Demorou, mas a presidente Dilma Rousseff escancarou o verbo ontem para defender o ajuste fiscal e deixar claro que as medidas não são do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, mas do governo: "o nosso ajuste fiscal".
No cenário politicamente amigável e economicamente desafiador proporcionado ontem no Estado por sem-terra e sindicalistas, Dilma falou até em superávit primário, assunto que vinha evitando desde a celeuma da alteração da meta fiscal de 2014, em dezembro.
Fez questão de carimbar a intenção de fazer economia equivalente a 1,2% do PIB para pagar os juros da dívida pública, e deu uma declaração pouco usual:
- Nós temos de fato um desequilíbrio fiscal.
Antes dos protestos de 15 de março, o que o mercado financeiro mais temia era a falta de aderência da presidente ao programa amarrado por Levy.
- Eu considero absolutamente imprescindível para o Brasil - e aí não é uma questão do governo apenas, é uma questão do conjunto do país, da nossa nação - a aprovação do nosso ajuste fiscal. (...) Então, (...) é fundamental aprovar esse ajuste.
Contemplar o ajuste no discurso da presidente não significa cumprimento automático da meta nem efetividade no alcance do objetivo. Só remove um ruído que poderia ter sido retirado de cena mais cedo. Dilma procurou acentuar que o governo vai dar sua parte nos sacrifícios para obtenção do ajuste.
Ainda não é com corte no número de ministérios, mas avisou que a redução de despesas dos ministérios, em relação ao orçamento aprovado, será "significativa". E praticou seu discurso de dialogar sem abrir mão de posições firmes ao responder às críticas ao ajuste do líder do MST. João Pedro Stedile, com um "não concordo, mas respeito".
Se tivesse ensaiado antes esse discurso com um toque "confessional" - como se recusou a fazer recentemente -, talvez tivesse suavizado as especulações na bolsa e no mercado de câmbio. Que aliás e não só por coincidência, desceu do teto ontem, fechando em R$ 3,22. A cotação menos elevada do que no dia anterior teve influência do Exterior, com menos estresse em relação à Grécia. Mas a maior contribuição para o recuo - assim como tem sido para a alta -, veio do cenário interno. Antes tarde do que mais tarde.