A economista Vanessa Sulzbach e a psicóloga Carolina Martins debateram a situação da mulher no mercado de trabalho no Painel Atualidade, na Rádio Gaúcha, nesta quarta-feira (16). Os desafios impostos pela pandemia de coronavírus, a importância do posicionamento na busca por uma vaga e o cenário pós-crise dominaram a conversa com as especialistas.
Nas quartas-feiras, o quadro dentro do programa Gaúcha Atualidade ouve representantes de setores econômicos para provocar o debate e estimular a busca por alternativas para a diminuição do impacto negativo causado pela pandemia.
O que é o Painel Atualidade?
Trata-se de um novo quadro semanal dentro do Gaúcha Atualidade, que pretende provocar o debate e estimular a busca por alternativas que ajudem a minimizar o impacto negativo da crise do coronavírus na economia do Rio Grande do Sul. A iniciativa faz parte do projeto de Jornalismo de Soluções proposto pelo Grupo RBS, que busca o debate para enfrentar e resolver os problemas diagnosticados.
Vanessa Sulzbach atua no Departamento de Economia e Estatística (DEE), da Secretaria de Planejamento, Orçamento e Gestão do Estado, e estuda economia de gênero. Carolina Martins têm mais de 1 milhão de seguidores no Linkedin e é especialista em recolocação por meio da plataforma.
Dificuldade de se reinserir no mercado de trabalho em razão da idade
— Em relação à idade, tanto homens quanto mulheres sofrem dificuldade de se reinserir no mercado de trabalho quando perdem o emprego e já passam dos 45 anos. Já começa a ficar complicado por alguns fatores. Os principais são em relação à questão salarial. Como a gente tem um desequilíbrio muito grande entre o número de vagas abertas e a quantidade de profissionais disponíveis, por conta da lei da oferta e da demanda, o salário despenca. Esses profissionais mais experientes têm uma faixa, uma margem salarial maior. Então, eles são prejudicados por questão de equiparação salarial. Todos os profissionais mais jovens, que têm menos tempo de experiência, aceitam salários menores e esses profissionais mais seniores tem essa dificuldade. Uma outra dificuldade que os profissionais com faixas salariais maiores e idade mais avançada enfrentam é questão de adaptação às novas tecnologias. Principalmente agora, a pandemia forçou uma aceleração tecnológica muito grande — afirmou Carolina.
— Essa questão de idade tende a afetar tanto mulheres quanto homens. A gente viu um efeito maior sobre as mulheres. Os trabalhos acadêmicos têm mostrado que, na verdade, o efeito sobre as mulheres justamente para se posicionar no mercado de trabalho é maior nas mulheres mais jovens, que têm potencial de terem filhos e por isso podem tirar licença maternidade. Muitas vezes, as empresas preferem e escolhem homens para não terem esse “prejuízo”. Em relação às mulheres com mais idade, a gente não vê esse tipo de discriminação justamente porque “bom, com mais idade, elas podem ter criado seus filhos e tudo mais". Então, o que a academia tem mostrado é que, pela idade, de fato é a questão salarial, porque é mais difícil repor um salário mais alto. Isso acontece para homens e para mulheres. O pênalti mesmo que se fala na literatura para as mulheres é em relação aos filhos mesmo — disse Vanessa.
Acesso às creches na retomada
— Por isso que a acessibilidade de creches é tão fundamental para as mulheres voltarem a se inserir no mercado de trabalho. Uma das maneiras de talvez retomar a participação de mulheres no futuro próximo, no pós-pandemia, é justamente avaliar as políticas de acessibilidade a creches, principalmente as públicas. Talvez mudar o foco delas. Hoje, a gente tem creches onde quem recebe vagas é o primeiro da lista. Talvez um próximo foco das políticas de disponibilidade de creches seja “vamos focar naquelas que mais sofreram com a pandemia”, que são basicamente as de menor renda — projetou Vanessa.
Maior igualdade
— O que a gente tem de discutir, mais do que possíveis discriminações e que podem acontecer no mercado de trabalho, é exatamente por que a mulher tem dificuldades, tem diferença em relação ao homem quando vai se posicionar, principalmente em cargos de gerência. Ela tem realmente mais, talvez naturalmente, uma posição maior de cuidado com os filhos. Quando a gente avalia as mulheres, a gente vê que elas se educaram mais, sem filhos elas conseguem competir com os homens. Chega um momento da vida onde ela faz uma escolha entre talvez empregos que são mais family friendly, que seriam mais flexíveis em horários, com licença maternidade mais extensa, ao invés de escolher posições que dão mais retorno monetário. Toda essa discussão na sociedade deve ser feita. Será que as mulheres têm de ficar com toda essa responsabilidade sobre filhos e família ou será que a gente tem de distribuir mais essas responsabilidades, pensar em licença paternidade, algo que pode ajudar as mulheres a retomar sua posição no mercado de trabalho ao longo dos próximos períodos? — explica Vanessa.
