Com a reabertura da economia, a renda do trabalho ensaia recuperação no Rio Grande do Sul, mas ainda está 6,5%, em média, abaixo do nível habitual. Embora gere dose de alívio, o resultado sinaliza que o Estado ainda tem de percorrer um longo caminho para recompor todos os prejuízos da crise do coronavírus, pontuam especialistas.
Para calcular o percentual, GZH comparou dois indicadores que aparecem na Pnad Covid-19, pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), com dados desde maio.
O primeiro é batizado como rendimento real efetivamente recebido. Representa a quantia que, de fato, foi para o bolso dos trabalhadores e empresários graças a atividades profissionais – com ou sem carteira assinada. Em novembro, mês mais recente com estatísticas disponíveis, esse valor foi de R$ 2.413, em média, no Rio Grande do Sul.
O segundo indicador é o rendimento real normalmente recebido. Trata-se do salário que os profissionais costumavam ganhar com o trabalho. É a quantia usual que iria para o bolso dos ocupados. Esse valor foi estimado em R$ 2.581.
Moral da história: os trabalhadores gaúchos receberam R$ 168 a menos, em média, do que ganhariam, em tese, no penúltimo mês de 2020. Vem daí a baixa de 6,5%.
– As flexibilizações de atividades ficaram maiores ao longo dos meses. Mas ainda vemos setores importantes da economia, como serviços, que contratam muita gente, sofrendo, seja pelas limitações ou pelas mudanças de hábitos dos consumidores. Não chega a surpreender o fato de a renda não ter alcançado o nível normal até o momento. Afinal de contas, ainda estamos na pandemia – explica o economista Guilherme Stein, professor da Unisinos.
Apesar de seguir abaixo do patamar habitual, o rendimento efetivamente recebido em novembro foi o maior desde o começo da crise. Em maio, primeiro mês da pesquisa do IBGE, esse valor havia sido estimado em R$ 2.102. Ou seja, a quantia aumentou em R$ 311 (ou 14,8%), até chegar a R$ 2.413 no penúltimo mês do ano passado.
Na visão da economista Izete Pengo Bagolin, professora da Escola de Negócios da PUCRS, parte dos trabalhadores que perderam o emprego no começo da pandemia pode ter migrado para outras atividades nos meses seguintes. Ou seja, na procura de retomada da renda, essa parcela pode ter buscado nichos com demanda mais aquecida durante a crise. Por exemplo, o de serviços de reparos em residências.
– No primeiro momento, trabalhadores ficaram afastados de suas atividades. Houve contração mais significativa da economia. Depois, as famílias podem ter se adaptado ao novo contexto. Já para quem não perdeu o emprego, quando as atividades são retomadas, existe a possibilidade de trabalhar por mais tempo e, assim, ganhar mais – frisa a professora.
Na média brasileira, o cenário é semelhante. Em novembro, o rendimento efetivamente recebido foi estimado em R$ 2.205 no país, aponta o IBGE. A cifra representa alta de 12,8% em relação a maio (R$ 1.954). Contudo, a marca está 5,5% abaixo do nível normalmente recebido, em média, pelos trabalhadores e empresários: R$ 2.334. Isso quer dizer que, a exemplo do caso gaúcho, a recuperação dos salários no Brasil ainda é parcial.
Além de ficar acima da média nacional, a renda recebida no Rio Grande do Sul foi a quarta maior do país em novembro. À frente dos gaúchos, estão Rio de Janeiro (R$ 2.625), São Paulo (R$ 2.694) e Distrito Federal (R$ 3.745), que lidera o ranking.
O Paraná, na quinta colocação, está praticamente colado no Rio Grande do Sul. Em novembro, a renda recebida pelos paranaenses foi, em média, de R$ 2.412. Ou seja, ficou R$ 1 abaixo da gaúcha (R$ 2.413). O Maranhão tem o rendimento médio mais enxuto do país: R$ 1.403. Alagoas responde pela segunda menor marca (R$ 1.532).
Cenário de reação, mas com riscos
O cenário para a economia é de melhora em 2021, mas riscos permanecem no horizonte e podem dificultar a recuperação do trabalho e da renda, ponderam especialistas. Neste momento, há grande expectativa pelo início da vacinação contra a covid-19 no país. O cronograma de imunização é considerado crucial para frear os casos de coronavírus e, assim, permitir a reação gradual nos negócios.
– 2021 deve ser um ano de readaptação, de transição. Com a volta às aulas e o retorno de outras atividades, possivelmente teremos recontratações. Mas a tendência, pelo menos agora, é de uma recuperação lenta, tanto no mercado formal quanto no informal – ressalta a economista Izete Pengo Bagolin, professora da Escola de Negócios da PUCRS.
Além do coronavírus, o fim do auxílio emergencial pode conter a retomada dos negócios na largada do ano, indica o economista Guilherme Stein. O professor da Unisinos lembra que o benefício concedido pelo governo federal serviu para estimular a demanda por bens e serviços em 2020.
Contudo, diante das dificuldades nas contas públicas, o auxílio foi encerrado na virada do ano. Por ora, não há sinalização de retorno do programa.
– Com o impacto da vacina, podemos ter boas notícias. Existem pontos de otimismo para o ano, mas também há outros de preocupação – sublinha Stein.
Em novembro, o número de desempregados foi estimado em 561 mil no Rio Grande do Sul, indica a Pnad Covid-19. Representa leve baixa de 0,7% frente a outubro (565 mil).
No começo da pesquisa do IBGE, em maio, o contingente era menor, de 480 mil. Uma pessoa é considerada desempregada quando está sem trabalho, formal ou informal, e continua à procura de novas oportunidades.