Palestrante da Semana ARP da Comunicação, nesta quarta-feira, às 18h, o professor de ética da Universidade de São Paulo (USP) Clóvis de Barros Filho ressalta que o convívio dos brasileiros se assemelha à sociedade das formigas - umas trabalham arduamente, outras usufruem do suor alheio. Consultor da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), Barros Filho concedeu entrevista por e-mail.
Zero Hora - A propaganda quer oferecer um produto ou uma ideia? Qual é o limite ético?
Clóvis de Barros Filho - Toda propaganda tenta oferecer um produto por meio de uma ideia. Ou se vende um produto baseado em uma crença popular, como 'o meu sabonete é melhor porque deixa a pele melhor', trabalhando com a ideia da aparência, ou vende por meio da ideia pouco usual de saúde, vendendo um sabonete eficaz contra germes e bactérias. Para vender um produto novo, é preciso mudar as ideias que as pessoas têm sobre ele e vice-versa.
ZH - A propaganda brasileira, de forma geral, é ética?
Barros Filho - Para sabermos se a propaganda é boa ou não, precisaría-
mos de critérios. A pergunta correta a se fazer é esta: os nossos publicitários, de forma geral, agem segundo quais valores éticos?
ZH - Recentemente, o senhor usou o exemplo das formigas no convívio ético. Umas trabalham, outras não. Como é o convívio do brasileiro?
Barros Filho - Parecido com o das formigas e com o de outras sociedades do planeta. Há sempre um senhor feudal, detentor do capital, que trabalha muito pouco e goza de todos os direitos sociais, e há os trabalhadores explorados que trabalham muito e gozam de quase nada. A melhora das relações sociais e do respeito entre as pessoas decorre da melhora das condições de vida, de uma justiça social, e não só com discursos éticos e religiosos.
ZH - Existe algum país que seja referência de ética?
Barros Filho - Não há países ou pessoas que sejam referência de ética. Fala-se muito da Holanda ou da Suécia, mas não representam um parâmetro. Se empresários e políticos brasileiros querem viver como uma população de primeiro mundo, então devem lutar para transformar nosso país em um país de primeiro mundo. Cobrar cidadãos mais educados e oferecer uma escola pública de fachada ou um salário insuficiente para que os funcionários não possam pagar uma boa escola para os seus filhos não nos ajudará a construir uma referência ética.
ZH - Os réus do mensalão estão indo para a cadeia. Pode ser um marco no Brasil?
Barros Filho - Sobre os condenados do mensalão, não há avanço significativo. É jogo de cena político, como o impeachment do (ex-presidente Fernando) Collor. Só poderemos discutir uma mudança significativa quando os mensaleiros tucanos de Minas Gerais forem igualmente julgados e condenados e, também, quando os envolvidos no esquema de corrupção das privatizações pagarem caro pelo que fizeram. Essa melhora só vai acontecer quando abrirem a caixa-preta do Poder Judiciário e adotarem o voto distrital.