Mudança de posicionamento na busca por vagas
— O primeiro passo é a gente entender que está atravessando um momento delicado, mas que nós sairemos desse momento. Não é uma questão permanente. O que as mulheres precisam fazer é um trabalho de reposicionamento. Hoje, com a alta competitividade, não basta mais nós sermos boas. A gente precisa mostrar que somos boas. Então, é necessário que as mulheres resignifiquem a forma de buscar trabalho. Isso se aplica aos homens também. Como a pandemia acelerou esse processo de mudança tecnológica, a forma de procurar emprego mudou muito. Antes, o que a gente tinha como padrão? Imprimir o currículo, botar o currículo em um papel pardo e sair entregando presencialmente nas empresas. Hoje, isso já não acontece mais, a não ser em cidades pequenas, em empresas que têm cultura mais familiar. A gente faz a maior parte das nossas atividades de forma online. Então, procurar emprego também virou online. A gente vê que as empresas que mais sofreram com os impactos da crise foram empresas pequenas, empresas médias talvez, porque elas tinham questões financeiras pendentes. Quem sobrou nesse momento, quem tem vaga aberta, são as empresas maiores, aquelas mais estáveis economicamente. Essas empresas mudaram completamente a forma de buscar colaborador por conta do tempo que se perde no processo seletivo. (...) Hoje, a maior parte das grandes empresas tem conduzido o processo seletivo através do Linkedin, porque essa é a nova mudança, a nova era do processo seletivo. Então, as pessoas precisam se adaptar. No Linkedin, eu não preciso divulgar uma vaga, eu posso procurar um profissional. Esse processo otimiza o tempo. Investir em um bom posicionamento, ter um bom preenchimento do perfil, ressaltando teus pontos fortes, quais foram as empresas por onde você passou, quais foram as suas responsabilidades, seus resultados e mais do que isso, se vender como profissional. O Linkedin tem um perfil muito forte na produção de conteúdo. Nós mulheres precisamos nos posicionar para que a gente saia desse cenário. Escrever seus conteúdos, dizendo as suas realizações profissionais, mostrando que, além de termos esse papel muito importante na família, nós não somos só isso. Temos muito além disso para oferecer para as empresas — destaca Carolina.
Busca por conhecimento e aperfeiçoamento
— No Linkedin, nós temos grandes influenciadoras mulheres que abraçaram com ainda mais força essa causa durante a pandemia, principalmente por conta desse dado histórico, que a gente tem só 46% de mulheres ativas no mercado. Então, existem sim muitos conteúdos disponíveis no Linkedin. Outra rede social que tem sido bastante utilizada hoje para esse tipo de divulgação é o Instagram. Eu indico muito para buscarem tanto no blog quanto no Instagram, que é o Ela na Vaga. Dentro desse blog, existem, além de dicas para mulheres conseguirem se posicionar estrategicamente no mercado, todas essas pesquisas com apanhado histórico do que aconteceu antes, por que aconteceu, qual o padrão de mudança positiva que estávamos vivendo. Elas explicam bastante também sobre essa ruptura, o que aconteceu neste momento para as mulheres perderem o emprego e o que essas mulheres fragilizadas podem fazer para se reinserir — indica Carolina.
— O Linkedin é um bom local para as mulheres ficarem atentas, não só às vagas, mas também aos conteúdos sobre essa questão de participação e de como se posicionar no mercado de trabalho. É um momento em que as mulheres também podem se reinventar. No final da pandemia, a gente não vai ter uma economia igual à que a gente conhecia até então. Até o padrão de consumo está mudando. As pessoas não estavam tão acostumadas a comprar online, por exemplo. Hoje, já tem muitas compras online, as pessoas já estão se acostumando. Existem muitas compras pelo WhatsApp, pelo próprio Instagram, pequenos negócios vendendo bastante pelo Instagram. (...) As mulheres podem se reinventar sim e achar um espaço, talvez não formal nesse primeiro momento, mas até nessa questão da economia informal, porque a gente vai ver num pós-pandemia uma estrutura de consumo diferente do que a gente via até então. Acho que as mulheres podem se aproveitar disso e elas são muito boas nisso — pontuou Vanessa.