Os dados do Censo da Educação Superior 2022, divulgado pelo Ministério da Educação (MEC) na semana passada, mostram que Pedagogia é um dos cursos mais procurados pelos gaúchos quando se trata de Educação a Distância (EAD). Dos 97,8 mil alunos que ingressaram em graduações remotas em 2022 no RS, 21,5% iniciaram cursos de formação de professores.
Em um ano, o número de ingressantes em cursos de graduação em Pedagogia a distância no Rio Grande do Sul aumentou 40%. Em 2021, foram 15 mil novos alunos, sendo que o número subiu para 21 mil em 2022. Quanto aos últimos 10 anos, o percentual de aumento na busca por cursos de formação de professores EAD é de 232%. Em 2012, eram apenas 6,3 mil ingressantes.
O levantamento do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) mostra que o futuro dos professores no Estado é incerto, bem como a qualidade do ensino, conforme Julian Silveira Diogo de Ávila Fontoura, pesquisador da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
— Os dados dos próximos anos vão evidenciar a fragilidade dos cursos de formação de professores a distância. O aluno precisa vivenciar o dia a dia em sala de aula, essa convivência é necessária. O ensino remoto nos faz perder a dimensão social da educação, muito importante em cursos de humanidades e na Pedagogia, principalmente — destaca o professor do Departamento de Estudos Especializados da Faculdade de Educação.
Mudanças podem afetar pesquisa e extensão
As regiões Sul e Sudeste concentram os maiores programas de pós-graduação em educação do Brasil, segundo Julian. Quando se trata de professores qualificados, o RS é referência. De acordo com dados do censo do Inep, 63% dos docentes em exercício no Ensino Superior no Estado têm título de doutorado.
No entanto, a demissão em massa de docentes universitários preocupa especialistas, sendo que muitos atribuem o problema à ascensão do ensino remoto, que explodiu na pandemia. O número de professores universitários caiu 7,14% no Brasil entre março de 2020 e dezembro de 2021, com a perda de quase 30 mil profissionais, conforme o Ministério do Trabalho.
Precisamos rever os mecanismos de monitoramento dessas instituições.
RODRIGO BOUYER
Avaliador do Inep
— Isso acontece porque faltam estudantes nas aulas presenciais. O equilíbrio precisa ser resgatado urgentemente. As instituições de ensino vão colapsar se esse modelo continuar, e serão décadas e décadas de prejuízo — analisa Rodrigo Bouyer, avaliador do Inep.
Isso significa que o problema vai muito além da educação, afetando diretamente a vida das pessoas. Com a falência de instituições de ensino e pesquisa importantes para a região, pode haver falta de mão de obra qualificada para ocupar os postos de trabalho.
— O desenvolvimento econômico no interior do Rio Grande do Sul se deve, em grande parte, à existência das universidades, que levaram à criação de empregos, incentivo à pesquisa e ao empreendedorismo na região. Quando se coloca esse sistema em xeque, colocamos toda a economia desses municípios sob ameaça — argumenta o pesquisador.
Função social do ensino remoto
Para os especialistas, embora a aplicação tenha problemas, o EAD tem trazido benefícios. Além de contornar desafios como deslocamento e reduzir despesas, o ensino remoto tem sido usado como uma ferramenta facilitadora ao Ensino Superior.
— A educação superior de massa é um fenômeno recente. O EAD surge como modalidade opcional para atender demandas. A distância é um impeditivo para quem mora no Interior, em São Borja, por exemplo, e não tem condições de se deslocar para Porto Alegre. Nesse sentido, é uma alternativa importante — explica Fontoura.
No entendimento do professor, não precisamos eliminar o formato remoto, que tem sido positivo e cumpre essa função social. Contudo, o modelo deve ser repensado:
— A estrutura do EAD está consolidada, não vai sumir magicamente. Por isso, precisamos rever os mecanismos de monitoramento dessas instituições.
Fiscalização e regulação
A partir de 2017, o governo federal afrouxou as regras para a abertura de polos de educação a distância credenciados pelo Ministério da Educação (MEC). Antes, cada um dos polos tinha que ser autorizado e fiscalizado pelo governo. Depois da mudança, a regulação ficou centralizada na instituição sede, sendo que cada instituição de ensino pode abrir até 250 polos de educação a distância por ano.
O desenvolvimento econômico no interior do Rio Grande do Sul se deve, em grande parte, à existência das universidades, que levaram à criação de empregos, incentivo à pesquisa e ao empreendedorismo na região.
RODRIGO BOUYER
Avaliador do Inep
Os pesquisadores acreditam que deveria haver um controle maior para a abertura desses cursos, além da qualidade do conteúdo e regras específicas para cursos de formação de professores. Segundo as estatísticas do Inep, o número de cursos na modalidade remota ofertados no país aumentou 700% nos últimos 10 anos, saindo de 1.148 em 2012 para 9.186 no ano passado.
— Hoje, existem grupos educacionais com mais de 2 mil polos de educação a distância no país. Como a regulação só acontece na sede, esses outros locais ficam sem fiscalização específica. A própria possibilidade de oferta de cursos como Pedagogia, que requerem construção de habilidade prática, deveria ser limitada ou excluída — completa Bouyer.