A atenção dos alunos do 2º ano da Escola Municipal de Ensino Fundamental Irmão Weibert, em São Leopoldo, não é focada apenas na professora em frente ao quadro-negro. Nessa sala de aula, o olhar das crianças também percorre o espaço para ir ao encontro de outra referência: uma segunda docente, que se desloca na classe atendendo individualmente os estudantes.
Desde o início do ano letivo, Ana Rauta e Gisele Giacomin recepcionam seus 50 alunos de sete e oito anos na maior sala disponível na escola. A dupla coloca em prática o conceito de docência compartilhada, no qual duas pessoas comandam um mesmo grupo - essa é a primeira iniciativa do gênero na rede municipal da cidade. Em Porto Alegre, há poucas escolas do município que utilizam o sistema e, na rede estadual, o mais próximo é a figura do professor apoiador, que auxilia em mais de uma turma.
Em vídeo, saiba como é a dinâmica de uma aula com docência compartilhada:
Em 2014, Ana e Gisele lideravam duas classes do 1° ano e já desenvolviam atividades pontuais com os alunos juntos. A partir daí, surgiu a ideia de unir esforços no ano seguinte.
- Reestruturamos o currículo. Agora, as crianças participam de uma aula mais interativa. Essa escolha é justamente para não se obrigar a voltar aos antigos padrões - afirma Ana.
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O projeto foi apresentado à direção da instituição e à Secretaria Municipal de Educação. Com a aprovação, as docentes deram início a um planejamento especial para ser aplicado no dia a dia. Ao chegar à sala, um ponto chama a atenção: o número de cadeiras e classes é propositalmente menor do que a quantidade de alunos. Parte dos estudantes fica sentado, confortavelmente, em colchonetes, geralmente se dedicando a leituras. Às 13h, os alunos são recepcionados com uma contação de história. Depois, formam cinco grupos para passar por diferentes estações de aprendizagem - as professoras se revezam nas explicações. Enquanto uns copiam no caderno, por exemplo, outros usam a criatividade com a massinha de modelar ou leem livros e gibis. A ideia é que os pequenos se envolvam em todo o circuito de atividades na mesma tarde, finalizando às 17h.
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- A proposta foi fugir do "tudo igual para todo mundo ao mesmo tempo" - ressalta Ana.
Segundo as professoras, esse formato faz com que os alunos participem de uma aula mais dinâmica e interessante, com momentos de socialização. Já as próprias educadoras podem desenvolver um planejamento em conjunto, favorecendo a troca de ideias, além de aplicar um formato de ensino que foge do convencional.
- Temos um grupo em aula com mais dificuldades de aprendizado. Com esse sistema, conseguimos dar atenção especial e fazer atividades específicas - diz Gisele.
Número alto de alunos pode trazer prejuízos
Professora e pesquisadora da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Maria Luisa Merino Xavier acredita que esse formato é uma tendência no ensino. Mas, segundo a especialista, o desejável na docência compartilhada é manter uma turma com cerca de 25 alunos. Assim, o investimento de recursos das mantenedoras se torna maior, o que pode ser determinante para esse tipo de projeto ter continuidade. No caso da Escola Irmão Weibert, ocorreu apenas a união de duas turmas e, com 50 crianças, o trabalho pode ficar prejudicado.
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- Não é aconselhável um grupo desse tamanho. Isso pode comprometer a eficiência do projeto. A dificuldade de concentração da turma e o barulho podem gerar dificuldades para o atendimento às crianças - alerta Maria.
Adaptação às mudanças
Com prós e contras, a iniciativa das professoras foi apoiada pela comunidade escolar. Na opinião de Joice Chacon, mãe de Ananda, a filha tem conseguido vencer a timidez e, agora, até lê em público.
- Ela está tendo um desenvolvimento pessoal também. Essa dinâmica tornou ela mais segura - diz a analista de relações do trabalho.
Pai de Nicolas, o impressor off-set Claudecir Wazlawick destaca os avanços do filho na leitura:
- O aprendizado dele melhorou. A dinâmica influenciou no seu desenvolvimento.
Já a aluna Micaela Santos, oito anos, diz que, com apenas uma professora e menos crianças na sala, a aula era mais silenciosa.
- A turma é bem barulhenta. Às vezes, as professoras precisam gritar. Mas uma coisa boa é que, agora, a gente faz diferentes atividades - relata.
Outro apoio que as docentes buscam é de uma universidade que oriente o projeto de docência compartilhada, para que a iniciativa ocorra de forma mais eficiente.
- Queremos abrir o espaço para os acadêmicos analisarem e nos darem dicas. Como é um projeto-piloto, trabalhamos muito com tentativa e erro - comenta a professora Ana Rauta.