O empresário João Paulo Pacífico integra o clube dos super-ricos brasileiros, mas diverge da maioria do seu círculo social quando o assunto é cobrança de impostos. Pacífico faz parte de um grupo de milionários e bilionários que assinaram uma carta pública mundial em defesa do aumento da tributação dos super-ricos para que os pobres e a classe média possam pagar menos tributos.
CEO de Investimentos de Impacto do Grupo Gaia, o empresário deu entrevista ao Gaúcha Atualidade, da Rádio Gaúcha nesta quarta-feira (31) e criticou o sistema tributário atual que faz com que ele mesmo e outros super-ricos paguem proporcionalmente menos impostos do que o restante da sociedade.
— Se o Estado precisa de recursos, o que é mais justo: pobre, classe média ou mais ricos pagarem impostos? A pessoa pobre, que paga muito imposto, é muito injusto com ela. A pessoa de classe média (pagar muito imposto) também é muito injusto. Mas a pessoa mais rica, não. Quando você tributa bens e serviços, o valor que o pobre está pagando para o imposto é igual ao do rico. Então, por isso que a gente tem que tributar, por exemplo, dividendos — diz o empresário.
Pacífico também avalia que parte da classe média defende discursos que, na realidade, servem apenas aos interesses dos super-ricos:
— Tem muita gente que é pequeno empresário, que tem o seu negocinho, o que é maravilhoso, e que se compara com o dono do Itaú. Ninguém gosta de pagar imposto, só que daí esse cara de classe média paga imposto para caramba. Ele paga muito imposto. E ele não percebe que o bilionário paga muito menos imposto do que ele — afirma Pacífico.
Ele defende a vida do milionário não será afetada se ele pagar mais tributos:
— Quem tem mais dinheiro, se pagar imposto, não vai mudar em nada a vida dessas pessoas. E quem é mais pobre, quando paga (mais impostos), isso afeta muito a vida dessas pessoas. Então, é importante as pessoas diferenciarem: não é porque o cara tem um carro do ano e um apartamento legal que ele não é (da classe média). Eu não estou falando (de taxar) essa pessoa. Estou falando com quem é muito rico. Esses caras (muito ricos) pagam quase nada — acrescentou.
O empresário também acredita que o avanço da inteligência artificial vai desempregar no futuro parte expressiva da população, demandando mais recursos para o Estado investir em auxílios.
— Com o advento das inteligências artificiais, a quantidade de empregos vai reduzir no futuro. Muito. Então, tem muita gente de classe média que está se achando importante e que vai precisar de auxílio, que os filhos vão precisar de auxílio do governo, senão não vão sobreviver — argumentou Pacífico.
O milionário também alega que há formas atuais de corrupção entre políticos e setores econômicos que não são percebidas pela sociedade. Uma delas, na perspectiva de Pacífico, é um suposto mecanismo de desvalorizar empresas públicas para que elas possam ser compradas a baixo custo por grupos empresariais.
— O empresariado, e eu conheço essas pessoas, eu estou no meio delas, eu convivo com essas pessoas há 20 e poucos anos. Qual é o grande objetivo dessas pessoas? É difamar o Estado para comprar o Estado barato. O que é isso? Qual é uma das maiores formas de corrupção que as pessoas não percebem? É você comprar ativos públicos desvalorizados. Pega uma companhia de água, de eletricidade, desvaloriza ela e compra. É uma forma de corrupção, porque esse dinheiro deixa de ir para o Estado.
Carta pública
O empresário faz parte de um grupo de 250 milionários e bilionários que assinaram uma carta pública mundial em defesa do aumento da tributação dos super-ricos. O documento foi entregue pelos integrantes do movimento Proud to pay more (Orgulho de pagar mais, em português) aos líderes mundiais e executivos de negócios durante o Fórum Econômico Mundial, em Davos, na Suíça.
Pacífico diz que é preciso mudar a mentalidade sobre a acumulação de riqueza para melhorar o debate sobre o assunto:
— A gente vive numa sociedade em que glamouriza a acumulação, a individualidade e o egocentrismo. É muito louco isso. E a gente fala assim: "Nossa, parabéns, esse cara é muito rico". Mas o cara ser rico não quer dizer nada. Às vezes quer dizer só que o cara é mais egoísta. Às vezes só quer dizer que o cara roubou. Às vezes só quer dizer que o cara explora pessoas. Muitas vezes são pessoas que são menos, muito menos humanas, que estão querendo acumular e explorar. Então, eu acho que a gente teria que fazer um reset do mundo e a gente passar a valorizar coisas legais. Valorizar a compaixão, valorizar as pessoas que ajudam as outras — finalizou.
Quem é João Paulo Pacífico
João Paulo Pacífico fundou a GaiaSec, uma securitizadora imobiliária, em 2009. Depois, abriu a GaiaServ, empresa que faz gestão de créditos. Com o passar dos anos, vários outros braços do grupo surgiram, como a Gaia Esportes, Gaia Agro e Gaia Cred.
Em 2014, o grupo montou a Gaia+, uma ONG focada na infância e nos educadores. O trabalho é voltado para crianças em situação de vulnerabilidade por meio da assistência social, dos esportes e da cultura.
A Gaia foi dividida em duas partes: uma composta por empresas de investimentos de impacto (Gaia Impacto), e a outra de investimentos tradicionais (Planeta). Pacífico vendeu a parte tradicional em março de 2022. Ele ficou com o braço de impacto social do grupo.
A Gaia investe em projetos sociais de agricultura sustentável, moradia digna, geração de renda, energias renováveis e educação. O grupo colabora com as cooperativas do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST) e levou as cooperativas para o mercado financeiro por meio de um Certificado de Recebíveis do Agronegócio (CRA ) emitido pelo grupo.
Pacífico, que se autodenomina ativista, também integra o movimento socioambiental e é membro do Conselho Fiscal do Greenpeace Brasil.