Um concurso de vídeos que mobilizou 445 instituições públicas de todo o Rio Grande do Sul mostrou que centenas de jovens gaúchos estão engajados em promover a paz nas escolas. A iniciativa integra uma das ações do principal projeto de combate à violência escolar em instituições de ensino do governo do Estado, a Comissão Interna de Prevenção a Acidentes e Violência Escolar (Cipave). Resultado: 1,3 milhão de votos e um Theatro São Pedro lotado, na tarde desta segunda-feira (13), em Porto Alegre. A cerimônia premiou as melhores filmagens e teve relatos de diretoras apontando que, após aderirem ao programa, os colégios públicos viram os índices de agressão diminuírem e as notas dos estudantes, melhorarem.
É um dos testemunhos da diretora Mara Núbia Bilhavi Braum, da Escola Estadual de Ensino Médio Fernando Ferrari, de Campo Bom e uma das 10 vencedoras do prêmio.
— Nossa escola tem vários projetos, e o Cipave é um deles, que acontece no contraturno e engaja alunos, pais e comunidade. Ao participarem, os estudantes se sentem pertencentes à instituição. Por ficarem no contraturno para o projeto, ficam menos vulneráveis a situações de risco. E a relação com o professor se fortalece, o que se reflete nas notas — avalia.
Os últimos dados da Secretaria Estadual de Educação, de junho deste ano, confirmam essa percepção. Conforme o levantamento, após a implementação da Cipave como política estadual, houve queda de 7 mil casos de indisciplina entre 2015 e o primeiro semestre deste ano em escolas estaduais, uma redução de 23,3%. Já os casos de bullying caíram em 15%. Fazem parte do programa 2,4 mil colégios estaduais, de um total de 2.545 instituições do Estado.
— Os pais começaram a voltar às escolas, a tirar pichações ou realizar limpezas, por exemplo. Isso fez a comunidade escolar, que não é só feita por estudantes e professores, se unir. Os alunos se sentem mais pertencentes à instituição, o que melhora o convívio — diz Luciane Manfro, coordenadora estadual da Cipave.
A campanha "Tamo junto com a Cipave", lançada em 26 de junho, propunha que as escolas públicas recriassem livremente um vídeo de campanha da comissão. Para encenar a coreografia, muitas chamaram, além dos próprios alunos, pais, professores, funcionários e membros da comunidade, como policiais, bombeiros e religiosos (veja vídeo abaixo). Uma instituição rural, por exemplo, escreveu o nome do projeto com hortaliças. Outra, situada em comunidade indígena, usou cocares e outros objetos típicos da cultura.
Antes de subir ao palco e pegar o troféu de terceiro lugar no concurso, Gertrud Bauermann Padilha, diretora da Escola Estadual de Ensino Fundamental Dr. Alfredo D'Amore, instituição da periferia de Carazinho, no Norte, contou que a coreografia para fazer o vídeo, que envolveu até drone, foi difícil, mas ajudou a unir escola e comunidade. Para ela, a adesão do colégio estadual à Cipave foi um marco que mobilizou "quase 100% dos pais" no ambiente escolar. E isso se reflete na paz entre os estudantes:
— Houve uma mudança muito grande. Temos hoje pouquíssimos conflitos, e a cultura da paz prevalece. Mudamos toda uma comunidade, que agora respeita a escola e a toma como referência — diz.
À frente do Instituto Estadual de Educação Estrela da Manhã, um internato de Estrela, no Vale do Taquari, a diretora Angela Bitencourt Zimmerman relata que o vídeo produzido pelo colégio estadual ajudou os jovens a se darem conta do próprio potencial, ao planejarem e executarem um projeto que, no fim, deu certo e arrematou o primeiro lugar. Para o vídeo, 250 pessoas participaram, incluindo pais, policiais e religiosos. Na escola, há 180 estudantes.
— Isso desperta o aluno para o potencial que ele tem. Eles se mobilizaram muito e se organizaram. Muita gente de fora participou. Falar de cultura de paz é isso: sair dos muros da escola, que precisa estar voltada para a sociedade — afirma.
A diretora Loiva Fauri, da Escola de Ensino Fundamental São João Bosco, de Lajeado, também no Vale do Taquari, aponta que a visibilidade foi a grande conquista do concurso. A instituição ficou em segundo lugar – sessenta alunos participaram, ao lado de 40 pessoas da comunidade.
— A Cipave melhorou a autoestima dos alunos e o relacionamento da comunidade com a escola. Estar aqui no Theatro São Pedro é um sonho. Imagine, então, para uma escola da periferia de Lajeado - afirmou.
O que é a Cipave?
A Cipave é, hoje, o principal projeto do governo estadual de combate à violência escolar. Cada instituição cria uma comissão envolvendo estudantes, professores, diretores, funcionários, pais e membros da comunidade para promover a paz nas instituições de ensino. Cada escola tem liberdade para decidir quais ações fará, mas a Secretaria Estadual da Educação ajuda a pensar nos projetos e a implementar a comissão. Entre as ações mais comuns estão palestras, debates e projetos que integram a comunidade escolar com órgãos públicos, empresas e representantes do terceiro setor. Em geral, as parcerias são feitas sem custo para o colégio.
A Cipave reúne sobretudo escolas estaduais, mas há também instituições municipais e particulares interessadas. A maior adesão é no Interior – em Porto Alegre, colégios públicos têm demonstrado mais resistência em aderir à iniciativa.