Não basta apenas chutar a resposta para fazer o maior número possível de acertos nas provas do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). É preciso também chutar corretamente para driblar o modelo matemático de correção dos testes escolhido pelo Ministério da Educação (MEC) desde 2009.
A Teoria de Resposta ao Item, a TRI, atribui níveis de dificuldade distintos a cada questão e identifica possíveis chutes. E estes níveis são responsáveis por dar a cada estudante uma pontuação final diferente, mesmo que dois alunos tenham acertado o mesmo número de questões.
Desde maio, GaúchaZH acompanha mensalmente a rotina dos estudantes Guilherme Camini Pinto, 17 anos, Anna Carolina Schneider Martins, 18, de Porto Alegre, e Rafael Cabral, 23, de Alvorada, na preparação para o próximo Enem. Os três têm opiniões diversas sobre a TRI.
Para Guilherme, aluno do terceiro ano do Colégio Estadual Protásio Alves e que pretende conquistar nota suficiente para uma vaga no curso de Engenharia Civil, o método de avaliação é uma forma eficaz de correção.
— Acredito que ela é mais focada na eliminação do participante. Existem várias armadilhas que induzem ao erro e isso deixa mais fácil a distribuição de vagas. Também mostra que o governo brasileiro não tem estrutura e não construirá uma para que todos brasileiros possam ter a oportunidade de um Ensino Superior — enfatiza.
Já Anna Carolina, que almeja uma vaga no curso de Medicina da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e no futuro pretende se tornar médica da família no Sistema Único de Saúde (SUS), acha a TRI justa porque ela minimiza muito o chute e avalia as habilidades dos candidatos.
— É bom porque, às vezes, você fica muito nervoso nas questões interpretativas, em que não tem uma resposta 100% errada. Tem a mais certa e a menos certa. Não estando 100% errada, ganharemos parte da nota. Dá uma motivação quando se está tentando buscar a vaga na universidade — destaca.
Rafael, que frequenta o curso pré-vestibular popular Minervino de Oliveira para alcançar uma média que lhe garanta a vaga em Letras na UFRGS, discorda dos outros dois estudantes. Ele acredita que o método pode prejudicar os alunos. E justifica que alguns poderão dominar o tema, mas ficarão nervosos na hora da resposta. Rafael afirma que redobrará a atenção na hora de responder cada questão.
— Por outro lado, sei que é preciso haver um método de avaliação severo e, até mesmo, que colha dados sobre cada questão — pondera o jovem.
Testes para definir o algoritmo
Para definir o algoritmo da TRI nas provas do Enem, o MEC aplica testes em alunos do Ensino Médio. As respostas destes testes são cruzadas e, a partir delas, cada questão terá um peso no exame nacional.
Nas provas, as questões referentes às respostas são divididas em fáceis, médias e difíceis. Quem participa do Enem não sabe quais são estas divisões.
As fáceis são as perguntas que tiveram mais respostas certas. E elas recebem pontuação mais baixa. As médias são aquelas que tiveram 50% de acertos e 50% de erros. As difíceis são as perguntas que os alunos mais erraram nos testes. Por isso, recebem pontuação maior na hora do fechamento da nota.
É no momento de pontuar os acertos e os erros de uma prova do Enem que a TRI entra em ação para valorizar os alunos mais coerentes em seu desempenho. Um aluno que acerte poucos itens fáceis e muitos difíceis é considerado caso improvável e incoerente, perdendo pontos em relação ao aluno que acerta muitos itens fáceis e poucos difíceis. E esta dinâmica ocorrerá mesmo que os candidatos tenham a mesma quantidade de acertos na prova. Em outras palavras, pode-se continuar chutando quando não se sabe a resposta, mas é importante garantir a maior quantidade de acertos nas questões fáceis.
A nota final não depende apenas do valor absoluto de acertos, mas é considerada a dificuldade das questões acertadas ou erradas ao longo da prova. Por atribuir um peso diferente às perguntas e identificar chutes, o sistema TRI não permite saber qual a pontuação final com base no número total de acertos. Se o aluno entregar uma prova em branco, sua nota nunca será zero, mas um valor mínimo estipulado em razão do grau de dificuldades das perguntas.
Método comprovado
- Criada nos anos 1950, a TRI é utilizada como sistema de avaliação no TOEFL, exame que mede a proficiência em inglês, bastante comum para quem busca programas de intercâmbio. O objetivo do Inep é garantir a elaboração de provas com o mesmo grau de dificuldade ao longo dos anos.
- As notas mínima e máxima de cada prova nunca serão 0 ou 1.000. Isso porque a avaliação não consegue inferir se o candidato tem proficiência muito baixa ou muito alta, assim como não existem questões muito fáceis ou muito difíceis. Em 2017, por exemplo, a nota máxima (45 acertos) para Ciências da Natureza e suas Tecnologias foi 885,6.
- É sempre melhor chutar do que deixar uma questão em branco. Se a avaliação não identificar coerência no chute, o acerto poderá ser desvalorizado, mas uma questão em branco significa necessariamente um erro.