Na véspera do Natal (24), Jair Bolsonaro editou uma medida provisória (MP) que muda as regras para a escolha de reitores nas instituições federais de ensino. Para críticos, a matéria impõe limites à autonomia das administrações e aumenta a margem para que universidades e institutos federais tenham um dirigente ao gosto do presidente.
Antes da MP, as entidades tinham independência para definir seu próprio formato para selecionar reitores e diretores. Agora, todas ficam submetidas às mesmas normas, que eliminam práticas consideradas "democráticas" pelas comunidades acadêmicas.
Bolsonaro, assim como o ministro da Educação, Abraham Weintraub, têm investido contra as universidades, alegando serem controladas pela esquerda. Para defender a medida, a Presidência da República argumentou que "a falta de obrigatoriedade de eleições formais parece estar trazendo problemas devido à realização de consultas informais que não seguem parâmetros claros e que, em alguns casos, parecem dirigidas a manter no poder grupo determinado".
Publicada em edição extra do Diário Oficial, a MP impede que cada eleitor vote em mais de um nome na escolha para reitor. Algumas instituições do país vinham permitindo o voto em três candidatos, a fim de elaborar listas tríplices com nomes que tenham apoio de ampla maioria.
Entre as mudanças, também está a impossibilidade da chamada consulta paritária, na qual os votos da comunidade acadêmica tem o mesmo peso. O novo texto estabelece peso de voto de 70% para professores, 15% para técnico-administrativos e 15% para estudantes.
– O processo de consulta à comunidade é mais democrático, colocando uma participação mais intensa da comunidade na definição dos rumos da instituição. Essa mudança irá gerar desinteresse da parcela que tem um peso muito pequeno de voto. É uma perda muito significa de autonomia da universidade em decidir seu modelo de consulta – critica o reitor da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Paulo Burmann.
Embora incida sobre todas as instituições federais de ensino do país, a medida causa impacto maior nos institutos federais, antigas escolas técnicas que foram ampliadas nos governos do PT. Pela lei anterior, os institutos enviavam somente o nome do vencedor da eleição para o governo federal, responsável pela nomeação do reitor. A MP impõe aos institutos o mesmo sistema de lista tríplice adotado pelas universidades, ampliando a brecha de interferência do governo na escolha.
– Para os institutos federais, é uma grande ruptura. Nossa lei era extremamente moderna e progressista, estabelecendo paridade e eleição direta. A MP nos ataca naquilo que era mais importante, nossa democracia interna – diz Julio Xandro Heck, reitor do Instituto Federal do Rio Grande do Sul (IFRS).
A medida também determina que o reitor poderá escolher seu vice e dirigentes de unidades, como de campus e faculdades. Hoje, as entidades definem suas próprias forma de escolha, sendo que a maioria costuma fazer votações.
– É uma forma de acabar com a autonomia universitária, protegida pela Constituição. Um reitor que não é representativo da comunidade terá superpoderes de controle sobre ela. E, pelo instrumento de MP, até ser submetido ao trâmite normal do Congresso, Bolsonaro terá assegurada a escolha de vários reitores com base nessa intervenção – indica o filósofo Renato Janine Ribeiro, ministro da Educação no governo Dilma Rousseff (PT).
De validade imediata, a medida precisa ser aprovada pelo Congresso em até 120 dias. Caso contrário, tem seus efeitos sustados.