O título de melhor escola pública da etapa estadual da Olimpíada Brasileira de Robótica 2019, ocorrida neste mês, em São Leopoldo, foi conquistado pelo Colégio Estadual Júlio de Castilhos, de Porto Alegre. No total, 67 equipes de robótica de instituições de ensino públicas e privadas gaúchas participaram da competição. Apenas as duas melhores classificadas no ranking geral — no qual a Júlio de Castilhos ficou em sexto lugar — disputarão a etapa nacional. Entretanto, o feito do Julinho evidencia um trabalho iniciado em 2014, a partir da iniciativa de quatro estudantes, entre eles, Leonardo Nunes, 20 anos, hoje é o instrutor da equipe vencedora.
A Julianos Robots chegou a 20ª premiação contando com a ajuda de Leonardo, que conheceu a robótica ainda no Ensino Fundamental, há nove anos, quando estudava na Escola Municipal Heitor Villa Lobos, da Vila Mapa, no Bairro Lomba do Pinheiro. Desde então, o menino que adorava brincar com legos passou a utilizar as peças de plástico numa atividade que exige concentração e conhecimentos de lógica, montagem e programação.
Com a equipe de robótica da instituição da Mapa, Leonardo conquistou inúmeros títulos e ainda teve a oportunidade de conhecer diferentes Estados brasileiros, nas competições nacionais, e três países — México, Holanda e Canadá —, para participar de campeonatos mundiais.
Quando iniciou o Ensino Médio no Colégio Estadual Júlio de Castilhos, em 2014, ele recorda ter sentido falta da atividade. Ao conhecer outros três alunos vindos de outras escolas municipais que mantinham grupos de robótica, Leonardo viu a possibilidade de iniciar a primeira equipe da Júlio de Castilhos. Ao lado dos colegas, o jovem reuniu-se com o então diretor, Antônio Esperança, e explicou o desejo de incluir a metodologia educacional na escola. Apesar do apoio da direção, não havia verba do Estado para a compra do material que possibilitaria a produção dos robôs.
— Estávamos quase desistindo da ideia, quando descobrimos uma fundação ligada ao Julinho, que apoiava projetos. Levamos a nossa intenção aos membros e eles concordaram em nos ajudar. Foi o começo de um sonho — garante o jovem.
Com a doação de R$ 750 da Fundação de Apoio ao Colégio Estadual Júlio de Castilhos, a equipe iniciou os trabalhos no horário inverso ao das aulas. Sem uma sala disponível para treinarem, os quatro usavam o espaço de uma instituição municipal no bairro Lomba do Pinheiro. Mesmo sem ter um professor especializado na área e enfrentando dificuldades de logística e a desconfiança dos demais colegas da escola, a equipe não desistiu dos trabalhos. Para a surpresa de todos, naquele mesmo ano, conquistou o 1º lugar na etapa regional da Olimpíada Brasileira de Robótica, que garantiu a Leonardo e aos três companheiros a chance de disputarem a etapa nacional, em São Paulo, de onde voltaram com a medalha de prata.
— Chegar ao nacional enfrentando robôs que custavam R$ 10 mil foi uma vitória importante para continuarmos com o projeto no Julinho — conta Leonardo.
No ano seguinte, o grupo ganhou uma sala dentro da escola e uma verba em dinheiro para comprar novos materiais. As vitórias estadual e nacional atraíram a atenção de outras turmas, fazendo com que a equipe de robótica se tornasse instrutora dos demais estudantes da Júlio de Castilhos. Um problema de saúde, porém, quase fez Leonardo desistir dos estudos. Vítima de uma mielite transversa, uma inflamação na coluna vertebral, ele perdeu os movimentos da cintura para baixo. Apesar de não concluir o ano letivo, o jovem não desistiu da robótica. Mesmo internado no hospital, seguiu ajudando a regular os robôs e a orientar os colegas.
Ao retornar à escola, em 2016, ainda com dificuldades motoras, Leonardo ajudou a formar quatro equipes — três delas foram premiadas em competições — e ensinou dezenas de alunos da instituição, interessados em montagem e programação. Em 2017, no último ano como estudante do Julinho e já sem a companhia dos demais fundadores do primeiro time, o jovem viu um desejo antigo se tornar realidade: a escola ofertou as aulas de robótica aos interessados pelo tema. Pelo menos três turmas, com mais de 30 alunos, aprenderam a fabricar e programar robôs em quatro aulas ministradas por Leonardo.
— Aquela experiência me mostrou algo que, até então, desconhecia: eu gostava de dar aulas e queria continuar fazendo isso — confidencia.
Para a presidente da Fundação de Apoio ao Colégio Estadual Júlio de Castilhos, a professora aposentada Márcia Lopes da Costa, Leonardo é um exemplo a ser seguido entre os alunos da escola. Ela recorda do menino entusiasmado que procurou os representantes do órgão pedindo auxílio para tirar o projeto do papel.
— Nosso objetivo sempre foi incentivar os alunos a abrirem os próprios caminhos. O Leonardo teve um papel fundamental na manutenção da robótica na escola. A gente percebe que ela auxilia na concentração, na busca constante por conhecimento e na troca de experiências — afirma Márcia.
Contratado pela própria Fundação para continuar como instrutor dos atuais estudantes, Leonardo tem 18 horas semanais no Julinho. De segunda a sexta, ele monitora a Julianos Robots e ensina outros alunos da escola. Há dois anos, ele também trabalha como instrutor de robótica num colégio particular. Por seguir morando na Vila Mapa, o jovem ainda é voluntário na instituição onde teve o primeiro contato com os robôs. Em meio às competições, planeja ingressar na universidade em 2020, no curso de Análise de Desenvolvimento de Sistemas.
— A robótica me ajudou a expandir o conhecimento, a ter acesso à tecnologia, a aprender a trabalhar em grupo, a conhecer lugares jamais imaginados e me mostrou o quanto amo ser professor — resume o jovem, antes de voltar para mais um treinamento para a próxima competição, em 3 e 4 de outubro, no Festival Marista de Robótica.