Os últimos dias de Felipe Massa como piloto de F-1 têm um capítulo especial neste final de semana. O veterano disputa seu derradeiro GP do Brasil, na penúltima prova da carreira, em um circuito que marcou sua vida. Com duas vitórias e cinco pódios, Massa é o brasileiro com melhores resultados no país na história da competição. Seu triunfo em 2006 foi o primeiro de um piloto da casa desde Ayrton Senna, em 1993. E, em 2008, Felipe protagonizou a dramática briga pelo título mundial com Lewis Hamilton, perdendo o campeonato na última curva após vencer a corrida. Em meio a diversos eventos e entrevistas, Massa atendeu Zero Hora e falou da carreira e do futuro. Comentou sobre a polêmica do GP de Cingapura de 2008 – quando Nelsinho Piquet bateu de propósito para ajudar o companheiro Fernando Alonso, da Renault.
Confira a entrevista.
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Como têm sido estes dias antes do seu último GP do Brasil e do seu adeus às pistas?
A expectativa está sendo incrível. Correr pela última vez aqui, no quintal de casa, está sendo especial para mim. E não pensando apenas na corrida, mas no carinho dos torcedores, nas entrevistas, no contato com os jornalistas e com pessoas que encontro na rua. Vai ser difícil esquecer. Estou feliz com a minha decisão e pronto para um fim de semana especial. Espero um excelente resultado, que ajude a Williams na briga pela quarta colocação (no Mundial de Construtores).
Além de ser sua pista de "casa", você tem uma relação especial com Interlagos.
Eu me dou bem em Interlagos, sempre fui muito bem aqui. Sou o brasileiro com mais sucesso no circuito, com duas vitórias – quase três (Massa cedeu a ponta a Kimi Raikkonen no GP do Brasil de 2007, o que deu o título mundial ao finlandês) – e cinco pódios. Sem dúvidas, é uma pista boa para o meu estilo de pilotagem. Conheço tudo de Interlagos. Mas o momento da equipe não é fácil. Hoje estamos em quinto lugar em termos de performance. Queremos voltar à quarta colocação, é o que a equipe toda vai tentar até o final. Um pódio é difícil, mas vou tentar.
A Williams caiu nesta temporada, principalmente em relação aos dois anos anteriores, quando você conseguiu pódios e até uma pole position (no GP da Áustria de 2014). O que explica essa queda?
Foi, sem dúvida, um problema relativo ao desenvolvimento do carro. Em 2014, começamos bem, como a terceira melhor equipe, desenvolvemos bem e terminamos como a segunda melhor, apesar de termos ficado em terceiro no campeonato. Em 2015, começamos bem, e acabamos mais abaixo, apesar dos pontos que nos deixaram em terceiro lugar. Agora, a gente começou como a quarta equipe e estamos encerrando como a quinta. Sem dúvida isso deve-se ao desenvolvimento, que não foi do jeito certo como outras equipes fizeram – principalmente no trabalho aerodinâmico.
Falando sobre sua carreira: você começou em 2002, no meio da Era Schumacher, com os motores V10. Passou depois pelos V8, viu a aposentadoria de Schumacher, a volta dos pneus slick e, agora, a era dos motores turbo. O que mais marcou as mudanças da Fórmula-1 nestas 14 temporadas no circuito?
Eu vi muitas mudanças. Algumas positivas, outras… menos positivas. Houve mudanças nos carros, nos pneus – em 2005, não podia nem trocar pneu durante a corrida. Tinha abastecimento, de tudo. Eu vi muita coisa neste período. A maior mudança que eu vi foi com relação aos motores turbo. O motor aspirado V10 era incrível, o mais incrível que eu pilotei. O V8 era bacana pelo barulho. E agora o turbo, que foi negativo por um lado, pelo barulho. Foi algo muito relativo às empresas automobilísticas, já que entre os carros de rua atualmente o turbo é bastante utilizado. Isso, para mim, foi uma mudança ruim. E isso que os motores de hoje têm até mais potência do que os V8, mas perderam aquele charme. Acho que essa foi uma mudança não muito positiva.
Nos bastidores, no trabalho do Bernie Ecclestone, viu mudança?
Aí, não. A F-1 continua igual. São muitos problemas políticos, relativos a dinheiro. A mentalidade é parecida. O que mais mudou é a distância entre as equipes. As equipes pequenas, hoje, têm de ter um piloto pagante, principalmente por conta da crise.
