O Instituto Adventista Cruzeiro do Sul (IACS), em Taquara, afirmou ter retirado o quadro retratando Adolf Hitler de uma de suas salas de aulas voltada a alunos do Ensino Médio. A imagem aparecia em um álbum online sobre as provas da primeira fase da Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas, que neste ano teve sua primeira fase realizada em junho.
A escola emitiu uma nota oficial na tarde desta terça-feira (22) informando que "o local é um ambiente temático voltado às aulas de História, que traz imagens de figuras que desempenharam algum papel na trajetória da humanidade. Isso não quer dizer, no entanto, que durante a disciplina os professores estimulem os estudantes a seguir as práticas ou ideologias de tais personalidades".
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O colégio, porém, não esclareceu se o quadro foi substituído ou se o local ficou vazio. Pedidos da reportagem para ouvir a direção e receber novas imagens da sala não foram atendidos.
Professores de outras instituições de ensino ouvidos por ZH se mostraram surpresos com o uso do quadro em ambiente escolar. Para o doutor em história Mateus Dalmaz, que leciona nos cursos de História e Relações Internacionais na Univates, mesmo o fato de a imagem ter sido afixada em uma sala temática não justifica o uso da figura de Hitler em permanente exposição. Ele explica que lições na área são melhor aproveitadas quando vinculadas a processos históricos, e não a personagens – ainda que fossem grandes líderes.
– Se fosse para mostrar imagens da II Guerra Mundial, melhor destacar fotos da destruição causada, do impacto na sociedade civil. Não individualizando a história. Isso não é recomendável – diz Dalmaz.
Ele afirma ainda que, em um ambiente escolar, deve haver incentivo a valores como cooperação, integração e solidariedade – conceitos distantes da figura segregacionista e totalitária de Hitler.
– Não é necessário expor uma suástica, uma foice e um martelo para falar sobre assuntos como nazismo e comunismo. Sem a devida contextualização, a representação simbólica dessas imagens pode assumir um tom muito diferente do incentivo pedagógico desejado – completa o professor.
Para o professor de história do século 20 na Feevale Rodrigo Martins, a decisão de expor o quadro foi "estranha".
– Um quadro desses é de profundo mau gosto, ainda mais em uma escola religiosa. Aquela imagem ali coloca em segundo plano um trabalho do professor que pode ser muito bom. Se a escola é o momento em que a gente tenta antecipar situações que o aluno vai viver quando for adulto, usar essa figura é algo que não colabora com o crescimento do jovem – afirma Martins.
O doutor em história pondera que é uma atitude problemática trabalhar com personagens sem que seja dado o devido contexto. Se um aluno ainda não teve aulas sobre a II Guerra, sobre movimentos racistas, ultranacionalistas, ver a imagem de Hitler na sala pode levar a interpretações erradas – como se aquela figura, ao lado de outros líderes históricos, fosse algo a ser exaltado.
– Ainda mais nesse momento tenso em que a gente vive, com o ressurgimento de algumas práticas neonazistas e de "supremacia branca", como em Charlottesville (nos Estados Unidos). Nesse contexto, seria preciso ter ainda mais cuidado – completa Martins.
Confira a nota oficial divulgada pelo colégio:
"O Instituto Adventista Cruzeiro do Sul (IACS) é uma instituição de ensino que há mais de 90 anos transmite valores morais, sociais e espirituais a cada um de seus estudantes. Em sua trajetória, sempre prezou pela educação de qualidade, apresentando conteúdos que são fundamentais não apenas para o desenvolvimento intelectual, mas para a formação de uma completa visão de mundo.
Em recente reportagem publicada pela imprensa gaúcha, em que é possível ver um quadro de Adolf Hitler em uma de suas salas de aula, cogitou-se a possibilidade de tratar-se de uma apologia ao nazismo. Na verdade, o local é um ambiente temático voltado às aulas de História, que traz imagens de figuras que desempenharam algum papel na trajetória da humanidade. Isso não quer dizer, no entanto, que durante a disciplina os professores estimulem os estudantes a seguir as práticas ou ideologias de tais personalidades.
Nossos docentes têm a função de apenas apresentar fatos que ajudem o aluno a compreender o papel desempenhado por figuras e situações históricas. Por isso, a instituição vem a público tranquilizar a comunidade, os pais e os alunos que confiam no trabalho realizado por cada um de seus funcionários. E informa que retirou o quadro.
Durante todas as aulas ministradas, em momento algum defende-se ou prega-se a ideologia do regime nazista. Pelo contrário. Apresenta-se o horror dos regimes totalitários e o papel desempenhado pela democracia para evitar que episódios de tal natureza se repitam.
O Instituto Adventista Cruzeiro do Sul (IACS) reitera a valorização do ser humano e não defende ideias extremas prejudiciais ao indivíduo e à sociedade. E é dessa forma que acredita ser possível fazer do mundo um lugar melhor."