No comando do Ministério da Economia, como a pasta ocupada hoje por Joaquim Levy se chamava em 1992, Marcílio Marques Moreira viveu situação semelhante. Mas mais confortável, assegura. Marcílio contou à coluna que, na véspera da renúncia de Fernando Collor de Mello (2 de outubro), provocada pelo início do impeachment, levou ao então presidente os resultados fiscais e monetários de setembro, e ouviu dele que havia tempo não recebia notícia tão boa. Na avaliação dele, Levy enfrenta "desafios mais complexos".
Como é a sensação de comandar a economia diante de uma grave crise, como tenta fazer Joaquim Levy?
É uma situação angustiante, que exige grande perseverança. Mas tive duas vantagens para ultrapassá-la. A primeira, uma equipe valorosa, com Pedro Malan, Francisco Gros, Gustavo Loyola, Armínio Fraga. Segundo, bons colegas no ministério, muito ligados a mim, como Hélio Jaguaribe, Eliezer Batista, o que dava muita segurança. E o Congresso também nos apoiava muito. Conseguimos passar por aquela turbulência sem downgrade (rebaixamento de rating), queda da bolsa ou da moeda, o cruzado novo.
Então a situação de Levy é pior?
Ele enfrenta obstáculos e desafios mais complexos, porque está mais isolado, o que é uma pena. Ele tem todos os atributos para fazer um bom trabalho. Mas isso exige muita confiança de seus colegas e de seu presidente, senão é uma batalha inglória. O downgrade pela S&P é uma derrota muito significativa para ele e para o país.
Qual a diferença dessa crise em relação a outras que já testemunhou?
Vejo crises desde 1954, nenhuma tão complexa e intensa. A mais parecida foi em 1963. Depois que Santiago Dantas foi derrotado, vários primeiros-ministros caíram.
Ao mencionar 1963, o senhor vê risco institucional?
Se houve um grande progresso nesses anos, foi o institucional. Em 1992, tanto as instituições quanto a redemocratização eram muito recentes. Tivemos de fazer grande esforço para que não fossem ameaçadas. Havia mais risco, hoje não vejo.
Diante da crise, o Brasil tem conserto?
Todas as crises têm fim. Para ser positivo, exige muita coragem, visão do futuro, determinação e liderança.
As chances são boas?
Temos falta de qualidade de governança, de capacidade de ver a realidade, reagir a ela seguindo um objetivo. Um jurista francês do fim do século 19 falava da importância da ideia clara da obra a realizar. Entram ideias, desenvolvimentistas, estatistas, atrapalhando o caminho. Quando não temos ideia clara do porto a chegar, nem bons ventos podem ajudar.