O somatório de três anos de cortes no repasse de recursos da União traz um cenário preocupante para as universidades federais do Rio Grande do Sul. Com um déficit que chega a pelo menos R$ 240 milhões desde 2014 – segundo valores informados por cinco de seis dessas instituições no Estado –, elas enfrentam obras inacabadas, tentam economizar com serviços terceirizados, como limpeza e portaria, e não descartam, em um futuro próximo, problemas com a manutenção de restaurantes universitários (RUs) e pagamento de alunos bolsistas.
Leia também:
Pesquisa aponta crescimento da inadimplência em instituições de ensino do RS
UFSM abre inscrições para 970 vagas de especialização a distância
Educação física é a segunda licenciatura com mais alunos no país
– Estamos no limite – diz Mauro Del Pino, reitor da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), que neste mês esteve em Brasília em busca de recursos.
Recentemente, a reitoria da UFPel emitiu nota esmiuçando a penúria. Desde 2014 até agora, a instituição deixou de receber R$ 34,2 milhões para custeios e investimentos em obras e equipamentos – o recurso estava aprovado nas leis orçamentárias dos últimos três anos. Neste período, a UFPel investiu R$ 21,1 milhões de recursos próprios no Hospital Escola e R$ 2,4 milhões na barragem-eclusa do Canal São Gonçalo, que garante a passagem pela Hidrovia do Mercosul, a dessalinização da Lagoa Mirim e favorece o plantio de arroz na região.
– Até o fim deste ano, se mantidas as limitações, o valor que deixou de ser utilizado nas atividades-fim da universidade, como ensino, pesquisa e extensão, pode chegar a R$ 57,7 milhões. Precisaríamos de pelo menos R$ 24 milhões neste ano para equilibrar contas e honrar compromissos. Caso contrário, teremos dificuldade para manter terceirizados, o RU e o pagamento de bolsistas – avalia o reitor.
MEC promete mais dinheiro para custeio em 2017
Conforme a Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes), do início do ano até a primeira semana de outubro foram repassados às universidades federais 90% dos limites de custeio e apenas 50% dos valores para investimentos previstos em lei e acordados com o Ministério da Educação (MEC). Na quarta-feira, a entidade solicitou à pasta a liberação de valores pendentes, com "especial ênfase nos recursos destinados ao custeio das universidades". Ontem, a assessoria de imprensa do MEC informou que o orçamento de 2017, em relação ao limite de empenho de 2016, aumentará em 7,4% para as federais. Para o próximo ano, o MEC manterá os mesmos valores de 2016 para as despesas de investimento e aumentará o orçamento para custeio das universidades em R$ 411 milhões.
Somente neste ano, a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) deixou de receber R$ 31 milhões entre recursos de custeio e para investimentos. Em 2015, a instituição já havia perdido R$ 23,4 milhões previstos para investimentos. E a situação é ainda mais angustiante para as instituições que ainda estão em fase de implantação, como a Universidade Federal do Pampa (Unipampa), que conta com 10 campi espalhados pelo Estado. Além de ter uma redução de R$ 80 milhões no orçamento dos últimos dois anos, a universidade ainda está à espera de outros R$ 35,6 milhões previstos que não chegaram.
– Havia o compromisso de concluirmos muitas obras nestes primeiros 10 anos da Unipampa, que é a fase de implantação. Deveríamos começar 2017 como uma instituição estabelecida. Só que nos últimos anos conseguimos concluir somente cinco de cerca de 40 obras, que incluem salas de aula, laboratórios e casas de estudante. Os cortes do governo e os atrasos nos repasses fizeram com que muitas empresas abandonassem os canteiros, e a maior parte das obras terão contratos rescindidos – afirma Luís Hamilton Tarragô, pró-reitor de Planejamento e Infraestrutura da Unipampa.
UFSM depende de obras para ampliar cursos
Atualmente, a instituição conta com 1,7 mil servidores, mais de 300 funcionários terceirizados e 13 mil alunos – dos quais, estima-se que cerca de mil necessitem do benefício da moradia estudantil para permanecer na universidade. Somente um campus, o de Santana do Livramento, no entanto, conta com casa para estudantes, que ainda está longe de oferecer aos alunos a estrutura prevista pela reitoria.
Na Região Central, a Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) tem 49 obras em andamento, necessárias para a ampliação da oferta de cursos previstos pelo Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni). A estimativa de gastos é de R$ 48 milhões, e os custos estão sendo bancados com o orçamento da universidade, sem cobertura do governo federal. Além disso, nos últimos três anos, a UFSM deixou de receber R$ 112 milhões do total acordado com o MEC – sendo cerca de R$ 74 milhões de capital para investimento e R$ 22 milhões de custeio dos serviços.
– Nossas prioridades são a assistência estudantil, as atividades básicas e as obras iniciadas. Desde 2014, estamos fazendo cortes onde podemos, com diárias, serviços terceirizados, gastos com gasolina, entre outros – afirma Frank Leonardo Casado, pró-reitor de Planejamento da UFSM.
Zero Hora contatou as reitorias de seis universidades federais do Rio Grande do Sul. As dificuldades em razão dos cortes da União estão presentes em todas as instituições. A Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFSCPA) informou que não divulgaria os valores dos orçamentos contingenciados. E a Universidade Federal do Rio Grande (Furg) revelou apenas o déficit de 2016.