A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) autorizou o repasse de R$ 2,022 bilhões para garantir liquidez a empresas do setor elétrico durante a crise gerada pela pandemia do coronavírus. Os recursos sairão de um fundo de reserva composto por encargos cobrados na conta de luz.
Segundo dados da Câmara Comercializadora de Energia Elétrica (CCEE), o consumo de energia no país caiu 8% na segunda quinzena de março, em comparação ao início do mês. A redução nas vendas afeta a receita das empresas do setor, que têm compromissos contratuais a cumprir.
De acordo com a CCEE, as distribuidoras ficarão com R$ 1,475 bilhão e consumidores do mercado livre, com outros R$ 547 milhões. A decisão da Aneel autoriza ainda a CCEE a fazer novos repasses ao longo do ano, sempre que os fundos estiverem com saldo positivo.
O segmento de distribuição é visto como um dos mais afetados, já que as empresas não conseguem vender todo o volume de energia que se comprometeram a comprar em contratos de longo prazo. Segundo a CCEE, elas hoje compram um volume 17% maior do que podem vender.
A expectativa da entidade é que a sobreoferta chegará a 30% em junho. Pelas regras atuais, elas têm uma margem de erro de apenas 5%. Depois disso, assumem o prejuízo. A liberação dos recursos dos fundos setoriais era uma das medidas em estudo para aliviar o caixa do segmento.
Governo e distribuidoras negociam também um empréstimo nos moldes do fechado durante crise provocada pelos altos preços da energia em 2014. Naquela ocasião, a distribuição tinha menos energia do que o mercado demandava e acabou tendo que comprar no mercado de curto prazo por valores mais altos.
Para resolver o problema, governo e empresas contrataram com um pool de bancos R$ 21,2 bilhões, que foram pagos pelos consumidores em parcelas cobradas na conta de luz dos brasileiros até 2019.
Ainda não há uma estimativa do tamanho do rombo atual. Em seminário virtual promovido pela corretora XP na sexta (3), o presidente da consultoria PSR, Luiz Barroso, falou em R$ 15 bilhões, ele alertou, porém, que se tratava de uma "conta de padeiro", considerando redução de 20% no consumo por três meses.
O mercado avalia que o problema pode ser duradouro, uma vez que a demanda por energia tende a demorar a voltar aos níveis pré-crise caso a retomada da economia seja lenta. Nesse sentido, a consultora Lavínia Holanda, sócia-diretora da Escopo Energia, diz que o cenário atual remete ao vivido no país durante o racionamento de 2001.
Para reduzir os riscos de crise de liquidez no setor, o governo estuda ainda pagar com recursos do Tesouro as contas de luz da população de baixa renda, que está mais vulnerável à perda de rendimentos durante o período de isolamento. A medida reduziria as expectativas de inadimplência.
No fim de março, a Aneel suspendeu por 90 dias a possibilidade de cortes na conta de luz por falta de pagamento. As dívidas podem ser cobradas com outros mecanismos, como inscrição em cadastros negativos de crédito, mas o fornecimento tem que ser mantido.