Em um contexto de crescimento lento, ancorado por inflação e juro alto, o número de empresas com dívidas atrasadas voltou a aumentar no Rio Grande do Sul. Em março, o total de CNPJs inadimplentes subiu para 361.641 no Estado – maior volume desde setembro de 2021, quando ficou em 386.575. Os dados são da Serasa Experian. Efeito na esteira do aumento no número de família com contas em atraso, juro elevado e estagnação da economia ajudam a compor esse cenário, segundo especialistas.
O economista Luiz Rabi, da Serasa Experian, afirma que o aumento da inadimplência entre as empresas, tanto no país quanto no Rio Grande do Sul, ocorre no embalo de um cenário econômico engasgado. Além da inflação elevada e do aumento no número de clientes com dificuldade para pagar dívidas em dia, o juro alto dificulta o acerto de contas das empresas. Isso ocorre porque o aumento da taxa de juro encarece capital de giro e as taxas que os bancos cobram em operações, segundo o especialista:
— Ou seja, a despesa financeira das empresas aumenta. Outro fator é o quadro de estagnação da economia. Porque, se de um lado a despesa está aumentando, a receita não avança pela falta de tração econômica.
A Serasa não divulgou o recorte das empresas inadimplentes por setores no âmbito no Estado. Rabi afirma que, no geral, os segmentos de serviços e comércio são os mais afetados por esse problema no momento. Em aspectos gerais, a maior parte das dívidas não é no âmbito bancário, mas sim de fornecedores, segundo Rabi. O especialista afirma que isso mostra o impacto na inadimplência entre as empresas de setores diferentes, como, por exemplo, situações onde o varejo deve para o atacado.
O professor Marcos Lélis, da Escola de Gestão e Negócios da Unisinos, salienta, além da curva de alta do juro nos últimos anos, o risco de crédito como um dos fatores que impulsionam o número de empresas inadimplentes:
— Tem tanto uma subida de juro, quanto um aumento do risco do crédito. A gente está vendo um conjunto de grandes lojas do varejo com problema de caixa. E elas estavam alavancadas no mercado financeiro. Então, existe um problema de risco de crédito.
A economista-chefe da Fecomércio-RS, Patrícia Palermo, afirma que a dificuldade de pagar dívidas afeta com maior intensidade os negócios de menor porte, grupo que representa boa parte das empresas no país.
— Sempre que existe uma situação mais complicada, micro e pequenas empresas vão ser mais afetadas em tese, porque são mais frágeis do ponto de vista econômico-financeiro. (...) Como esse tipo de empresa existe em maior quantidade, o número de empresas em inadimplência tende a subir mais significativamente.
Os dados do levantamento da Serasa corroboram a análise de Patrícia. No Estado e no país, as micro e pequenas empresas são cerca de 89% do total de negócios em inadimplência.
Mesmo em elevação nos últimos meses, o total de empresas inadimplentes no Estado em março apresenta elevação pequena, de cerca de 2%, ante o mesmo mês do ano passado (veja mais abaixo). A comparação entre os dois períodos mostra acréscimo de 6,8 mil negócios afetados. Na comparação com a média do Brasil nos últimos meses, o Estado mostra resultado melhor, com oscilações entre quedas e altas no indicador, enquanto o país engatou período recente marcado por sequências de elevação.
A Serasa informou que não aprofunda questões específicas do Estado, mas o economista da empresa afirma que alguns fatores, como a força do agronegócio e das exportações, podem influenciar no cenário menos prejudicado no Estado ante o país.
Já a economista-chefe da Fecomércio não enxerga fatores conjunturais que expliquem diferença acentuada entre os dados do Rio Grande do Sul e da média brasileira na série histórica, com destaque para o segundo semestre de 2021.
Futuro
O economista da Serasa Experian estima certa estabilidade no número de empresas inadimplentes no país na segunda metade do ano em caso de alívio das pressões atuais na economia:
— A gente está observando a inflação ceder, provavelmente o juro vai começar a cair no segundo semestre e isso favorece o crescimento econômico. Os dados de emprego formal estão melhorando. Se continuar nessa direção que está se formando, a tendência é de estabilização na virada do segundo para o terceiro trimestre.
Segundo Rabi, queda no indicador depende de uma melhora mais consistente nesses indicadores econômicos no futuro, cenário que pode ocorrer entre o fim do ano e 2024, conforme o economista.
O professor Marcos Lélis afirma que a tendência de juro em patamar elevado até o final do ano, mesmo com início de cortes, deve seguir pressionando a inadimplência das empresas, impedindo cenário mais otimista de reversão nesse movimento.
— A gente teria de começar a ver sinalização de queda no juro e uma certa estabilidade no risco de crédito. E não estamos vendo isso — pontua.