A aprovação do projeto que suspende o pagamento da dívida do Rio Grande do Sul com a União por 36 meses no Senado, nesta quarta-feira (15), e a série de medidas anunciadas pelo governo federal ainda não contemplam aspectos considerados fundamentais para que o Estado recupere capacidade de investimento mínima para fazer frente ao plano de reconstrução após a tragédia provocada pelas enchentes. Os R$ 11 bilhões referentes ao pagamento de parcelas e outros R$ 12 bilhões em juros que ficarão nos cofres e terão de formar um fundo de recuperação — que também precisa do aval parlamentar, desta vez, da Assembleia Legislativa — são insuficientes para solucionar problemas estruturais que limitam o poder de ação do Palácio Piratini.
O primeiro entrave é o teto de gastos estipulado pelo Regime de Recuperação Fiscal (RRF). O limite de 15% da Receita Corrente Líquida (RCL) para novos financiamentos terá de ser "urgentemente revisitado", conforme explica a titular da Secretaria da Fazenda gaúcha, Pricilla Santana.
A ideia, complementa, é manejar gastos fora do teto e abrir espaço fiscal para contratação de operação de crédito e novas despesas correntes. Na prática, será preciso elevar os gastos, inclusive os de custeio de servidores, o que também era travado pelo RRF.
Um exemplo mencionado por um representante do alto escalão do governo é a situação dos projetos para reerguer as pontes destruídas pelas enxurradas. Atualmente, o Departamento Autônomo de Estradas de Rodagem (Daer-RS) possui somente um profissional para aprovar as obras e, em razão da necessidade de celeridade no processo, será preciso ampliar o efetivo. A questão é que, se os recursos da dívida ficarem amarrados em um fundo, cuja natureza e regras terão de passar pelos deputados gaúchos, há risco de que as despesas correntes não sejam contempladas pelas verbas.
Outro problema que se anuncia e, até o momento, ficou de fora das ações emergenciais é a necessidade de arcar com R$ 11 bilhões para quitar os precatórios até 2029, conforme o previsto em Lei. Também há dificuldades para destinar mais R$ 3,3 bilhões em aportes para a educação, por conta da impossibilidade de contabilizar os inativos na aplicação do percentual mínimo de 25% exigido pela Constituição.
– São elementos que a gente vai ser desafiado, vai precisar adequar, mas nenhum desses pontos foram endereçados nas medidas até agora anunciadas – afirma a secretária, ao lembrar que as flexibilizações dependem de Propostas de Emenda Constitucional, ou seja, aquelas votadas em dois turnos na Câmara e no Senado cuja aprovação requer três quintos dos votos dos deputados (308) e dos senadores (49).
Segundo ela, sem o ajuste nas despesas primárias correntes, será muito difícil fazer frente ao "necessário volume de despesas com a recuperação da infraestrutura perdida". Para isso, também há um plano em processo de avaliação na Secretaria Nacional do Tesouro que estava em análise desde março e, após a suspensão da dívida, também terá de ser remodelado, pois, de acordo com Pricilla, os desafios fiscais estão muito atrelados ao plano de recuperação fiscal.
Medidas de emergência
Em três visitas ao Rio Grande do Sul neste mês, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva anunciou uma série de medidas para socorrer o Estado. O foco está na recuperação de moradias, empresas e amparo financeiro às famílias atingidas. No entanto, quando o assunto é o repasse de recursos ao Estado, além dos gastos com o custeio das ações de Defesa Civil que já ultrapassam a casa de R$ 100 milhões, não há entradas registradas pela Secretaria da Fazenda.
Conforme a pasta, os recursos são essenciais para auxiliar na reconstrução e estão no âmbito do governo federal neste momento e não foram recebidos repasses da União. As equipes estaduais e federais trabalham conjuntamente para agilizar os processos e o Estado necessita dessas alterações na legislação para que as ações sejam mais rápidas.
Sobre o valor inicial de R$ 19 bilhões pedido pelo governo gaúcho inicialmente e, coberto com a suspensão dos pagamentos da dívida com a União, a Fazenda reforça que são muitas as necessidades junto ao governo federal. Algumas delas, como moradias, infraestrutura, apoio às pessoas estiveram no foco dos anúncios feitos na quarta-feira (15) pelo presidente.
Balanço de algumas ações federais
A Caixa informa que, em parceria com o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), antecipou para o dia 15/05 o pagamento do Abono Salarial 2024, referente ao ano-base 2022, a todos os trabalhadores do Rio Grande do Sul, independentemente do mês de nascimento.
Com isso, serão antecipados os benefícios de 702 mil trabalhadores nascidos entre julho e dezembro, no valor total de R$ 726 milhões. Os valores do Abono Salarial variam de acordo com a quantidade de dias trabalhados durante o ano-base 2022.
Além disso, em conjunto com o Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome, o banco também antecipará o pagamento do Programa Bolsa Família para todos os beneficiários do Rio Grande do Sul, que irão receber os valores nesta sexta-feira (17), independentemente do número do NIS. Ao todo, serão pagos R$ 400,6 milhões para mais de 619 mil famílias do Estado.