Definida como uma das prioridades do presidente interino Michel Temer, a reforma da Previdência perdeu urgência e deverá ser discutida somente depois das eleições municipais – quando enfrentará oposição redobrada das centrais sindicais. Entre as razões para esse recuo, estão as profundas discordâncias entre o que cogitam o governo e o empresariado, de um lado, e o que admitem sindicatos e trabalhadores, de outro.
Os principais pontos de divergência incluem temas como estabelecimento de idade mínima de aposentadoria, equiparação de regras entre homens e mulheres e desvinculação do benefício do salário mínimo, entre outras polêmicas.
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Reforma da Previdência tem desafio de equilibrar caixa com expectativas
No mesmo dia em que Temer tomou posse no Planalto, em 12 de maio, o ministro-chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha, garantiu que reformar a Previdência seria uma medida quase imediata. A pressa era justificada pelo rombo de R$ 85,8 bilhões registrado no ano passado e pela perspectiva de agravamento do desequilíbrio financeiro, já que a população brasileira se aposenta, em média, aos 58 anos, mas o aumento da expectativa de vida leva a uma explosão no número de idosos que têm direito ao benefício. A projeção é de crescimento de 218% na quantidade de pessoas com mais de 65 anos no país até 2050. Ao mesmo tempo, a redução da natalidade limita a força de trabalho que financia o sistema.
– Essa reforma é das primeiríssimas porque não há mais dúvida de que tem de ser feita – declarou Padilha em maio.
Um primeiro grupo de trabalho recebeu 30 dias para esboçar uma proposta, mas o prazo se encerrou sem qualquer acordo. Em razão disso, foi criado um segundo grupo com participação de representantes de trabalhadores, empresários e governo, sem prazo para alinhavar um plano consensual. A fim de evitar desgastes políticos às vésperas das eleições, é improvável que ocorram avanços até outubro.
A discordância dos representantes sindicais com as ideias cogitadas pelo governo e pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), que representa os empregadores no comitê, é o maior freio ao açodamento inicial de Temer. A Força Sindical é o interlocutor de maior peso do Planalto, já que a Central Única dos Trabalhadores (CUT) não participa por não reconhecer a legitimidade da gestão interina.
– Não concordamos em nada. Poderemos até partir para um enfrentamento, com greve geral organizada pelas centrais sindicais. Não estou dizendo que vamos fazer, mas vamos mobilizar os trabalhadores para pressionar o governo, e poderemos até chegar à paralisação – avisa o secretário-geral da Força, João Carlos Gonçalves.
Um dos pontos de discordância é uma das prioridades do governo federal e do empresariado: a instituição de idade mínima de aposentadoria, que chegou a ser estimada em 65 anos em conversas iniciais.
– Não definimos uma idade, mas as experiências internacionais mostram que ela costuma ficar entre 65 e 67 anos. É fundamental que o sistema tenha equilíbrio porque o déficit da Previdência é financiado pela sociedade – argumenta o gerente-executivo de Política Econômica da CNI, Flávio Castelo Branco.
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Gonçalves sustenta que comparações entre o Brasil e outros países devem levar em conta que os brasileiros, segundo ele, começam a trabalhar mais cedo do que na Europa, por exemplo. A Força Sindical defende a manutenção da regra atual, que prevê a fórmula 85/95, e exige que o Planalto aumente a receita da Previdência por meios como a cobrança de tributos do agronegócio.
A polêmica se estende a outros pontos. Governo e empresários pretendem igualar o máximo possível as regras para aposentadoria, que hoje apresentam diferenças entre homens e mulheres, trabalhadores urbanos e rurais e categorias profissionais beneficiadas por regimes especiais – professores e policiais militares, por exemplo, podem deixar a ativa com menos tempo de serviço. Uma das possibilidades é igualar os prazos para aposentadoria entre homens e mulheres ou, pelo menos, reduzir a diferença atual de cinco anos a menos de trabalho em favor delas.
Aposentadorias especiais podem ter restrições
Um dos pontos da reforma da Previdência que deverá motivar debates acalorados é a tentativa de endurecer as regras das aposentadorias especiais, que beneficiam profissionais como policiais militares, professores e trabalhadores expostos a situações de risco. No Rio Grande do Sul, apenas as duas categorias mais numerosas beneficiadas pelas regras mais favoráveis – magistério e Brigada Militar (BM) – somam 91 mil pessoas na ativa e que poderiam ser afetadas por alterações.
A ideia faz parte da estratégia geral do Planalto de igualar ao máximo possível as regras do sistema previdenciário. Pelo artigo 40 da Constituição, os professores da Educação Infantil ao Ensino Médio, por exemplo, podem se aposentar com cinco anos de contribuição a menos do que os demais trabalhadores. Mudanças no sistema dos policiais militares dependeriam de alterações nas leis estaduais – que, hoje, não preveem limite mínimo de idade para deixar a ativa. Bastam 30 anos de serviço.
Mesmo que ainda não existam iniciativas concretas para alterar a aposentadoria militar em Estados como o Rio Grande do Sul até o momento, associações de policiais já se mobilizam.
– Estamos acompanhando esse debate com preocupação, porque o risco e o estresse da nossa carreira são muito altos. Estamos em contato com outras entidades de todo o Brasil para garantir nossos direitos – afirma Leonel Lucas, presidente da Abamf, entidade que representa os servidores de nível médio da BM.
Hoje, no Rio Grande do Sul, a Brigada Militar contabiliza 20,3 mil servidores ativos e 23,1 mil inativos. Já o magistério reúne 70,7 mil professores na ativa e 93,5 mil aposentados.