Olhar o gabarito e dar-se conta de que o desempenho no vestibular não foi lá o bixo - e depois comprovar isso ao ficar de fora da lista de aprovados - costuma ser frustrante. Pior ainda é perceber que a nota do Exame Nacional de Ensino Médio (Enem) não serviu para abrir a sonhada vaga na universidade.
É o prenúncio de mais 12 meses debruçado sobre os livros, mais idas e vindas aos cursinhos pré-vestibulares e pressão extra pela aprovação. Além daquela incômoda sensação de ter falhado.
- O aluno retoma a rotina com a memória muito recente da reprovação. Mesmo que seja por uma pequena margem em relação à nota dos aprovados, alguns estudantes se culpam, e isso pode prejudicar seu novo ano de preparação - explica Alexandre Schiavoni, professor de história do curso Anglo Vestibulares e tutor da turma que se prepara para medicina.
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Como resultado mais imediato, parte dos alunos largam a 100 km/h nas primeiras semanas do novo ano: fazem dezenas de simulações, estudam
12 horas por dia, ou mergulham em uma matéria que pontualmente não foram muito bem no último vestibular, mas que talvez no histórico não seja sua maior dificuldade. O problema é que não conseguem manter o pé no fundo por muito tempo, e o aprendizado começa a ser prejudicado.
- É importante identificar corretamente o que faltou para a aprovação, até para reduzir o estresse - aponta Schiavoni.
Reprovação é etapa natural
A experiência de quem bombou nos últimos processos seletivos mostra que a reprovação deve ser enxergada como uma etapa natural da conquista da vaga, a partir da qual se faz uma autocrítica mais precisa e se reorganiza melhor o esquema de estudos. Dois dos gaúchos que mais se destacaram nos últimos vestibulares e na seleção do Sisu são exemplos.
- Evidentemente fiquei frustrado (com a reprovação no primeiro processo seletivo), mas olhei pra frente e enxerguei as possibilidades que me esperavam - conta Vitor Classmann, aprovado em 11 instituições de ensino para Medicina nas últimas duas épocas de seleção, Inverno de 2015 e Verão de 2016.
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Mateus Schneider, aprovado em 13 instituições de ensino para Medicina, conta que encarou a primeira reprovação na universidade pública como um treinamento, que o indicou como organizar os estudos e ter uma arrancada mais forte para a disputa no ano seguinte.
Rigor nipônico e aprovação em 13 universidades
Autor de uma façanha aos olhos de quem pretende entrar na Medicina, Mateus ensina que disciplina e planejamento nunca são demais para disputar uma vaga na universidade. Ele foi aprovado em 13 instituições nos dois últimos processos seletivos, três no inverno de 2015 e 10 no verão deste ano. E conquistou o maior objetivo: ingressou na Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA), via Sistema de Seleção Unificada (Sisu), na 13ª colocação.
- Organizei os horários do pré-vestibular e criei uma agenda de estudos complementares para cada dia, com tempo bem definido de intervalo e descanso - explica.
Era uma rotina de deixar com inveja os japoneses, reconhecidos pela rigidez na organização. Depois de chegar em casa do cursinho, mergulhava em uma bateria de simulações e exercícios entre 14h e 23h40min, nem um minuto a mais. O relógio soava a cada duas horas avisando que era hora de fazer um lanche e esticar as pernas.
- Fiz questão de me manter na academia de ginástica três vezes por semana para manter o equilíbrio emocional - conta.
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No final de semana, a carga era mais leve. Estudava desde cedo, pela manhã, até as 19h30min, e depois passava a noite com o pai, a mãe e a irmã - ela está no terceiro ano da Medicina. A experiência o ajudou a manter o foco - ele já havia passado pela universidade antes. Em 2012, começou a cursar Engenharia Mecânica na UFRGS, logo depois de concluir o Ensino Médio. Mas no quarto semestre descobriu que estava no curso errado, e recomeçou o pré-vestibular.
- No verão de 2015, tentei entrar na Medicina em uma universidade federal, mas não deu (passou na Unisc, uma instituição privada). Duas semanas depois, me inscrevi em um pré-vestibular e já comecei a estudar, antes mesmo do início das aulas - explica ele, hoje com 20 anos.
A antecipação do estudo foi determinante para o sucesso em 13 processos seletivos, acredita ele: desta forma, pôde memorizar melhor o conteúdo e reduzir gradativamente a intensidade conforme se aproximavam os vestibulares e o Exame Nacional de Ensino Médio (Enem).
E engana-se quem pensa que Mateus vai ficar de pernas para o ar o resto do verão.
- Semana que vem, começo a estudar o conteúdo do primeiro semestre da Medicina pelos livros da minha irmã - avisa.
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"Enxerguei o vestibular apenas como um degrau"
Aos 18 anos, Vitor Classmann alcançou um feito que poucos obterão ao longo da vida. Ainda assim considera ter subido apenas um degrau em sua trajetória. A aprovação em 11 processos seletivos para Medicina - quatro em instituições privadas no Vestibular de Inverno de 2015, e sete em universidades públicas e privadas neste verão - foi obtida a base de muito estudo e confiança.
A rotina dos livros foi árdua. Acordava cedo para assistir às aulas pela manhã e à tarde no cursinho, e, à noite, ainda se debruçava sobre o material didático. Mais de uma vez foi dormir às 3h para acordar pouco depois e correr até o pré-vestibular.
- Tirei forças não sei de onde para encarar a rotina - suspira.
Vitor Classmann, 18 anos, passou em 11 vestibulares para Medicina
Natural de São Martinho e tendo feito o Ensino Médio em Três de Maio, fez novos amigos quando chegou a Porto Alegre para se preparar para o Ensino Superior. E neles encontrou uma válvula de escape para a pressão pela aprovação.
- Não me importava de interromper os estudos para tomar um café com os amigos. Não daria para atravessar o ano inteiro sem os momentos de descontração - afirma.
Para tirar das costas a tensão do processo seletivo, procurou mentalizar o vestibular como uma parte de um caminho mais longo para realizar um sonho: ser médico.
- Enxerguei o vestibular apenas como um degrau. Eu quero ser médico, e estudo para ser médico, não para passar no vestibular.
Não foi uma trajetória fácil. O primeiro processo seletivo, pelo Sisu, no início de 2015, não possibilitou ingresso em universidade pública. Venceu a frustração olhando para frente, e não tentando explicar no que havia falhado. Hoje, a consagração da aprovação em 11 processos seletivos fez tudo valer a pena - em particular por que conseguiu o que queria, ingressar UFCSPA, via Sisu, em 9º lugar.