A Comissão Europeia quer que as empresas de mídia social assinem um termo voluntário de conduta que dê mais acesso a suas medidas contra desinformação durante a pandemia de coronavírus.
A proposta, apresentada pela comissária de Justiça, Vera Jourová, e pelo alto comissário de Relações Exteriores, Josep Borrell, prevê relatórios mensais sobre medidas para prevenir a disseminação de notícias falsas, aumentar a difusão de conteúdo, melhorar a conscientização dos usuários e limitar a publicidade ligada a posts com fake news. A Comissão também afirma que as empresas precisam ter mais transparência.
— Nós só sabemos o que eles contam. Eles precisam se abrir, dar mais provas de como estão funcionando e permitir que o público entenda suas ações — disse Jourová.
Uma das principais preocupações é com a falta de visibilidade do Facebook, dono do WhatsApp, sobre o que está fazendo para impedir a disseminação de fake news nessa rede. A comissária propõe que as empresas compartilhem dados com pesquisadores e aumentem a cooperação com organizações de checagem de informação, "em todos os Estados-Membros, para todos os idiomas".
A União Europeia (UE) também criará um centro de checagem de informação e de pesquisa próprio, que trabalhará em rede com os dos Estados-membros. Além disso, segundo a comissária de Justiça, a UE vai usar o programa de reconstrução pós-crise para "fortalecer o apoio à mídia e aos jornalistas independentes" no bloco e fora dele:
— É preciso garantir que os jornalistas possam trabalhar com segurança e independência — afirmou.
Jourová afirmou aprovar o modelo adotado pelo Twitter, de não retirar simplesmente posts do ar, mas marcá-los com avisos de que contêm afirmações incorretas e direcionar os usuários para informação confiável. Segundo ela, é preciso manter a liberdade de expressão, mas impedir que informações falsas coloquem em risco a saúde e a vida das pessoas. A comissária disse que a participação dos grupos de checagem e pesquisadores é importante para evitar que "as próprias plataformas sejam os árbitros da verdade".
Na mira da Comissão estão também anúncios ligados a posts com desinformação e o uso das redes sociais para vender produtos com preços extorsivos, ineficazes ou potencialmente perigosos. Jourová disse que nos últimos meses já foram removidos 8 milhões de anúncios enganosos.
A Comissão Europeia disse que a rede social de compartilhamento de vídeo TikTok assinou o acordo, que já teve adesão de Facebook, Google, Twitter e Mozilla. O Poder Executivo da UE está negociando com o Whatsapp formas de evitar a disseminação de fake news pela rede.
Em 2018, a Comissão Europeia já havia publicado um código de conduta em que pediam às empresas transparência em relação a propaganda política e a como remover contas falsas impulsionadas por robôs. O dono do Facebook, Mark Zuckerberg foi convocado no mesmo ano a prestar depoimento ao Parlamento Europeu sobre o uso indevido de dados de 2,7 milhões de europeus pela consultoria Cambridge Analytica.
O bloco considera que medidas mais fortes são necessárias, porque tem havido pouca ação das mídias sociais para impedir a circulação de fake news sobre a tecnologia de celular 5G, falsas curas para a covid-19 e mentiras sobre a criação do coronavírus como arma biológica. Embora as regras de conduta anunciadas hoje também sejam de adesão voluntária, a UE está elaborando uma nova regulação que vai atingir as grandes empresas de tecnologia, como o Plano de Ação para a Democracia Europeia e a Lei de Serviços Digitais.
Borrell afirmou que, além de proteger o público de desinformações, é preciso "expor os responsáveis".
— No mundo atual de tecnologia, onde os guerreiros usam teclados em vez de espadas, em que campanhas de desinformação são uma arma reconhecida de agentes estatais e não estatais, a União Europeia está aumentando suas atividades e capacidades nesta luta — afirmou.
Segundo os dois comissários, países de fora do bloco, "em particular a Rússia e a China", estão envolvidos em campanhas de desinformação na UE e no mundo. O órgão diz que a força-tarefa do bloco europeu já detectou e expôs 550 narrativas falsas feitas por apoiadores do governo russo.
Os anúncios feitos nesta quarta são mais um passo em uma série de medidas tomadas pela Comissão Europeia nos últimos anos para regular a atuação das gigantes de tecnologia, com investigações sobre concorrência desleal e multas.
Em 2017, o órgão responsável pela concorrência na União Europeia aplicou uma multa de 2,4 bilhões de euros ao Google, por favorecer seu próprio serviço de comparação de preços contra o de rivais menores da Europa. A empresa recorreu.
Em relação ao Facebook, a UE investiga denúncias de empresas rivais e políticos de que o Facebook aproveitou o acesso aos dados de seus usuários para sufocar a concorrência, recompensando parceiros e eliminando adversários, disseram essas pessoas.
No final de maio, os governos de Alemanha, França, Itália, Espanha e Portugal publicaram uma declaração conjunta acusando gigantes de tecnologia de impor padrões e de impedi-los de dar a palavra final sobre aplicativos de rastreamento de casos de coronavírus. As autoridades de assuntos digitais não nomearam empresas, mas Apple e Google, cujos sistemas operacionais rodam em cerca de 99% dos smartphones em todo o mundo, vêm participando do desenvolvimento dos programas de rastreamento.
A crise econômica gerada pela pandemia também reaqueceu as pressões por tributação das chamadas bigtechs. A cobrança é "mais relevante do que nunca", disse em maio o ministro da Economia da França, Bruno Le Maire. Segundo ele, o país implantará a tributação neste ano, mesmo que a OCDE não conclua a proposta na qual está trabalhando.
Le Marie afirmou que faria uma parceria com o ministro das Finanças da Alemanha, Olaf Scholz, para acelerar dois projetos tributários internacionais: o de gigantes digitais e o de imposto mínimo sobre multinacionais. A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) está trabalhando nessas propostas e buscava um acordo global até julho, mas adiou essa meta para outubro por causa da pandemia.
Um tributo sobre transações digitais também foi citado pela Comissão Europeia como uma das formas de financiar a retomada da economia do bloco após a pandemia de coronavírus.