Não foi apenas no Brasil que o mercado de câmbio sentiu o impacto da decisão do banco central dos Estados Unidos (Federal Reserve, o Fed) de reduzir estímulos na economia americana neste ano, anunciada semana passada. As moedas de Rússia, Índia e África do Sul também perderam valor frente ao dólar. Apenas a China, que tem um câmbio controlado, não passou pelo impacto recente.
A redução de benefícios faz com que menos dólares sejam injetados na economia, elevando o valor da moeda. Ao mesmo tempo, o Fed anunciou que pode aumentar o juro, o que torna menos interessante investir em mercados emergentes, por exemplo. Conforme levantamento da Austin Rating, o real se desvalorizou 12,5% desde 30 de abril, ficando atrás somente do rand, da África do Sul, que perdeu 12,7% do valor.
- Investidores estão aproveitando esse momento de instabilidade global e transferindo ativos de mercados emergentes para um lugar mais seguro. O problema não está só no Brasil. Acaba sendo um movimento natural durante a turbulência- afirma o economista Felipe Queiroz, da Austin Rating.
Nova instabilidade nos mercados pode ocorrer amanhã e quinta-feira, projeta Queiroz, quando diretores regionais do Fed vão dizer se apoiam ou não a proposta de redução de estímulos e aumento do juro nos Estados Unidos.
- Claro que há muita especulação em um momento de instabilidade - acrescenta o economista.
O efeito no câmbio brasileiro, avaliam especialistas, é que a cotação poderá ficar neste novo patamar, em torno de R$ 2,25, com o Banco Central (BC) entrando em ação no mercado somente para evitar variações bruscas.
- Temos uma série de fatores que pesam mais sobre o Brasil do que outros emergentes. A tendência é de saída de recursos em razão do contexto econômico, como o baixo crescimento e a política fiscal desordenada - afirma o economista Sidnei Moura Nehme, diretor-executivo da NGO Assessoria Financeira em Comércio Exterior.
A presidente Dilma Rousseff conversou ontem, por telefone, com o presidente da China, Xi Jinping. Na ligação feita do gabinete no Palácio do Planalto, o tema foi a preocupação com os efeitos da valorização do dólar e a possibilidade de uma ação coordenada de proteção às suas moedas pelos bancos centrais dos países emergentes. Dilma ainda falará sobre o mesmo tema com o presidente da Rússia, Vladimir Putin.
A alta do dólar e o impacto desse efeito no aumento da inflação preocupam a presidente Dilma, principalmente em momento político delicado, quando ocorrem no país grandes mobilizações populares. Uma ação conjunta dos países emergentes poderia ajudar a minimizar os problemas.
Até o ano passado, a presidente estava preocupada com o que chamava de "tsunami monetário": ações de países em crise injetando dinheiro no mercado. O excesso de recursos poderia ser direcionado para o Brasil, valorizando o real e encarecendo as exportações nacionais.
Efeito global
Variação das moedas dos Brics em relação ao dólar de 30 de abril a 24 de junho, segundo a Austin Rating
Rand (África do Sul): 12,7%
Real (Brasil): 12,5%
Rúpia (Índia): 11,2%
Rublo (Rússia): 6,2%
Yuan (China): -0,3%
Escalada recente pressiona a inflação
O dólar deve encerrar este ano cotado a R$ 2,13 e fechar 2014 em R$ 2,20. As projeções são de economistas ouvidos pela pesquisa Focus, do Banco Central. Apesar de as previsões serem inferiores às cotações dos últimos dias - sempre acima de R$ 2,20 -, são mais altas do que as apresentadas na semana passada.
Os dados demonstram uma grande e rápida mudança nas percepções, quando comparados com os números de apenas um mês atrás. Em 21 de maio, os analistas que responderam à Focus acreditavam que o dólar encerraria este ano em R$ 2,03 e, o seguinte, em R$ 2,07. Esses níveis eram mantidos desde o início do ano.
A escalada recente do dólar levou os economistas a aumentarem mais uma vez os prognósticos para a inflação. De acordo com a pesquisa, a preocupação do repasse do câmbio para a inflação começa a ser embutida nas previsões.
Para o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), indicador oficial, a expectativa é de uma taxa de 5,86% para o fim de 2013, contra 5,83% da semana passada.