Depois dos cortes de 30% no orçamento das universidades e institutos federais, que motivaram protestos pelo país, o ministro da Educação, Abraham Weintraub, anunciou nesta quarta-feira (17) a criação do programa Future-se, com o objetivo de garantir recursos para as instituições a partir da venda de patrimônio público, parcerias privadas e remuneração dos docentes por desempenho. A apresentação do programa foi feita com pompa no auditório do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), em Brasília. Um vídeo com contagem regressiva e efeitos de luz antecedeu a fala de Weintraub, que citou o político britânico Winston Churchill para falar das propostas do governo para superar a crise financeira.
— Churchill diz que, se você está caminhando no inferno, não pare. Nós vamos superar esse ano difícil — disse para uma plateia lotada de reitores e dirigentes de universidades antes de ser interrompido pelo protesto do presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE), Iago Montalvão, que criticou os cortes nas universidades.
A apresentação foi retomada em seguida, após o estudante ter sido convidado a sentar ao lado do ministro para acompanhar o detalhamento do programa, feito pelo secretário de Educação Superior do MEC, Arnaldo Barbosa Lima. Segundo ele, uma consulta pública sobre o Future-se será aberta nesta quarta-feira e vai até 7 de agosto para, depois, ser compilada e encaminhada ao Congresso Nacional, já que prevê mudanças na legislação. A previsão do governo é arrecadar R$ 100 bilhões para o programa, mas não foi definido um prazo para isso.
A adesão das instituições é facultativa, mas as que não participarem ficarão limitadas ao teto dos gastos — com contingenciamento de recursos.
Entre as mudanças, está a realização de contratos com organizações sociais, que ficarão responsáveis por gerir as despesas ordinárias das universidades — aquelas do dia a dia, como luz, água, serviços de limpeza e de segurança.
— Os reitores ficam liberados para o trabalho com a pesquisa e o ensino — disse Arnaldo Barbosa de Lima.
Fundo patrimonial
Além disso, a proposta prevê a criação de fundos financeiros. Um deles envolve o repasse de R$ 50 bilhões em imóveis da União pelo Ministério da Economia ao MEC para a criação de um fundo patrimonial com dinheiro que será utilizado pelas universidades. Funciona assim: o governo repassa um terreno para a iniciativa privada construir um shopping, por exemplo, e os lucros desse negócio vão para o fundo. Um levantamento dos imóveis ociosos que serão transferidos para o programa está em andamento, segundo o ministro.
Outra possibilidade é a cedência para a iniciativa privada de espaços dentro das universidades, a criação de fundos com doações feitas por ex-alunos e a captação de recursos via Lei Ruanet para atividades ligadas à cultura.
"Teremos professores ricos no Brasil"
O programa também prevê um salário extra aos docentes das universidades. Serão criados indicadores de produção científica, como publicação de pesquisas em revistas internacionais de alto impacto, para remunerar os professores. Além disso, eles poderão receber dinheiro por patentes e pela participação em startups e em parcerias com a iniciativa privada.
— Teremos professores ricos no Brasil. Isso é muito positivo — disse o ministro durante a apresentação.
A jornalistas, ele disse que a ideia é separar o joio do trigo, recompensando os que produzem mais e com mais impacto. Os demais, de acordo com Weintraub, não serão punidos.
— Eles seguem recebendo o salário normal. Algo em torno de R$ 20 mil.
A medida vale somente para os docentes das instituições que aderirem ao Future-se. Não existe limitação de repasse aos professores, já que, segundo o MEC, o benefício extra não está enquadrado no teto do funcionalismo federal. A previsão inicial do ministério é de adesão de pelo menos 20, de mais de 60 universidades federais.
Sem cobrança de mensalidades
Durante entrevista coletiva a jornalistas após o evento, o ministro da Educação afirmou que o programa não prevê o pagamento de mensalidades pelos estudantes. Weintraub criticou a divulgação de fake news sobre o assunto e disse que somente nos cursos de pós-graduação lato sensu — especializações e MBAs voltados ao mercado de trabalho — já existe possibilidade de cobrança de mensalidades.
Além da graduação, mestrados e doutorados seguem gratuitos.
Cortes continuam
Questionado por GaúchaZH se haveria possibilidade de reverter o corte de 30% no orçamento das universidades este ano, já que as novas fontes de financiamento só devem gerar retorno no longo prazo, o ministro disse que está trabalhando junto ao Ministério da Economia, mas não garantiu novos repasses este ano.
— Estamos buscando soluções no curto prazo. Mas isso (falta de recursos) foi herdado de gestões anteriores.
As propostas do MEC
- Criação de um ranking de instituições federais de Ensino Superior, com premiação para as que forem mais eficientes nos gastos. Os critérios não foram detalhados.
- Permitir que departamentos das universidades façam parcerias com a iniciativa privada para oferta de cursos, por exemplo, e recebam recursos para isso.
- Autorização para que as instituições possam colocar o nome de patrocinadores em salas, prédios e outros espaços, o que permitiria a manutenção e a modernização dos equipamentos com ajuda do setor privado. É um modelo de financiamento comum em universidades dos Estados Unidos.
- Arrecadar recursos por meio de contratos de cessão de uso de prédios e áreas e parcerias público-privadas.
- Criação de um fundo patrimonial das universidades, a partir da cedência de imóveis ociosos da União. A estimativa é arrecadar R$ 50 bilhões com o fundo.
- Permissão para que as instituições captem recursos via Lei Rouanet para os projetos culturais, como museus, feiras, apresentações artísticas.
- Adoção de consórcios de universidades para diminuir custos na aquisição de equipamentos.
- Contratação de organizações sociais que serão responsáveis pela gestão do dia a dia das instituições, como serviços de limpeza, segurança, iluminação.
- Incentivar a criação e instalação de startups (empresas com base tecnológica que podem crescer em escala), com aplicação de dinheiro de fundo destinado a isso.
- Aproximar as instituições das empresas, facilitando acesso a recursos privados.
- Premiação de projetos inovadores e remuneração extra a docentes que tiverem desempenho reconhecido por meio de publicações de renome e que trabalharem com startups e parcerias privadas.
- Todas as ações serão financiadas por um grande fundo de investimento, administrado por uma instituição financeira. A estimativa é arrecadar mais de R$ 100 bilhões, sendo que metade é proveniente do fundo patrimonial. O MEC não detalhou como será a implementação, que tem motivado dúvidas dos reitores.