Até o fim da manhã desta quinta-feira (9), a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) havia identificado o corte de 133 bolsas da Capes – 45 de mestrado, 80 de doutorado e oito de pós-doutorado. A suspensão atingiu todos os 80 programas de pós-graduação da instituição, inclusive aqueles considerados de excelência, com nota máxima.
De acordo com o pró-reitor de pós-graduação, Celso Loureiro Chaves, o corte chegou a 5% do total de 2,7 mil bolsas. O cancelamento, afirma o pró-reitor, atingiu todas as bolsas que, depois da diplomação do aluno detentor, estavam em processo de concessão para um aluno entrante. Constavam como disponíveis no sistema da Capes, mas desapareceram nesta semana.
— Não há bolsas ociosas, desocupadas. O que há é um interregno entre a conclusão e a alocação de bolsas, inclusive porque a Capes só abre o sistema para colocar novos bolsistas uma vez por mês. Não é um fluxo contínuo.
Um dos temores é de que outros alunos que estão chegando ao fim da sua pós-graduação tenham a bolsa congelada, impedindo a transferência para novos estudantes, o que ampliaria o impacto da medida.
Loureiro Chaves avalia que os maiores prejudicados, neste momento, são os candidatos que estavam para receber o benefício:
— O impacto imediato, que mais preocupa, é que, na ausência das bolsas, muitos alunos entrantes não possam fazer seus cursos, porque são dependentes delas para se manter. A médio prazo, também fica comprometido o trabalho de pesquisa. É toda uma geração que entra e que já vai estar prejudicada na origem. É claro que vamos ter um prejuízo na produção científica.
Um dos setores atingidos é o programa de pós-graduação em genética e biologia molecular, fundado em 1963 pelo professor Francisco Salzano, uma das principais referências da ciência brasileira até sua morte, aos 90 anos, no fim do ano passado. Em março, depois da diplomação de um grupo de alunos, o programa começou o processo para a concessão de 10 bolsas de doutorado. Publicou edital, abriu inscrições, homologou inscrições, realizou provas e avaliou currículos. Doze candidatos foram aprovados, sete deles do Interior ou de outros Estados, e estava-se apenas à espera de que terminasse o prazo de recursos para o anúncio do resultado (10 receberiam a bolsa de imediato e outros dois ficariam à espera). No começo desta semana, no entanto, todas as 10 bolsas sumiram do sistema da Capes. Das 87 que havia, restaram 77 bolsas.
A coordenadora substituta do programa, Loreta Brandão de Freitas, considera o corte uma calamidade. Ela lembra que foram atingidas pesquisas na área da saúde, envolvendo doenças raras e o zika vírus.
— No zika, a pesquisa envolve terapia e aspectos da resposta genética do indivíduo à infecção. Pesquisas como essa vão deixar de ser realizadas, porque cada aluno que ingressa apresenta um plano de trabalho, que é submetido nas inscrições. Sem bolsa, eles não terão condições de participar, porque nosso programa exige dedicação exclusiva. É conhecimento que deixará de ser produzido — diz.
Caso a universidade preencha as vagas com alunos que não dependem de bolsa, isso significaria favorecer não os mais capacitados ou os projetos de pesquisa considerados mais relevantes, mas aqueles apresentados por alunos de condição financeira mais elevada, capazes de se bancar durante o período do doutoramento.
— Os prejuízos são em cascata. Uma bolsa de doutorado é de quatro anos. São pesquisadores que deixam de ser formados, profissionais que não se qualificam e não retornam a suas cidades para ajudar a formar novos profissionais — comenta Loreta.
Em outro programa da UFRGS, o pós em biologia celular e molecular, também nota máxima na Capes, os cortes atingiram duas bolsas de doutorado que tinham processo de seleção agendado para a manhã da quarta-feira. No começo do dia, o coordenador, Rogério Margis, verificou no sistema que elas haviam sido suspensas e avisou aos candidatos que nem adiantava eles comparecerem.
Uma das bolsas envolvia pesquisa de biotecnologia que tinha como meta aumentar a produtividade do arroz, tornando-o mais resistente. A outra tratava de estudar problemas que o estresse pode causar em mamíferos.
— Esses trabalhos vão ficar parados, até que se tenha mão de obra para tocá-los — lamenta Margis.