Primatas e seres humanos possuem uma notável capacidade de detectar serpentes mesmo em ambientes com dificuldade de visão. A pesquisa realizada pelos professores do Instituto de Ciências Biológicas (IB) da Universidade de Brasília (UnB) Rafael Souto Maior e Carlos Tomaz, em conjunto com pesquisadores japoneses e americanos, revelou que um determinado grupo de células nervosas no cérebro dos primatas respondia mais rápido na identificação de serpentes. O artigo foi publicado na revista Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS), na semana passada. A pesquisa contou com o apoio da Asian CORE Program (Japão).
Por meio de sondas inseridas no cérebro dos macacos foi possível detectar que os neurônios localizados no pulvinar - parte do cérebro envolvida na atenção visual - foram mais rápida e fortemente ativados em resposta a estímulos visuais de serpentes, comparado com outros estímulos.
- Nós realizamos testes em primatas justamente por eles terem uma estrutura cerebral bastante similar à do ser humano. Sendo assim, podemos supor que nós também temos essa capacidade de detectar serpentes - explica o professor Tomaz.
Em várias mitologias, a serpente é vista como um ser insidioso, por ser um predador que não corre atrás, mas fica à espreita e depois ataca.
- Nós vemos que há esse histórico marcante da serpente na nossa cultura. Ela agrega esse caráter da maldade escondida - conta o professor Rafael Maior.
De acordo com o professor Carlos Tomaz, a pesquisa pode ter implicações práticas se analisada por outras perspectivas, como no caso da ofidiofobia, o medo de serpentes.
- Sabemos que a ofidiofobia é a fobia mais comum entre humanos. Esse estudo pode vir a ajudar no entendimento dos mecanismos neurais dessas fobias - afirma.
Evolução
Uma das autoras do artigo, a antropóloga Lynne Isbell, da Universidade da Califórnia Davis, desenvolveu a teoria da evolução que diz que nosso sistema visual, ao longo de 60 milhões de anos, evoluiu pela necessidade de detectar serpentes, predadores que geralmente estão escondidos na vegetação; caso contrário, teríamos sido extintos.
O artigo publicado pelos professores vem "apoiar" essa teoria.
- É a primeira evidência neurocientífica para esta teoria da evolução. Foi um casamento bem sucedido - afirma Tomaz.