O fechamento de mais uma temporada de balanços financeiros traduziu em números o momento de retomada vivido pela maior parte das companhias do Rio Grande do Sul em 2021. É que a soma das receitas líquidas das 15 maiores empresas de capital aberto do Estado atingiu R$ 36,2 bilhões no terceiro trimestre deste ano – alta de 53,2% sobre o faturamento de igual período em 2020.
Das gaúchas com ações negociadas na bolsa brasileira, a B3, 12 lucraram acima do ano passado. Apenas duas (Josapar e Quero-Quero) ficaram abaixo do patamar anterior e, somente uma, a CEEE-D, atuou no campo negativo. Neste caso, o prejuízo de R$ 410,3 milhões é justificado pela recente troca de comando após a privatização e, por consequência, o curto espaço de tempo para que a nova controladora, a Equatorial, imprimisse sua marca na gestão.
Já na esfera positiva, a Gerdau, por exemplo, experimentou crescimento trimestral histórico. Sozinha, após turbinar os lucros em 610%, faturou R$ 21,3 bilhões nos últimos três meses. O resultado, para se ter uma ideia, supera em R$ 6,5 bilhões o montante apurado por todas as demais empresas gaúchas listadas juntas (R$ 14,8 bilhões).
Os motivos para o desempenho? Uma combinação entre câmbio favorável, preços internacionais do aço e aquecimento das demandas externa e interna, responde Valter Bianchi Filho, sócio fundador da Fundamenta Investimentos.
O analista de investimentos da Geral Asset Lucas Oliveira lembra também que as operações norte-americanas no mercado de óleo e gás e o pacote de incentivos do governo dos Estados Unidos aos investimentos em infraestrutura unem-se a dinâmica doméstica — ainda favorecida pelos juros atrativos na construção civil e moldam o cenário ideal para os avanços da siderúrgica gaúcha.
Bianchi, por sua vez, explica que os mesmos elementos — dólar e preço das commodities — servem para catapultar outros demonstrativos de empresas, como SLC Agrícola, Planatlântica Siderúrgica e Celulose Irani, por exemplo:
"O resultado extraordinário da Gerdau é fruto de algo curioso, isto é, preços das commodities (em dólar) elevados no momento em que o câmbio também está. É algo raro"
VALTER BIANCHI FILHO
Sócio fundador da Fundamenta Investimentos
— O resultado extraordinário da Gerdau é fruto de algo curioso, isto é, preços das commodities (em dólar) elevados no momento em que o câmbio também está. É algo raro — comenta.
Efeito Agro
Na outra ponta da economia, no setor primário, câmbio e demanda norteiam as performances ligadas direta ou indiretamente ao agronegócio. É o caso da Randon, fabricante de carrocerias para caminhões, cujas receitas subiram 64,1% entre o terceiro trimestre de 2020 e o de 2021 – passando de R$ 1,5 bilhão para R$ 2,5 bilhões.
Diferentemente, a vizinha de Caxias do Sul, a indústria de ônibus Marcopolo, em igual intervalo, exibe redução de 9,4% nas receitas líquidas — de R$ 836,5 milhões para R$ 757,6 milhões. É que, apesar de ambas atuarem no polo metalmecânico, a Randon, explica Bianchi, captura muito mais os efeitos correlatos do aquecimento do setor agrícola. Já a Marcopolo, em razão das restrições impostas pela pandemia, sofre de modo ativo os solavancos da retração na indústria do turismo.
— Há dependência entre o agro e o volume de caminhões. No Brasil, apesar da pandemia, a comida continuou circulando, e as mercadorias, abastecendo os mercados. O setor não parou, ao contrário do que aconteceu com o transporte de passageiros — pontua.
Lógica de consumo
Nas companhias gaúchas orientadas pela lógica do consumo, menos influenciadas por fatores externos, a pandemia gerou grandes prejuízos. Agora, essas mesmas empresas tendem a sofrer os efeitos futuros provocados pelos avanços da inflação e dos juros — combinação que, ao lado do desemprego, restringe o poder de compra no mercado interno.
Por isso, o terceiro trimestre de 2021 é considerado pelos analistas como uma espécie de alento ao setor. A Renner é um dos exemplos. Depois de registrar prejuízo líquido de R$ 82,9 milhões no mesmo período do ano passado, reverteu o quadro e lucrou R$ 171,9 milhões.
O analista de investimentos da Geral Asset Lucas Oliveira avalia que os números estão em linha com a expectativa de melhora gradual para o segmento. Parte da performance, todavia, está associada com a retomada dos shoppings, onde estão 98% das lojas da rede. Além disso, como saldo dos dias mais drásticos de pandemia, 12% do atual faturamento vêm das crescentes vendas digitais.
— A empresa captou R$ 4 bilhões no mercado no trimestre e possui caixa confortável para investimentos e aquisições dentro do plano de expansão de lojas e de construção de um novo centro de distribuição, focado na integração do varejo físico com o digital — diz.
A empresa captou R$ 4 bilhões no mercado no trimestre e possui caixa confortável para investimentos e aquisições dentro do plano de expansão de lojas e de construção de um novo centro de distribuição, focado na integração do varejo físico com o digital
LUCAS OLIVEIRA
analista de investimentos da Geral Asset
Para Valter Bianchi Filho, a estratégia da Renner ilustra que “os mais fortes saem melhores das crises”. Com fôlego extra e acesso a capital, é possível “suportar tempestades” mais longas, diferentemente, do que acontece com empresas menores em que a única alternativa, por vezes, é “abandonar o barco”, diz.
A máxima é válida para a Panvel. No terceiro trimestre, a rede de farmácias chegou a 500 lojas físicas, considerado marco histórico na empresa. Com crescimento de receitas e lucro, em razão de maior circulação de clientes, a companhia também aprendeu a lidar com os novos tempos. Hoje, explica Oliveira, as vendas digitais já somam 16% das receitas, quando, na comparação, o principal concorrente sequer alcança os dois dígitos.
— A Panvel está disparada nesse quesito. Em linha com a expansão digital, planeja um novo centro de distribuição em São José dos Pinhais, que se junta ao de Eldorado do Sul e aos outros nove que possui espalhados pelo Estado — afirma.