SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Até dia 4 de março, estrangeiros sacaram R$ 44,8 bilhões da Bolsa de Valores brasileira em 2020. O valor supera o montante retirado em todo o ano de 2019, de R$ 44,5 bilhões, sem contar ofertas de ações (IPOs
e follow-ons).
A saída também supera a retirada de 2008, maior da série histórica da B3. Em valores corrigidos pela a inflação, foram sacados R$ 44,6 bilhões no ano da crise financeira. A velocidade de saída também é recorde, cerca de R$ 1,05 bilhão por pregão, e supera a média diária de 2008.
Considerando IPOs (oferta inicial de ações, na sigla em inglês) e follow-ons (oferta subsequente de ações), o saldo de estrangeiros está negativo em R$ 33,4 bilhões neste ano. Em 2019, considerando essas operações, a saída foi de R$ 4,7 bilhões.
Neste ano, marcado pelo temor de investidores com o impacto econômico do coronavírus, desaceleração da economia global e demora no andamento das reformas administrativa e tributária, estrangeiros retiram dinheiro do Brasil e de demais emergentes.
Nesta sexta, o índice de volatilidade VIX, baseado em operações no mercado financeiro americano, está no maior patamar da história, a 46,88 pontos, acima dos 44 pontos na máxima de 2008, recorde anterior.
Estamos vivendo um momento de aversão a risco muito grande. Com a chegada do vírus na Itália, nos Estados Unidos e na América do Sul, a coisa complica e estrangeiros retiram recursos de emergentes, afirma Étore Sanchez, economista-chefe da Ativa Investimentos.
Segundo o especialista, como o Brasil tem um mercado de grande liquidez e presença de estrangeiros, a saída por aqui é mais forte.
O surto vem se espalhando e por aqui acompanhamos a aversão a risco do mundo inteiro. Somos uma economia emergente e, por isso, se está ruim nas principais Bolsas do mundo, sofremos de maneira mais aguda, afirma Victor Lima, analista da Toro Investimentos
Ele aponta que, como os dois principais parceiros comerciais do Brasil são China e Estados Unidos, economias afetadas pela doença, podemos ter um impacto maior do que pares emergentes. Fora que, o fraco desempenho da economia local não segura o estrangeiro.
Se o PIB [Produto Interno Bruto] de 2019 não tivesse sido tão ruim, a saída não seria tão forte, diz Lima.
A saída de estrangeiros não é só da Bolsa. Segundo dados do Banco Central, o saldo de movimento financeiro no país está negativo em US$ 10,8 bilhões (R$ 50 bilhões) em 2020, pior que aos cinco primeiros meses de 2019.
A Selic na mínima histórica também contribui para a evasão de dólares do país. Isso porque estrangeiros vinham ao país pela vantagem do carry trade, prática de investimento em que o ganho está na diferença do câmbio e do juros. Nela, o investidor toma dinheiro a uma taxa de juros menor em um país, no caso, os EUA, para aplicá-lo em outro, com outra moeda, onde o juro é maior, o Brasil. Com a Selic a 4,25%, essa operação deixa de ser vantajosa e estrangeiros retiram seus recursos, em dólar, do país.
A saída de estrangeiros do país vem desde 2019, a queda da Selic expulsou quem estava interessado no curto prazo e com a expectativa do BC cortar juros no dia 18 acelerou a saída de capital, afirma Paulo Gala, diretor-geral da Fator Administração de Recursos.
A evasão de dólares da Bolsa e de demais investimentos contribui para uma cotação do dólar mais elevada. Na quinta (5), a moeda americana bateu novo recorde nominal, a R$ 4,653. Nesta sexta-feira (6), após novos leilões do BC de swap cambial no valor de US$ 2 bilhões, a moeda caiu 0,4%, a R$ 4,634. O turismo está a R$ 4,81 na venda.
A Bolsa de Valores tem o segundo pregão seguido de forte queda, com recuo de 4%, a 97.996 pontos, menor patamar desde 27 de agosto de 2019.
A queda nesta sessão é pressionada pela Petrobras, cujas ações despencam com a queda internacional do petróleo. As ordinárias (com direito a voto) caem 11%, a R$ 23,89. As preferenciais (sem voto), 10%, a R$ 22,86.
O barril do Brent cai 9,5%, a US$ 45,25 depois que Opep (Organização dos Países Exportadores de Petróleo e Rússia não entraram em acordo sobre cortes mais profundos na produção de petróleo, para manter o patamar do rpeço com a queda na demanda em meio a epidemia de coronavírus.
O risco-país do Brasil medido pelo CDS (Credit Default Swap) de cinco anos, um tipo de contrato que funciona como termômetro da confiança dos investidores em relação a economias, sobe 11%, a 143 pontos, maior patamar desde outubro de 2019, antes da reforma da Previdência ser aprovada no Senado.
Na quinta, o CDS brasileiro subiu 14,4%, a maior alta percentual diária desde o chamado Joesley Day, em 18 de maio de 2017, dia em que veio a público a informação de que Joesley Batista gravara conversa com o então presidente Michel Temer (MDB). Na ocasião, o risco-país teve alta de 29%, para 265 pontos.
Se o CDS sobe, é um sinal de que os investidores temem o futuro financeiro do país; se ele cai, o recado é o inverso: sinaliza aumento da confiança em relação à capacidade de o país saldar suas dívidas.