A flexibilização do registro dos horários de entrada e saída de trabalhadores em empresas é um dos aspectos da lei da Liberdade Econômica que mais gera divergência. De um lado, centrais sindicais apontam que a nova legislação pode abrir brechas para irregularidades envolvendo a jornada. De outro, dirigentes empresariais ressaltam que a medida reduzirá a burocracia para os pequenos e médios negócios.
Pela lei em vigor desde setembro, somente empresas com mais de 20 empregados são obrigadas a fazer a marcação do ponto dos colaboradores em sistema de registro manual, mecânico ou eletrônico. Anteriormente, a exigência era válida para companhias com mais de 10 colaboradores.
Além disso, passou a ser permitida a utilização de um regime de ponto de exceção, que prevê a marcação quando houver ocorrências divergentes com o horário previsto no contrato — caso de horas extras, folgas e atrasos. Essa situação, no entanto, só poderá ocorrer quando estiver prevista em acordo individual escrito, convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho.
O aumento informal da jornada de trabalho, com patrões pedindo para empregados atuarem além do combinado na contratação, e o não pagamento de horas extras são alguns dos problemas que a retirada do ponto pode gerar, na percepção do presidente da Central Única dos Trabalhadores no Rio Grande do Sul (CUT-RS), Claudir Nespolo. O sindicalista vê como perigosa a possibilidade de um acordo individual permitir o ponto de exceção, pois avalia que o trabalhador sozinho não teria condições favoráveis para negociar com a empresa a liberação.
— Esse retrocesso deixa o trabalhador vulnerável perante uma parte minoritária do empresariado que quer tirar vantagem em cima da jornada — diz Nespolo.
Para o presidente da Federação das Câmaras de Dirigentes Lojistas do Rio Grande do Sul (FCDL-RS), Vitor Augusto Koch, é um "devaneio" pensar que o empresário utilizará a modificação da lei para cometer irregularidades. Segundo o dirigente, a nova diretriz diminui custos para as empresas com a manutenção do sistema de ponto e permite que elas percam menos tempo com questões burocráticas. Koch calcula que hoje 80% das 100 mil lojas no Estado possuem até 20 funcionários e poderão se beneficiar da medida.
— Quanto mais simplificar, melhor. O ponto ainda funciona muito de maneira manual. Isso dá trabalho para o funcionário, para o empreendedor e depois para a contabilidade e o departamento de pessoal, que precisam ficar somando as horas trabalhadas — constata Koch.
Atualmente, o pagamento de horas extras é tema frequente nas reclamatórias que chegam ao judiciário, conforme aponta a juíza e presidente da Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho da 4ª Região (Amatra IV), Carolina Gralha. Neste sentido, ela lembra que o registro do ponto é a principal prova utilizada nas ações, tanto por trabalhadores quanto por empresários.
— Quando há o registro documentado dos horários, tenho uma forma de fiscalização. Com a eliminação desse registro, a fiscalização fica prejudicada e isso pode levar ao aumento no número de ações — pondera a juíza.
Apesar das mudanças recentes, a magistrada reforça que empregadores e empregados seguem tendo a obrigação de observar os horários de início, intervalo e término da jornada contratada e que o direito ao pagamento pelas horas extras continua sem qualquer alteração.