Cercados por juro alto, mercado externo com apetite limitado e acomodação após o pico da retomada, os três principais pilares da economia mantêm movimentos diferentes no acumulado deste ano no RS. O setor de serviços segue com o maior avanço, enquanto comércio intensifica a perda de tração e a indústria permanece no vermelho em meio a oscilações.
Volta a patamares de normalidade, freio no consumo e crédito caro e restrito são alguns dos ingredientes que formam o cenário, segundo especialistas. Para os próximos meses, projetam desaceleração rumo à estabilidade da atividade em um ambiente ainda marcado pelos efeitos da Selic elevada.
Motor da economia no país, com destaque em negócios, empregos e atividade, o setor de serviços mantém a liderança. De janeiro a maio, anota alta de 7,5% no volume de serviços prestados, após novo avanço em maio. Transportes e serviços de informação e comunicação estão na ponta entre os segmentos com maior salto nos cinco primeiros meses de 2023.
Economista da Federação do Comércio de Bens e de Serviços do Estado (Fecomércio-RS), Giovana Menegotto diz que, além da resiliência do setor de serviços, que segue retomando participação após choque da pandemia, o efeito do agronegócio ajuda o setor. Isso porque o escoamento da safra ajuda a movimentar o ramo de transportes:
— Apesar de a gente ter sofrido com estiagem neste ano, ela foi menor na comparação com o ano passado, e isso ajuda a explicar esse diferencial positivo no setor.
Mesmo com alta mais expressiva entre os principais ramos da economia, o setor de serviços segue com movimento de desaceleração no acumulado do ano. Giovana diz que esse movimento é esperado diante da acomodação após pico observado na saída da pandemia.
O comércio segue no azul, mas mostra perda de fôlego mais acentuada nos últimos meses. Em maio, o volume de vendas do varejo recuou 1,6% no Estado — queda em patamar acima da média nacional. Com a atualização, o setor acumula agora alta de 1,9% no ano, variação positiva abaixo da observada em meses anteriores. Combustíveis e lubrificantes e eletrodomésticos apresentaram os maiores crescimentos no ano no comércio.
— Isso está mostrando um enfraquecimento do comércio, o que seria esperado diante desse contexto de juro alto, famílias bastante endividadas, com níveis elevados de inadimplência, e uma confiança muito limitada para consumir, com clientes muito cautelosos — explica Giovana.
Impacto
A indústria segue com o pior resultado entre os setores, amargando recuo de 6,4% na produção física no acumulado do ano. Produtos derivados de petróleo e cadeias ligadas à metalurgia se destacam nessa queda. O economista-chefe da Federação das Indústrias do Estado (Fiergs), Giovani Baggio, diz que o resultado do acumulado do ano ainda sofre o peso da queda expressiva observada no primeiro trimestre, puxada por alguns fatores, como a retração no setor de derivados de petróleo em meio à parada na Refinaria Alberto Pasqualini (Refap), em Canoas.
Baggio afirma que o setor apresentou esboço de retomada em abril e maio diante de cenário menos incerto na economia e avanço em pautas econômicas, mas que esse início de tração foi insuficiente para reverter a perda dos primeiros meses do ano:
— Além do fator conjuntural interno com juros elevados, incerteza e baixa confiança empresarial, o mercado externo não está ajudando. A desaceleração da economia mundial tem prejudicado e impactado as nossas exportações.
Divulgado na semana passada, o resultado do Índice de Desempenho Industrial (IDI-RS), da Fiergs, corrobora o movimento exposto pela pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatistica (IBGE) e a análise de Baggio.
O indicador — que leva em conta uma série de variáveis, como faturamento, utilização da capacidade instalada e emprego — registrou alta de 2% em maio, mas acumula queda de 2,3% ante igual período do ano passado.
Ambiente de arrefecimento
Ely José de Mattos , professor da Escola de Negócios e pesquisador do laboratório PUCRS Data Social, reforça que o juro elevado segue ancorando a indústria, que costuma recuperar em ritmo menos acelerado ante os demais setores:
— Hoje, a gente tem um cenário que está penalizando mais a indústria. Tem uma conjuntura de crédito caro, taxa de juro muito alta, e agora que estamos começando a nos organizar do ponto de vista de cadeia global de produção de suprimentos. Claro que serviços e comércio acabam respondendo mais rapidamente. A indústria tem um ritmo mais lento.
Mattos afirma que serviços e comércios, embora mostrem resiliência, devem seguir com crescimento moderado nos próximos meses. De maneira geral, o professor projeta um segundo semestre marcado por arrefecimento na atividade econômica como um todo diante dos efeitos prolongados do aperto monetário e da falta de apetite da economia internacional .
A economista da Fecomércio Giovana Menegotto também estima ambiente marcado por desaceleração. Nos serviços, ocorre uma acomodação natural após recuperar a maior parte das perdas. Já no comércio, renda prejudicada segue travando o avanço do consumo.
O economista-chefe da Fiergs, Giovani Baggio, projeta que a produção industrial dificilmente fechará o ano no positivo após o tombo registrado no primeiro trimestre. No máximo, encerra o ano no zero a zero, segundo o especialista. Baggio afirma que, mesmo com melhora em alguns indicadores, existe um espaço de tempo até o setor absorver esses avanços:
— Por mais que a gente tenha perspectivas melhores, com possível volta da confiança dos empresários diante de alguns sinais positivos, boa parte dessas medidas, como queda na Selic e aprovação da reforma tributária, são fatores que não influenciam no curtíssimo prazo.