Mensalidades com preços atrativos, avanço da tecnologia de conectividade, menos gasto com transporte, maior segurança, comodidade, flexibilidade de horários. Esses são os principais motivos apontados por entusiastas do Ensino a Distância (EaD) para o crescimento galopante da modalidade no Brasil. Especialistas, porém, afirmam que tantas facilidades não eliminam a necessidade de cautela na hora de escolher um curso, sobretudo em relação à qualidade desse método de formação profissional.
O EaD foi regulamentado há 14 anos, por decreto assinado pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, mas em 2017 o Ministério da Educação (MEC) amenizou as regras. As instituições de ensino não precisam mais de autorização prévia do governo para oferecer cursos a distância, tampouco possuir credenciamento para cursos presenciais. Antes, a abertura de cursos estava condicionada a vistoria in loco feita por técnicos, mas a mudança na legislação fez com que bastasse apenas a apresentação de alguns indicadores de qualidade.
Desde então, o salto foi exponencial. Em 2018, pela primeira vez, a oferta de vagas em EaD superou a da educação presencial no país. Conforme o Censo 2018 da Educação Superior, realizado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), foram oferecidas 7,1 milhões de vagas a distância, ante 6,3 milhões de vagas presenciais. Divulgado em setembro de 2019, o levantamento revelou crescimento de 52,44% em relação ao ano anterior (segundo o Censo, em 2017 foram oferecidas 4,7 milhões).
— É a primeira vez que você tem um maior ensino a distância do que presencial. Acho que é uma tendência nacional e mundial, só tende a se consolidar e ampliar — disse o ministro da Educação, Abraham Weintraub, ao divulgar os dados.
Todavia, esse fenômeno ainda não se reflete em adesão efetiva ao EaD. A rede de educação presencial, na qual os alunos estão em sala de aula, recebeu mais alunos novos em 2018 do que a rede a distância. Pelos dados do censo, houve 2,07 milhões de ingressos em vagas presenciais (28,9% do total disponível), e 1,3 milhão nas vagas à distância (21,5% da oferta).
A diferença entre as modalidades de ensino é ainda maior se levarmos em consideração o número total de estudantes matriculados: são 2 milhões aprendendo a distância, contingente três vezes menor do que os 6,4 milhões que estavam em classe, em contato direto com o professor e os colegas em 2018.
A tendência é esse curva se alterar nos próximos anos. Projeção da consultoria educacional Atmã Educar aponta que, ainda em 2019, a proporção de novos alunos se inverteu, com os calouros a distância dominando 52% do ingressos. No Rio Grande do Sul, isso já está acontecendo.
Em 2018, houve mais novos alunos no sistema EaD, na comparação com os presenciais: 102 mil contra 78 mil, segundo estudo que o Sindicato do Ensino Privado (Sinepe-RS) realizou a partir do Censo e que foi obtido com exclusividade por GaúchaZH.
O aumento das matrículas em EaD, no Rio Grande do Sul, em 2018, na comparação com 2017, foi de 23,25% – na modalidade presencial, houve queda de 7,31%. Ocorre que as mensalidades da rede privada são salgadas, e o EaD é uma alternativa mais barata para realizar o sonho do ingresso na universidade. Para o presidente do Sinepe-RS, Bruno Eizerik, é a situação econômica do país que explica o fenômeno EaD:
— Quem procura essa modalidade é aquele aluno trabalhador que já terminou o Ensino Médio há algum tempo e quer ingressar no Ensino Superior. Ele sabe que, com o estudo, vai poder progredir. E escolhe o curso que cabe no seu bolso.
Outro motivo citado pelo presidente do Sinepe é a redução da oferta de vagas via Fundo de Financiamento Estudantil (Fies), que foi instituído em 2001 e que possibilita o empréstimo para pagamento de mensalidade com juros zero a estudantes de baixa renda. Em 2018, foram concedidos 310 mil contratos no Fies, menos da metade dos 700 mil registrados em 2014, auge do programa.
Diante de um cenário de inadimplência recorde em 2020, o governo mudou as regras do programa para cobrar na Justiça cerca de 584 mil estudantes com prestações atrasadas há mais de um ano, cujo rombo soma R$ 12 bilhões. Estimativa feita pelo MEC aponta para queda ainda maior nos contratos nos próximos anos, chegando a 100 mil em 2020 e caindo quase à metade em 2021, com 54 mil novos beneficiados.
Quem procura essa modalidade é aquele aluno trabalhador que já terminou o Ensino Médio há algum tempo e quer ingressar no Ensino Superior. Ele sabe que, com o estudo, vai poder progredir. E escolhe o curso que cabe no seu bolso.
BRUNO EIZERIK
Presidente do Sinepe-RS
Tudo isso diminui as possibilidades de ingresso para alunos que precisam trabalhar paralelamente ao curso superior. Nesse contexto, o EaD se torna uma alternativa de obter formação superior. Um dos líderes da modalidade a distância no Brasil, o Grupo Kroton Educacional possui duas das universidades com o maior número de matrículas a distância no país: a Unopar, com sede em Londrina (PR), e a Anhanguera, de São Paulo (SP).
O diretor sênior do conglomerado educacional, Jeferson Altenhofen Ortiz, entende que o avanço se dá também por alcançar lugares carentes de instituições de Ensino Superior:
— Hoje, a quantidade de cidades assistidas por instituições de ensino presenciais não é tão significativa.
Ortiz reforça que a mudança regulatória ocorrida em 2017 favoreceu a explosão da oferta de vagas a distância, com a criação de polos de EaD sem prévio cadastro para a oferta presencial. As instituições puderam oferecer exclusivamente cursos a distância.
A gente traz um público de alunos que não teria acesso ao Ensino Superior de outra forma. Um curso a distância pode custar até 80% menos do que um presencial.
JOSÉ AROLDO ALVES JÚNIOR
Vice-presidente de Assuntos Digitais da Universidade Estácio de Sá
– Isso contribuiu para que houvesse uma capilaridade ainda maior de polos parceiros que assistem a diversas cidades do Brasil. A medida também está totalmente alinhada com a tendência de uma sociedade cada vez mais digitalizada – diz Ortiz.
A Universidade Estácio de Sá, com sede no Rio de Janeiro, também está entre as líderes no segmento. Para o vice-presidente de Assuntos Digitais da instituição, José Aroldo Alves Júnior, o acesso fácil ao conteúdo é a principal receita do sucesso do EaD.
– A gente traz um público de alunos que não teria acesso ao Ensino Superior de outra forma – defende.
Alves Júnior salienta outras facilidades do EaD. Além de oferecer formação a moradores de pequenas localidades que não têm como se deslocar para uma universidade presencial, ela contempla trabalhadores que enfrentam dificuldades financeiras e falta de tempo para se dedicarem aos estudos. Ele estima:
– Um curso a distância pode custar até 80% menos do que um presencial.