A comissão da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) que conduzia um Processo Disciplinar Discente (PDD) contra um aluno denunciado por racismo contra uma professora decidiu pela expulsão do estudante. O nome dele não foi divulgado.
O portal G1 entrou em contato com a UFRGS para saber se a determinação deve ser cumprida de forma imediata ou se ainda é possível que o estudante recorra para tentar reverter a decisão, mas não obteve retorno até a publicação desta reportagem.
O caso teria acontecido em 19 julho de 2023, quando a professora Gláucia Aparecida Vaz, do curso de Biblioteconomia, chegava para dar aula. A docente conta que o universitário disse que ela "não sabia qual era o lugar dela". Ele também teria falado que ela "continuaria sendo perseguida e odiada".
No entendimento da comissão, "o conjunto de ocorrências, para além do acontecido no dia 19 de julho, entre a professora Glaucia e o estudante indicam indução, incitação e prática de assédio com destaque para racismo e misoginia". Por essa razão, ele incorreu em infração estudantil gravíssima.
O advogado que defende a professora, Lúcio Almeida, avalia que "a UFRGS tem uma grande oportunidade para mostrar ao público brasileiro, que não compactua com qualquer tipo de manifestação discriminatória. Racismo é um crime muito grave".
— O que a professora Gláucia passou é reflexo de um país que não aceita uma mulher empoderada na condição de professora universitária numa universidade federal de renome. Precisamos mudar essa realidade — diz Almeida.
Manifestações dentro e fora da universidade
Ao longo do PDD, testemunhas apontaram que o aluno se manifestava de forma inadequada contra a professora, tanto fora da sala de aula, em um grupo da turma no WhatsApp, quanto na universidade, "depreciando a abordagem dada aos conteúdos, questionando suas metodologias".
Ele teria dito "que a professora Glaucia era uma 'mala' e que a racista era ela porque ele era branco dos olhos verdes", diz o relatório.
Durante depoimento à comissão, o estudante também teria dito que "nada a ver ser preta ou mulher, o problema é ser chata", que foi casado com uma "mulher negra" e que tinha um filho que "é mulato".
A comissão enquadrou o caso no Código Disciplinar Discente. "O seu inciso V caracteriza como infração gravíssima 'praticar, induzir ou incitar, a discriminação ou preconceito de raça, sexo, cor, etnia, religião ou procedência nacional'", disse a comissão.
Gláucia relata que, assim que passou a catraca da recepção da Faculdade de Biblioteconomia e Comunicação (Fabico), em Porto Alegre, percebeu que o aluno a aguardava segurando o elevador. Em seguida, ele disse que queria discutir uma questão do trabalho com ela, pois não havia tirado a nota máxima, 15, mas sim 14.
— A nota era praticamente a nota máxima, mas ele disse que não era a nota (o motivo da discussão), e sim o enunciado da questão. Ele não concordava com a forma que eu tinha proposto a atividade, mas não deu nenhuma explicação (a respeito do que não concordava). Falava tudo isso gritando e alterado — lembrou a professora Gláucia.
Ao ver que o diálogo não estava levando a nada, Gláucia disse que precisava trabalhar e optou por ir de escada até a sala de aula. O aluno pegou o elevador. No entanto, no lance de escadas que ia do terceiro para o quarto andar, o estudante apareceu e impediu que ela subisse.
— Minha intenção era subir direto, mas ele falou que eu não sabia escutar ninguém, que eu não sabia qual era o meu lugar. E que, ainda que fosse uma mulher, ele usou isso: falou "uma mulher loirinha dos olhos azuis", eu continuaria sendo perseguida e odiada pelas pessoas — conta Gláucia, emocionada.
A professora ainda citou que era recorrente que o aluno questionasse a sua autoridade dentro da sala de aula. Tudo isso fez com que a docente buscasse assessoramento jurídico, o que motivou o pedido de abertura de um processo administrativo disciplinar à UFRGS, para que a instituição apurasse a situação.
— Eu me senti totalmente desamparada. O que me choca mais nessa história é a falta de humanidade. E acho que isso escancara o racismo institucionalizado — afirmou, na época do caso, a professora Gláucia.