante, decolou.
Em 2003, virou chefe da DirecTV, emissora via satélite que seria comprada três anos depois pelo Liberty Media. Em seis anos, bateu a meta de conseguir mais de 1 milhão de assinantes para o serviço. Saiu de lá para presidir a News Corporation, chegando a ser apontado como possível sucessor Murdoch.
Como o filho James assumiu a empresa, Carey foi para a vice-presidência da 21st Century Fox, um dos mais fortes conglomerados de cinema e TV dos EUA.
– Trago uma longa carreira no negócio de mídia, com o esporte tendo sido uma grande parte dele. Estive envolvido neste negócio de uma perspectiva de TV. Então, entendo a importância de eventos ao vivo – garante o novo chefão da F-1.
Muitas mudanças e mais transparência até 2020
Confiante, Carey é hábil negociante. Apesar de conciliador, costuma ser direto. Com ele, é sim ou não. Mas, entre o hambúrguer e a batata-frita que não abre mão nem nos almoços de negócio, sabe ser durão.
Em 2010, por exemplo, travou dura batalha com TVs a cabo pela transmissão da World Series, fase final da liga americana de beisebol. Após dois jogos não serem exibidos e a torcida chiar, venceu a queda de braço e conseguir fazer com que chegassem aos termos que desejava.
– Carey sabe como ouvir e delegar, é impressionante nas reuniões e tem muitos bons profissionais ao seu redor – disse o diretor-executivo da McLaren, Zak Brown, à imprensa britânica.
Saber ouvir, aliás, o fez trazer para a gestão da F-1 dois especialistas: Sean Bratches, ex-executivo da ESPN que cuidará da área comercial, e Ross Brawn, multicampeão por Benetton, Ferrari e Brawn GP.
Afinal, Carey não é fã de corridas. Foi a uma pela primeira vez no ano passado, em Cingapura. Ama, mesmo, futebol americano – torce para o Giants – e beisebol – é tão fanático pelo Yankees que chegou a comprar um assento do antigo estádio do clube, que guarda em seu escritório.
Casado e pai de dois filhos, o nova-iorquino decidiu se mudar para Londres. Quer entender melhor a F-1 para, em seguida, revolucioná-lo. Até 2020, o plano é muito claro: menos previsibilidade e privilégios, mais competitividade, equilíbrio financeiro e audiência. E, principalmente, transparência, nos negócios, na estratégia e na relação com os fãs. Algo que, para Carey, está na cara: chegou a hora de dar uma nova e moderna aparência ao fio do bigode.
Quem são e o que pensam os novos chefões
CHASE CAREY
– 62 anos, novo chefão da F-1
– Executivo da área de mídia
"Temos 21 corridas. Devíamos ter 21 Super Bowls. Precisamos fazer eventos maiores do que nunca. Cada GP deve ter uma semana de extravagâncias, com entretenimento e música, capturando a cidade inteira."
SEAN BRATCHES
– 56 anos, diretor comercial
– Trabalhou como executivo da ESPN
"Teremos quatro focos. Primeiro, a marca, que será fortalecida. Segundo, os produtos digitais, para engajar mais fãs e captar parceiros. Terceiro, negociações mais transparentes. Por último, uma melhor experiência de corrida, na pista ou pela TV."
ROSS BRAWN
– 62 anos, diretor esportivo
– Oito títulos na F-1 por Benetton, Ferrari e Brawn GP
"A analogia do Leicester, campeão inglês, seria o ideal para a F-1. Permite que um bom time, em um grande ano e com um excelente piloto, possa ser campeão. Hoje, porém, isso não é possível."