Três colegas de sala de aula em um pré-vestibular de Novo Hamburgo foram os únicos gaúchos a tirar nota mil na redação do último Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). Em comum, eles estudavam mais de 10 horas por dia, escreviam redações semanalmente e tiveram a sorte de redigir um texto com tema semelhante ao exigido na prova — "Democratização do acesso ao cinema no Brasil" —, conforme contaram a GaúchaZH na manhã deste sábado (18), um dia após o Ministério da Educação (MEC) divulgar as notas.
Estudantes do Método Medicina Pré-Vestibular, Laura Brizola, 20 anos, Guilherme Mendes, 25, e Carlos Eduardo Immig, 19, estão entre as 53 pessoas que, no Brasil inteiro, tiveram redação nota mil, segundo o MEC. A maioria são mulheres. Minas Gerais foi o Estado que teve mais redações nota mil: 13. Em segundo lugar, empatados, estão Ceará e Rio de Janeiro, com seis textos. São Paulo teve quatro.
Além de 150 minutos de aulas obrigatórias de redação por semana, com mais 50 minutos disponíveis em um plantão, os vestibulandos produziam ao menos um texto por semana, em sala de aula, para simular o ambiente do vestibular. Ao longo de 2019, foram ao menos 40 textos - tão grande era a prática que escreveram sobre tema parecido ao do Enem. A semelhança ajudou a estruturar o texto da prova.
Com foco na aprovação em Medicina, o trio tinha rotina pesada: todos os dias, era aula das 8h às 17h30min e mais estudo à noite. Nos fins de semana, revisavam matéria e resolviam simulados em casa.
Todos concordam que, para tirar uma nota tão alta na produção textual, é preciso analisar os erros apontados por professores, estudar o conhecimento que falta, organizar a rotina e guardar tempo para relaxar - Carlos malha, Laura dança zumba e caminha, e Guilherme lê literatura.
A nota máxima na redação de Guilherme foi alcançada em seu terceiro ano de cursinho. Ele foi aluno de escola pública durante quase toda a vida: só nos últimos três meses estudou em uma instituição privada, após um ano de Ensino Médio na China.
Ele destaca que a leitura de livros é essencial para quem planeja sair-se bem na redação. Ao longo do ano, leu mais de 20 livros, afora os obrigatórios no vestibular da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Dentre os autores que aprecia, cita Erico Verissimo.
— A leitura e a repetição de redações escritas ajuda bastante. E, claro, ter bons professores, que ajudam na correção dos textos — cita o estudante, que deseja ser neurologista. — A mente é a parte do corpo que mais me fascina — acrescenta.
Formada na Fundação Liberato, em Novo Hamburgo, Laura fez técnico em Química e um ano de cursinho. A seu favor, ela cita que gosta de discutir assuntos relacionados a cultura. A aprovação em Medicina, diz, é como uma "escadinha" — um passo de cada vez. Ela destaca que seu bom desempenho não deve ser glamourizado.
— Meu foco era quase completo, eu estudava 14 horas por dia. Não acho isso adequado, mas infelizmente é o necessário para entrar em Medicina. O sistema deveria zelar pela saúde mental das pessoas, é fundamental ter apoio psicológico no processo — reflete Laura, que pretende ser médica de família para atuar no Sistema Único de Saúde (SUS).
Morador de Estância Velha, Carlos Eduardo se formou em uma escola privada de Ivoti e gabaritou a redação no primeiro ano de pré-vestibular. Não deixou de sair nos fins de semana com amigos — preferia compensar nos dias seguintes. Ele não é afeito à literatura, diz que foi bem por tanto escrever. Pudera: eram ao menos dois textos por semana.
— Foram muitas redações feitas. As aulas também são muito boas e eu prestava atenção nas correções. Vi que errava vírgulas e fui estudar para não errar mais — descreve.
Para explicar a coincidência de três colegas de aula tirarem nota mil na redação, o gerente do Método Medicina Pré-Vestibular, William Lawisch, diz que os jovens se esforçaram bastante ao longo do ano e que a prática repetida da redação é fundamental:
— Como fazem muitas redações, isso ajuda a fundamentar o texto. Eles trabalharam temas muito variados ao longo do ano, então é difícil chegar na prova sem nenhuma ideia do assunto.
Inep revisará nota das provas objetivas
Cerca de 39 mil estudantes de todo o Brasil — 1% dos 3,9 milhões de candidatos — podem ter parte das notas da prova objetiva erradas, anunciou neste sábado (18) o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep). A informação foi divulgada um dia após a liberação das notas e de internautas reclamaram sobre a inconsistências nas notas. Internautas afirmaram que receberam notas muito baixas, apesar de terem acertado um grande número de questões.
Responsável pelo Enem, o órgão afirmou que irá revisar as notas de quem se sentiu prejudicado. Para isso, é preciso enviar um e-mail para enem2019@inep.gov.br com nome completo e CPF. Todas as solicitações serão analisadas individualmente.
O erro ocorreu na gráfica Valid S.A, segundo o Inep, que informou errado a cor do gabarito correspondente a cada candidato - há várias provas com diferentes cores, todas com as mesmas questões, mas ordem de resolução diferente. Em novembro, após a prova, o ministro da Educação, Abraham Weintraub, havia declarado que o Enem "foi um sucesso" e "sem doutrinação". No entanto, horas após o início da avaliação, as questões vazaram na internet durante a aplicação.
A abertura do Sistema de Seleção Unificada (Sisu) ocorrerá na terça-feira (28). Até lá, diz o Inep, os erros serão corrigidos.