O que você acha que poderia, ou até mesmo que deveria, ter sido feito para melhorar a categoria neste período?
Um caminho era tentar fazer os carros mais competitivos. Ninguém mais quer ver uma equipe só na frente, só com dois pilotos brigando. Sempre houve períodos de domínio, como com a McLaren na época do Senna e do Prost, depois a Ferrari com o Schumacher, a Red Bull há alguns anos e, agora, a Mercedes. A Fórmula-1 tem de tentar algo.
E você acha que existe algo que possa ser feito pelos dirigentes?
Sim. Principalmente no dinheiro. Viável, é. A divisão não é correta: uma equipe que já tem mais grana recebe mais ainda, principalmente as equipes de empresas (automobilísticas). É parecido com o futebol: na Espanha, Real Madrid e Barcelona recebem 50% do valor total do campeonato e estão sempre no topo. Em compensação, na Inglaterra o campeonato é bem mais competitivo porque tem mais dinheiro distribuído. A maioria das mudanças é sempre no fator financeiro.
Você correu contra, e também ao lado, como companheiro, de alguns dos grandes pilotos da história, como Michael Schumacher, Fernando Alonso, Lewis Hamilton e também Kimi Raikkonen, Jenson Button, Rubens Barrichello. Quem você destaca de uma forma geral?
O que mais me marcou foi o Schumacher, porque eu sempre fui fã dele. Ele foi meu professor. A chance que eu tive de correr com ele, o carinho, isso foi muito legal. Mas teve muitos, como Alonso, o Hamilton, o Vettel, pilotos que marcaram bastante. Agora, o (Daniel) Ricciardo tem um talento incrível, e o (Max) Verstappen tem tudo para ser ainda melhor. Ele é muito talentoso, mas precisa se acalmar.
Você parece ser um piloto muito bem quisto entre os demais. É comum ver fotos suas e do seu filho (Felipinho Massa) com Daniel Ricciardo. Isso não parece ser muito comum no mundo da Fórmula-1, não?
Tenho uma boa relação com alguns deles, como o Ricciardo, o Button, o (Estebán) Gutiérrez, os pilotos latinos. Mas é um mundo fechado, não é fácil de conviver, é difícil de criar amizade. Tive problemas com o Alonso, mas não tenho hoje com ninguém.
Você foi o último piloto brasileiro a brigar por um título, e chegou a ser campeão por alguns segundos no GP do Brasil de 2008. Aquele campeonato teve corridas marcantes, como na Hungria (quando o motor de Massa explodiu com ele na liderança), em Cingapura (quando Nelsinho Piquet provocou uma batida intencional para ajudar a Renault, e depois a Ferrari deixou a mangueira de reabastecimento presa no carro de Massa, arruinando sua corrida), além do Brasil (quando Hamilton só confirmou o título ao ultrapassar Timo Glock na penúltima curva). Qual destes fatos doeu mais?
O pior de todos foi Cingapura, de longe. Não no momento, claro, porque você nunca sabe o que houve direito. Mas depois que foi confirmado tudo, foi uma tristeza, algo que não tem o que fazer. Foi comprado, um negócio que não pertence ao esporte. Foi o pior, com certeza.
Você chegou a falar com o Nelsinho Piquet a respeito do caso?
Falei, claro. Cheguei a perguntar antes de ele anunciar, e ele disse que "não", que não tinha nada disso. Depois revelou, né? Agora não tenho mais interesse em saber.
Com o Alonso, você falou sobre isso?
O Alonso fala que não sabia, que foi a equipe, e não envolvia ele. Mas não é verdade, né? Claro que ele sabia.
Ainda mais com a relação próxima dele com o Flavio Briatore (chefe de equipe da Renault, que arquitetou o plano).
Eles tinham uma relação de pai para filho.
E o futuro, Felipe? Você já admitiu que quer testar um carro da Fórmula-E. Pensa em disputar a categoria? Ou pensa no WEC, para correr em Le Mans?
Vamos ver, tem muita conversa com essas categorias e também com o DTM (na Alemanha). Mas preciso de um tempo para decidir, as coisas estão acontecendo. Tudo vai ser decidido não agora, mas na hora certa.
*ZHESPORTES