O sociólogo e cientista político Demétrio Magnoli desembarca em Porto Alegre para analisar, no 32º Fórum da Liberdade, que começa nesta segunda-feira (8), o impacto das redes sociais no debate democrático. Na entrevista abaixo, Magnoli afirma que o avanço digital incentivou a criação de “bolhas” e dificultou o debate entre opiniões distintas.
Como o senhor pretende abordar o tema redes sociais em sua palestra?
Pelo efeito das redes e do seu uso por políticos e movimentos políticos em meio ao debate democrático. Quando a internet se difundiu, e as redes sociais tiveram peso social maior, acreditou- se que serviriam para ampliar o debate democrático. Hoje, é possível constatar que aconteceu basicamente o inverso. O uso político das redes por partidos e movimentos estreitou o campo do debate democrático. Reduziu o espaço de cruzamento de opiniões.
De que maneira?
Criaram-se bolhas virtuais, utilizadas para a consolidação de posições e lideranças. O debate plural, característica da sociedade democrática desde o advento da imprensa moderna, foi bastante erodido. Pretendo analisar como isso acontece hoje no mundo. Vou pegar alguns exemplos da eleição de Donald Trump nos Estados Unidos, do Brexit e da eleição de Jair Bolsonaro no Brasil para tentar fazer diagnóstico desse mecanismo. O debate acalorado sempre existiu. Faço referência ao fenômeno da falta de cruzamento de posições e da criação de bolhas, estimuladas pelos movimentos e partidos políticos, especialmente os populistas. Quero discutir como o populismo se apropriou desses veículos e usa-os de maneira eficaz para seus fins, o que não é eficaz para a democracia.
O Fórum da Liberdade discute neste ano o quão aberto está o Brasil para reformas. Como o senhor avalia o atual debate sobre o assunto e a condução dessa agenda pelo governo?
Esse é um tema fora da minha mesa (risos). Elegemos um governo populista que fez do discurso antipolítico o seu foco. O governo foi eleito acusando a elite política, a qual diz não pertencer, e instituições democráticas, como o Congresso e o Judiciário, ou o STF (Supremo Tribunal Federal), de serem barreiras contra a vontade popular. Essa postura do governo torna mais difícil seu programa de reformas econômicas. O governo vive entre dois discursos incompatíveis: o antipolítico e o de reformas, que exige participação do Congresso e a confirmação do STF sobre mudanças constitucionais. Os movimentos recentes do mercado financeiro revelam que os donos do dinheiro descobriram essa contradição.
Quais são os maiores desafios que o Brasil precisa superar para crescer?
Se não fizermos uma reforma previdenciária, com capacidade de garantir a estabilidade do sistema, e que não precisa ser exatamente igual à proposta pelo ministro Paulo Guedes (da Economia), o país será engolfado por crise financeira e na economia real. Isso tornaria o governo inoperante ou até acabaria com ele. Temos de aprovar essa reforma. O mercado internacional não nos dá tempo infinito para aprová-la. O capital eleitoral do governo também não é infinito. Temos poucos meses para dar esse passo. Se for dado, existirá respiro grande para outras reformas necessárias, como a tributária, e para investimentos, o que faria o país a voltar a crescer.