O presidente Michel Temer tenta desde o fim de semana contornar uma saia justa criada entre dois de seus subordinados mais atuantes, em decorrência da Operação Carne Fraca. O ministro da Agricultura, Blairo Maggi, criticou "a falta de amparo técnico" na ação da Polícia Federal, que teria gerado erros de interpretação nas escutas dos diálogos dos suspeitos. Ele disse isso no domingo diretamente ao diretor-geral da PF, delegado Leandro Daiello, que rebateu as críticas. Agora, por ordem de Temer, os dois terão de atuar juntos.
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A irritação de Maggi tem motivo: a suspensão temporária das importações de carne brasileira por parte dos chineses e sul-coreanos. O ministro foi ríspido ao condenar uma suposta "espetacularização" da Carne Fraca, o que ampliou o desgaste junto aos mercados consumidores. A mesma cobrança partiu de Temer.
Pressionado, Daiello alertou que ainda há muita investigação por vir. Os interrogados começam a admitir irregularidades. Mais que isso: um fiscal, enquadrado em oito crimes e próximo à aposentadoria, já se ofereceu para fazer delação premiada. Assim, a PF considera que a Carne Fraca será mais uma operação de sucesso.
O risco de um delator já é comentado dentro da bancada ruralista do Congresso, em especial entre parlamentares do PP e PMDB, partidos que dominam há décadas o Ministério da Agricultura. O temor é de uma "Lava-Jato da Carne", com parte da apuração indo para o Supremo Tribunal Federal (STF).
Zero Hora conversou com pessoas que tiveram acesso ao ministro e ao diretor da PF. Veja aqui um resumo das críticas de Maggi e respostas de Daiello:
Carne com papelão
O diálogo que fala em "colocar papelão" seria "colocar em papelão" a carne moída, ou seja, embalar. A Zero Hora, agentes que participaram da operação admitem que pode ter ocorrido engano na interpretação.
Alarido desnecessário
São 33 os fiscais-sanitários sob suspeita, em um universo de quatro mil. Blairo criticou o "alarido". A PF diz que não houve exagero e que pontuou todos os casos, sem generalizar.
Faltou avisar o ministério
Blairo se queixou de o Ministério da Agricultura não ter sido avisado da operação. Daiello considera ingênua essa alegação, já que os maiores suspeitos de cometer crimes são, justamente, funcionários da pasta – o risco de vazar a investigação era enorme.
Água no frango
É um ponto em que Maggi e Daiello concordam. A água no frango (para aumentar o número de quilos na venda, pós-congelado) é fraude antiga e contínua.
Cabeça de porco
Provocou espanto aos policiais federais a mistura de cabeça de porco nos embutidos. Maggi explicou que isso pode ser feito, em alguns produtos e quantias específicas, como mortadelas.
Ácido ascórbico
A PF teria enfatizado a presença de "ácido ascórbico" na carne. Para o consumidor comum, soa aterrorizante, disse Maggi. Mas é vitamina C, usada justamente para impedir o processo de deterioração. Seria algo benigno e não maléfico. Só permitida em embutidos, admite.
Falta de embasamento técnico
Maggi estranhou que técnicos do ministério não tenham sido chamados a esclarecer diálogos interceptados pela PF, a dizer o que pode ou não ocorrer na indústria da carne. Daiello rebate e diz que, entre os 75 peritos federais envolvidos na operação, há alguns com formação em veterinária.