No mês que também é colorido pelo azul escuro da luta contra o bullying, Santa Cruz do Sul abre uma campanha local de combate a essa prática no ambiente escolar e revela números alarmantes de uma pesquisa realizada com 840 estudantes do Ensino Fundamental da rede municipal. Mais de 60% dos alunos entrevistados declaram ter sofrido algum tipo de bullying na escola, sendo que 44% garantiram que esses fatos ocorreram dentro da sala de aula. A maioria também confirmou que o assunto é tratado na escola.
Os dados foram divulgados nesta terça-feira, com o lançamento da campanha Bullying Não Tem Graça, que reúne entidades como a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/RS), a Universidade de Santa Cruz do Sul (Unisc), conselho tutelar, secretarias e sindicatos ligados à educação. A pesquisa fez um levantamento online sobre o tema, mas motivará outro estudo – dessa vez com embasamento científico – que será realizado pela Unisc para quantificar e qualificar esses casos.
– Os números são bastante preocupantes, mas mostram que temos de falar sobre o assunto e que é preciso atravessar os muros escolares e levar essa conversa às famílias. Bullying é um problema social – diz a secretária de Educação de Santa Cruz do Sul, Jaqueline Marques.
O município do Vale do Rio Pardo vem implantando nas escolas municipais projetos para engajar a comunidade no combate a esse tipo de agressão. As ações de orientação pedagógica nas instituições de Ensino Fundamental, desde que foi instituída a Leia Antibullying, em 2015, são focadas na conscientização de crianças, jovens e familiares para que o número de vítimas seja reduzido.
Especialista em bullying e idealizadora do movimento Brasil Sem Bullying, lançado na segunda-feira, a pedagoga Cleo Fante explica que pesquisas como a realizada em Santa Cruz do Sul são válidas à medida que demonstram a realidade a ser enfrentada. Conhecendo o que se passa numa determinada comunidade, é possível transformá-la com ações preventivas e interventivas.
Ela ressalta que, a formação adequada dos professores e agentes de educação para abordar o tema é fator determinante, porque corre-se o risco de uma atuação ineficaz ou romântica demais. Sem conhecimento específico sobre o assunto, qualquer agressão pode ser, equivocadamente, tratada como bullying, que é classificado de acordo com as motivações e a frequência dos atos violentos, por exemplo.
– As ações preventivas e interventivas devem envolver toda a comunidade escolar, do porteiro e pessoal do transporte escolar até o gestor e os pais. É preciso que todos se esforcem para combater o problema, que não é específico da escola, já que crianças e adolescentes convivem em outros espaços também. O trabalho interssetorial e conjunto é outro aspecto relevante para prevenir e atuar com eficiência contra os casos já instalados – avalia.
Lisandra Faccin, orientadora educacional da Secretaria Municipal de Educação, acredita que a cidade tem feito esforços para enfrentar o problema. Todas as instituições de Ensino Funtamental da rede contam com subcomitês de combate ao bullying em que toda a comunidade escolar participa. Nesta terça-feira, também foi reativado o Comitê Municipal Antibullying, que oferecerá orientação a pais, professores e alunos, além de promover um diagnóstico da situação e medidas de controle. Ela ressalta que, como a pesquisa divulgada não tem uma metodologia científica, os dados podem trazer discrepâncias.
– É preciso aferis esse dados, até porque pode haver uma tendência a vulgarizar o ato. Nem toda a agressão é bullying. Neste tempos de intolerância, enfrentar o problema é uma atitude corajosa. Não podemos deixar de discutir esse problema – diz Lisandra.
O QUE A PESQUISA APONTOU
63,2% – Responderam que já sofreram algum tipo de bullying na escola.
58,5% – Disseram que nunca praticaram bullying contra um colega.
89,9% – Afirmaram que já haviam presenciado um colega praticando bullying contra o outro
94,5% – Confirmaram que bullying é assunto tratado na escola.
Qual tipo de bullying o aluno disse ter sofrido
45,49% – Verbal
17% – Físico
15,96% – Psicológico
8,32% – Moral
4,67% – Social
3,76% – Material
3,20% – Virtual
1,60% – Sexual
Onde o bullying ocorreu
44,43% – Na sala de aula
27,55% – No pátio da escola
17% – Em outro local
8,27% – No trajeto da escola
2,75% – Nos banheiros da escola
O que o aluno disse que fez após sofrer bullying
42,52% – Reagi para me defender
18,75% – Fiquei quieto e não contei para ninguém
16,30% – Falei com meus pais
12,38% – Falei com um colega/amigo
10,05% – Pedi ajuda para o professor e/ou equipe diretiva da escola
O que o bullying ocasionou nos que se disseram vítimas
34,25% – Irritabilidade
18,15% – Baixa autoestima e pensamentos negativos/autodestrutivos
16,55% – Vontade de não ir mais para a escola
16,44% – Tristeza/choro
9,02% – Falta de estímulo para o estudo
3,31% – Dificuldade de dormir
2,28% Dificuldade de alimentar-se
Projetos desenvolvidos na cidade
Oficina de bonecas (Programa AABB Comunidade/SEE) – O trabalho com manejo de agulhas, tesoura, retalhos de pano e outros materiais para a confecção de bonecas reúne, em uma oficina, meninas de diferentes bairros e escolas públicas municipais. Aprendendo as técnicas de costura, elas têm o poder da criação, definindo cor de pele, tipos de cabelo e outras particularidades. Assim, trabalham com a aceitação e o respeito às diferenças.
Projeto Agentes do Bem – Transformar situações como fofocas, casos de agressividade, estados emocionais de angústia e depressão e diversas formas de bullying em novas possibilidades de felicidade, altruísmo, esperança e alegria é a proposta desta iniciativa da Escola José Leopoldo Rauber, desenvolvida com alunos da pré-escola ao 9º ano do Ensino Fundamental. Situações que antes eram consideradas "simples brincadeira de criança" ou "travessura" passam a ser vistas com outros olhos.
Orquestra Instrumental Félix Hoppe – A orquestra não nasceu com o objetivo de combater o bullying, mas foi se revelando um importante espaço de inclusão social, onde quem antes sofria rejeição e discriminação, hoje sente orgulho de pertencer e representar uma comunidade.
Brigada Antibullying – Projeto desenvolvido pela Escola Municipal de Ensino Fundamental Frederico Assmann em que os alunos auxiliam professores, orientadores e a própria direção na hora do recreio, nas aulas de educação física e na sala de aula, a fim de manter um ambiente de solidariedade e gentileza.