Embora novos sistemas de videogame dependam de inovações tecnológicas, os gamers são um grupo conservador, desconfiado em relação a mudanças. Isso explica (em parte) por que eles deram uma grande ovação aos antiquados games em discos durante uma apresentação da Sony na maior feira do setor, a E3, recentemente.
Os aplausos não foram apenas para a Sony, que estava promovendo seu Playstation 4 em um evento às vésperas da feira que duraria três dias. Eles foram também um sinal do crescente ressentimento com a Microsoft, que estava promovendo seu próprio console, o Xbox One.
A Microsoft propôs limitar a capacidade dos gamers de revender jogos feitos para o Xbox One, programado para estar nas lojas em novembro. As empresas que criam games para o console, segundo a Microsoft, serão capazes de impedir que os consumidores revendam os jogos ao fazer com que jogos usados não funcionem no Xbox One. Até agora, nenhum fabricante de games declarou que exercerá esse direito.
A controvérsia levou a um estranho espetáculo: em um evento dedicado a lançamentos, houve um enorme entusiasmo pelo direito pleno de vender e comprar jogos velhos.
A Microsoft está prometendo novas experiências com o Xbox One, que exigirão uma conexão constante à internet, pois centenas de máquinas na nuvem deverão aprimorar o poder computacional de consoles individuais. Entretanto, os usuários parecem estar ouvindo somente o que está sendo removido pela Microsoft: a habilidade de revender ou dar de presente seus games para quem você quiser, quando quiser.
A Microsoft diz que os usuários do Xbox One poderão dar uma única cópia de cada jogo para outro jogador, desde que esse jogador seja seu amigo na rede Xbox Live há pelo menos 30 dias. Não ficou claro se os usuários poderão simplesmente emprestar jogos entre si, ou alugar cópias por alguns dias numa loja.
O Playstation 4 da Sony, também com lançamento programado para o final deste ano, prometeu que não terá essas restrições. E Shigeru Miyamoto, criador de games como Super Mario Bros e Legend of Zelda para a Nintendo, que produz o Wii U, declarou em uma entrevista:
- Nós nunca criaríamos nosso sistema dessa forma.
O problema da Microsoft é que ela está anunciando uma experiência totalmente digital e baseada em downloads, mas oferecendo um sistema de jogos abastecido apenas em parte pela web. Os jogadores ainda terão de comprar e instalar jogos em disco no Xbox One.
Podemos estar caminhando para uma distribuição de todos os jogos pela internet, mas não estaremos lá em 2013. Os jogos em disco estão aqui para ficar, pelo menos por enquanto.
Por serem arquivos digitais muito grandes, os jogos têm sido mais lentos do que livros, música e filmes para se adaptar à mídia streaming e de download. Nesse ínterim - e pode ser um ínterim bem longo -, a Microsoft soa como se estivesse tentando colocar restrições da internet em discos físicos. As pessoas não reclamam por não poderem emprestar ou revender seus jogos para iPhone, então a Microsoft argumenta que sua posição possui precedente. No entanto, muitos gamers estão reagindo como se a Amazon estivesse tentando aplicar as regras do Kindle em livros comuns.
Em algum momento, a Microsoft acabará vencendo essa briga. Nem mesmo a Sony está prometendo deixar que os jogadores emprestem e revendam os jogos de download para o PlayStation 4.
O mais preocupante para mim, como um fã de jogos e crente em sua importância histórica, é a possibilidade de que os games do Xbox One estejam destinados ao esquecimento quando chegar o inevitável dia, dentro mais ou menos 10 anos, em que a Microsoft deixar de oferecer suporte ao Xbox One. Eu ainda consigo jogar games feitos para um Atari 2600 ou Nintendo Entertainment System - desde que se tenha uma versão funcional do hardware.
O Xbox One, por outro lado, exige um check-in diário nos servidores da Microsoft. E é quase certo que, um dia, a Microsoft desligará esses servidores. Isso significa que a maioria dos jogos do Xbox One será aproveitada apenas pela atual geração de jogadores.
Talvez isso seja bom. Antigamente, quando um filme saía dos cinemas, você não podia mais vê-lo. Quando uma série de TV era cancelada, era seu fim para sempre. E quando uma peça na Broadway termina, não se pode esperar que ela permaneça para sempre em alguma memória digital para uma conveniente recuperação.
Mesmo assim, existe uma desvantagem de se usar a web para acesso instantâneo de livros, filmes e música: uma forte redução em nossos direitos de propriedade. No mundo da nova mídia, somos todos locatários.
Quando se trata de livros, músicas e filmes, você pode optar pela locação, pagando menos por um serviço como Netflix, ou pela compra, pagando mais por, digamos, discos de Blu-ray.
Quando se trata de videogames, o Xbox One não oferecerá mais essa opção. É por isso que os jogadores estão reagindo como se estivessem sendo tratados não como locatários, mas como servos feudais.